Ponto a ponto: tudo o que Cid falou sobre Bolsonaro: “Era meu mundo”

 

Ex-braço direito de Bolsonaro, Cid esteve ao lado do ex-presidente durante todo o governo. “Meu mundo era o mundo do presidente”, disse à PF
Galtiery Rodrigues
Depois de meses de curiosidade e especulações sobre o conteúdo da delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da presidência da república no governo de Jair Bolsonaro (PL), o sigilo, enfim, foi retirado esta semana, revelando o que, de fato, foi dito por ele perante a Polícia Federal e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Sempre ao lado de Bolsonaro, nos quatro anos de governo, Cid tornou-se peça importante da investigação para elucidar os eventos que teriam desencadeado a suposta trama golpista após as eleições presidenciais de 2022. A proximidade entre os dois era tanta que, em depoimento à PF em novembro do ano passado, ele chegou a dizer: “meu mundo era o mundo do presidente”.

Não à toa, uma das principais preocupações de integrantes do antigo governo e de pessoas ligadas ao ex-presidente era sobre o que Mauro Cid teria dito sobre Bolsonaro nas oitivas do acordo de colaboração premiada. O Metrópoles separou as revelações do militar sobre o ex-chefe, em relação ao suposto plano de golpe de Estado, e mostra abaixo o ponto a ponto:

Visitas e conselhos de diferentes grupos
Recluso no Palácio da Alvorada e em situação de “luto profundo”, segundo Mauro Cid, Bolsonaro recebia visitas de diferentes grupos, com quem conversava e ouvia conselhos sobre o que fazer após a derrota para Lula nas eleições. De acordo com Mauro Cid, as pessoas se dividiam em três grupos distintos:

  • um mais conservador, que dizia para Bolsonaro aconselhar o povo concentrado na porta dos quartéis a voltar para casa e aceitar a derrota, colocando-se como um “grande líder da oposição”;
  • um outro também moderado, composto por militares, que entendiam que qualquer ruptura “seria um golpe armado que representaria um regime militar por mais 20, 30 anos” e que temia possível influência do grupo mais radical (grupo 3), a ponto de Bolsonaro assinar “uma doideira”;
  • e o terceiro era o mais radical, segundo Cid, favorável ao uso do “braço armado”, ao golpe de Estado e à assinatura do decreto. Esse grupo seria composto por: Onyx Lorenzoni, senador Jorge Seiff, senador Magno Malta, Eduardo Bolsonaro, general Mário Fernandes e Michelle Bolsonaro.

Segundo Cid, em novembro de 2022, o ex-assessor de Bolsonaro, Felipe Martins, apresentou ao ex-presidente, ao lado de um jurista, um documento que “tinha várias páginas de ‘considerandos’, que retratava as interferências do Poder Judiciário no Poder Executivo e no final era um decreto que prendia todo mundo” e “que decretava novas eleições”.

“O ex-presidente recebeu o documento, leu e alterou as ordens, mantendo apenas a prisão do ministro Alexandre de Moraes e a realização de novas eleições, devido a fraude no pleito”, afirmou Mauro Cid.

Apresentação da minuta às Forças Armadas
O tenente-coronel relatou, ainda, que no dia 7 de dezembro de 2022, Bolsonaro convocou reunião com os comandantes das Forças Armadas e “apresentou os ‘considerandos’ (fundamentos dos atos a serem implementados)”, com Felipe Martins explicando cada item. “O ex-presidente queria pressionar as Forças Armadas para saber o que estavam achando da conjuntura”, explicou Cid à PF.

Em determinando momento, Cid diz ter saído da sala e a conversa prosseguiu entre Bolsonaro e os generais. Após a reunião, segundo ele, o então comandante do Exército, general Freire Gomes, contou sobre o ocorrido, alegando apenas que o comandante da Marinha havia se posicionado de forma favorável ao texto da minuta.

Bolsonaro queria acampamentos ativos
Segundo Cid, “o ex-presidente Jair Bolsonaro não queria que as pessoas saíssem das ruas”. Ele “tinha certeza que encontraria uma fraude nas urnas eletrônicas e por isso precisava de um clamor popular para reverter a narrativa”. Foi o ex-presidente, inclusive, conforme Cid, que teria determinado que as Forças Armadas divulgassem um nota autorizando a permanência dos acampamentos em frente aos quartéis.

Em audiência de 21 de novembro de 2024, Moraes questionou: “Essa nota, coronel, essa nota foi determinação do presidente?”. Cid respondeu: “Sim, senhor, foi determinação dele”.

A essa altura, conforme o relato do ex-ajudante de ordens, o ex-presidente trabalhava com duas hipóteses: “a primeira seria encontrar uma fraude nas eleições e a outra, por meio do grupo radical, encontrar uma forma de convencer as Forças Armadas a aderir a um golpe de Estado”.

Relatório “duro” contra as urnas
Mauro Cid relatou que Bolsonaro sempre apostou na tese de fraude das urnas eletrônicas como uma forma de questionar o resultado das eleições e pressionava o Ministério da Defesa, que havia criado uma Comissão de Transparência das Eleições, para que fosse produzido um relatório “duro” sobre o tema.

“O grupo tentava encontrar algum elemento concreto de fraude, mas a maioria era explicada por questões estatísticas; (…) o grupo não identificou nenhuma fraude”, disse Cid. Apesar disso, “ele [Bolsonaro] dava esperanças que fosse acontecer alguma coisa” ou “mantinha a chama acesa [de] que pudesse acontecer” algo, expôs o militar.

Em dezembro de 2022, Alexandre de Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi monitorado por assessores da Presidência. “Indagado quem solicitou ao colaborador (Mauro Cid) que fizesse o acompanhamento do ministro, [ele] respondeu que foi o próprio presidente da República Jair Bolsonaro quem pediu para verificar a localização”, consta no relatório do depoimento.

Segundo Cid, o ex-presidente ficou “muito nervoso” ao saber que Moraes iria se encontrar com o então vice-presidente Hamilton Mourão. Essa foi a informação que chegou até ele, mas, quando indagado sobre qual seria o objetivo da ordem de monitoramento, o ex-ajudante de ordens respondeu que desconhecia; “que o então presidente não passou o motivo”.

“Punhal Verde Amarelo”: Bolsonaro sabia ou não?
Em última oitiva na Polícia Federal, em 5 de dezembro de 2024, o delegado Fábio Shor questionou Mauro Cid se o ex-presidente sabia ou não do plano de monitoramento, sequestro e assassinato de autoridades – Moraes, Lula e Alckmin -, que ficou conhecido como Punhal Verde e Amarelo e veio à tona em novembro do ano passado, com a deflagração da Operação Contragolpe. O tenente-coronel respondeu:

“Eu não tenho ciência se o presidente sabia ou não do plano que foi tratado… do ‘Punhal Verde e Amarelo’, e se o general Mário levou esse plano para ele ter ciência ou não”.
METRÓPOLES – Edição: Montedo.com

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