Delator Mauro Cid deve manter posto e patente
Malu Gaspar e Rafae Moraes Moura
Rio e Brasília – O silencio das Forças Armadas com a denúncia do procurador-geral da República contra os participantes da trama golpista que culminou nos ataques de 8 de Janeiro tem uma razão estratégica: o Exército, força a qual pertence a maior parte dos 23 militares denunciados junto com Jair Bolsonaro, não vai tomar nenhuma providência para investigar ou puni-los antes de a denúncia ser aceita pelo Supremo, o que ainda deve demorar algumas semanas. Entre os denunciados estão o ex-comandante do Exército, Paulo Sérgio Nogueira , e o da Marinha, Almir Garnier.
A única declaração pública de autoridade ligada à caserna, até aqui, veio do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, para quem a denúncia já estava precificada.
— É o que estávamos esperando, há um constrangimento, mas o bom é que isso acaba — disse Múcio na noite desta terça-feira, ao participar de um jantar no Itamaraty oferecido ao presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa.
A punição interna de militares no caso do golpismo é uma questão delicada para o Exército, não só em razão do corporativismo, como também para não voltar a acirrar o clima interno, que já esteve mais dividido mas continua preocupando a cúpula militar.
Conforme informou o blog, a decisão dos generais é não abrir nenhum procedimento disciplinar novo contra os indiciados antes de o processo formal contra eles começar no Supremo — mesmo eles já tendo sido indiciados pela Polícia Federal e denunciados pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet.
“A situação administrativa dos militares só muda após a aceitação das denúncias”, diz um general que acompanha de perto os desdobramentos do caso. “Nesse caso eles ficam impedidos de serem promovidos e transferidos.”
A expectativa de investigados é a de que o relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, dê celeridade ao caso e leve até abril a denúncia para julgamento da Primeira Turma do STF.
Nessa etapa, os magistrados avaliam se há indícios suficientes de que os investigados praticaram crimes e decidem abrir uma ação penal para, em uma fase posterior, aprofundar a apuração, com a coleta de mais provas e depoimentos de testemunhas de defesa e acusação. Na prática, a Turma vai colocar os militares no banco dos réus, o que pavimenta caminho para uma condenação futura.
Os efeitos da delação de Mauro Cid
No caso do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, as cláusulas do acordo de colaboração premiada – que fundamentou a denúncia da PGR contra Bolsonaro, Walter Braga Netto e outras 32 pessoas por golpe de Estado – o protegem dos riscos de perder a patente.
Isso porque entre os benefícios está o perdão judicial ou uma pena privativa de liberdade não superior a dois anos.
“Cid não será julgado para perda do posto. Seria se a pena fosse superior a dois anos”, diz um influente ministro do Superior Tribunal Militar (STM) ouvido reservadamente pela equipe da coluna.
Com uma condenação de até dois anos, o caso é submetido – após o trânsito em julgado (o esgotamento de todos os recursos no Supremo) – ao Conselho de Justificação, formado por três oficiais da ativa. Os oficiais elaboram um relatório a ser enviado ao comandante do Exército, que avalia se o oficial praticou conduta irregular ou ato que afete a honra ou o decoro da classe.
O conselho tem um prazo de até 50 dias para concluir seus trabalhos. Nesse cenário, caberia ao comandante do Exército, em um prazo de 20 dias, analisar se arquiva o caso ou o envia para o STM – o que permite que Cid seja salvo pelos próprios militares.
O GLOBO – Edição: Montedo.com
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