‘Não fui tolerada’, diz ministra sobre disputa para a presidência do STM

Maria Elizabeth Rocha é a primeira mulher a chefiar a corte. Em entrevista à Agência Pública, ela falou de golpismo e extremismo nas Forças Armadas


Caio de Freitas
O caminho da ministra do Superior Tribunal Militar (STM) Maria Elizabeth Rocha até a presidência da corte, no último dia 5 de dezembro, revela como sua presença e atuação incomodam seus pares, todos ministros homens. Indicada pelo presidente Lula (PT) para o STM ainda em 2007, a ministra teve de superar um desafio inédito na história da corte militar: vencer uma eleição interna que, desde o século 19, era meramente simbólica.

“Não é fácil atuar na corte militar. Por vezes, eu voto para absolver e a maioria vota para condenar e, se voto para condenar, eles votam para absolver. A violência simbólica contra as mulheres persiste na Justiça Militar”, disse Rocha à Agência Pública durante uma entrevista exclusiva, concedida no último dia 28 de fevereiro em Brasília (DF).

A escolha da presidência do STM sempre seguiu o critério de antiguidade, mas em 2024 houve uma candidatura de oposição: a do ministro Péricles Aurélio Lima de Queiroz, um civil que fez carreira no Ministério Público Militar (MPM). A ministra Elizabeth Rocha teve de vencê-lo em uma eleição interna da corte, por 8 votos a 7, para tornar-se a primeira mulher eleita presidente do STM.

“Quando chega a vez de uma mulher, uma progressista, feminista e com posições e pensamentos diferentes da corte – que eu faço questão de manter, porque estou ali para falar em nome das minorias –, fui rechaçada. Não fui tolerada, tentou-se até quebrar uma tradição do tribunal. Houve quem me recomendou desistir da candidatura… mas felizmente acabou, e eu fui eleita”, afirmou.

Para a nova presidente do STM, a eleição interna ilustra o machismo sofrido por ela e outras mulheres na Justiça Militar, uma das práticas que ela pretende combater durante sua gestão. “Transparência, inclusão e defesa do Estado Democrático de Direito serão os três pilares da minha gestão, e pretendo mexer com vários problemas da Justiça Militar, como a homofobia, a transfobia, o machismo, a segregação”, disse Rocha.

A ministra se tornou a primeira mulher a integrar o STM, após ter sido indicada pelo presidente Lula (PT) há 17 anos. De 1985 até sua indicação, Elizabeth Rocha atuou como procuradora federal da República. Agora, vive a expectativa de ter a companhia de outra ministra civil na corte – a advogada Verônica Abdalla Sterman, indicada para o STM no último dia 8 de março pelo presidente Lula.

Durante sua gestão à frente do STM, Elizabeth Rocha terá ainda de lidar com desdobramentos do caso da tentativa de golpe, sob análise do Supremo Tribunal Federal (STF).

O Código Penal Militar lista diversos crimes compatíveis com o suposto papel dos 24 oficiais das Forças Armadas na trama golpista – como “organização de grupo para a prática de violência”, “operação militar sem ordem de superior”, tentativa de “sequestro ou cárcere privado” e até “homicídio qualificado”. Mas a presidente do STM não prevê punições da Justiça Militar sobre esses crimes.

“Parte dos delitos já está sob análise do STF. Além disso, na Justiça Militar a vítima não pode oferecer uma denúncia, só o Ministério Público [Militar] pode fazê-lo. Se o MPM não oferecer uma ação sobre o golpe, não podemos fazer nada”, afirmou Rocha.

Para Rocha, resta apenas aguardar o julgamento no STF para, a partir daí, analisar os casos de oficiais condenados por meio de Conselhos de Justificação e representações de indignidade para o oficialato. Trata-se de tribunais de honra, que decidem pela perda ou não de patentes e exclusão dos oficiais das Forças Armadas. Leia mais.
NEXO – Edição: Montedo.com

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