Chefe do Estado-Maior do Exército, General de Exército Richard Nunes, segundo homem na hierarquia, defende aprovação da PEC 55, que destina 2% do PIB para a defesa nacional e alerta para o fato de o mundo estar se armando
Mônica Gugliano
O Estado de São Paulo
20 Abril 2025
Segundo homem na hierarquia do Exército, o general Richard Nunes, chefe do Estado-Maior do Exército, afirma ao Estadão que a Força precisa de previsibilidade para levar em frente os seus projetos, ter capacidade de dissuasão e de defesa, o que até agora não está acontecendo. Em meio à guerra comercial criada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e a instabilidade econômica e política no mundo, muitos países estão reforçando suas compras de armamentos. Nunes observou que, como no Brasil não temos nem a mais remota hipótese de termos uma guerra, o debate sobre a aquisição de armamentos é sempre muito estreito. “Mas todo país que acha caro ter um Exército, ter Forças Armadas equipadas, sempre corre o risco de ter, efetivamente, Forças Armadas de outros países em seu território.
Ele destacou que a Europa, em sua opinião, agora está em desespero. “Qual é o problema da Europa? A Europa, durante décadas, fechou os seus orçamentos de defesa confiando que uma aliança internacional resolveria o seu problema e que uma potência estrangeira maior poderia dar conta disso. E agora está de frente para a realidade. E viu que não é bem assim”, comentou.
Em uma de suas raras entrevistas, Nunes assinalou que as Forças Armadas têm confiança de que o Congresso será sensível à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55 que assegura no orçamento anual o equivalente a 2% do Produto Interno Bruto (PIB) para a Defesa Nacional. “É um dos grandes problemas que a gente enfrenta. Não é só o ponto de o orçamento ser baixo, mas sim de ele ser imprevisível”, comenta.
A seguir outros trechos da entrevista:
Essa PEC 55 é uma reivindicação antiga das Forças Armadas, o senhor acha que agora há chance de que ela avance?
O ministro da Defesa, José Múcio, está completamente empenhado. Depois de um ano e meio, temos um relator, que é o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), que é o líder do Governo no Congresso. Nós precisamos de recursos, mas não só de recursos. Já levantamos uma série de necessidades. Algumas já estão sendo atendidas e outras estão planejadas, dependendo do orçamento que tivermos para isso.
Como quais?
Vou lhe dar alguns exemplos: temos que renovar nossa força blindada, temos que desenvolver os nossos drones. Já temos parcela dessa capacidade, precisamos avançar mais. Nós temos que evoluir na questão da aviação do Exército, muito, porque helicópteros têm, assim, um efeito não só em termos de conflito, um meio de combate eficaz, mas também de dualidade.
O Exército comprou 12 Black Hawk (helicóptero de médio porte). Este ano vamos receber o primeiro deles. Por que ainda tem isso, comprar equipamento militar, material de defesa, não é o mesmo que ir ao supermercado e escolher biscoitos na prateleira. A fabricação demora bastante tempo.
Houve aquela negociação para a compra de viaturas blindadas pela empresa israelense Elbit Systems que vinha sendo negociada desde 2017, mas foi vetada por questões geopolíticas (o governo brecou a negociação em meio às hostilidades entre autoridades de Brasil e Israel)
Nós entendemos as razões do governo….
Como está o desenvolvimento dos drones?
Estamos trabalhando junto à base de indústria de defesa, com o pessoal também da área de pesquisa e desenvolvimento, do nosso departamento de ciência e tecnologia, de empregar os drones para militares. Mas nós sabemos também sabemos que podemos atuar em em parceria. Nós temos que desenvolver uma família de drones. Do mais simples para o mais complexo. Nós estamos trabalhando nessa direção. Dos mais simples, nós já dispomos e já temos até na tropa. Hoje nós temos pelotões de fronteira na Amazônia que já dispõem de drones para melhorar a sua capacidade de vigilância. Isso já é uma realidade. Mas nós precisamos de muito mais, então nós estamos aí, trabalhando junto à base de indústria de defesa, com o pessoal também da área de pesquisa e desenvolvimento, do nosso departamento de ciência e tecnologia, para que a gente possa alcançar, no mais curto prazo, uma família de drones que seja adequada às necessidades do nosso país.
E ele é um instrumento que pode ser usado em praticamente todo tipo de situação….
Nós temos algumas iniciativas e andamentos que são muito boas, porque como os drones também podem ser usados em tempo de paz, nessa questão da dualidade, por exemplo, um drone na Amazônia, ele tanto serve para vigiar nossas fronteiras amazônicas e proteger o nosso território, como ele também serve para a gente sensoriar dados ambientais, para sensoriar ações ilegais de minério e assim por diante. “
Veja por exemplo, no fundo da Amazônia, que é uma das iniciativas que nós estamos buscando. É possível financiar o desenvolvimento de nossos drones, nossos e de alta capacidade, para essas agências de controle ambiental. Porque, por exemplo, a gente vê essa questão do petróleo, da margem equatorial, e o drone pode funcionar para esse controle.
Os drones hoje, ainda mais se nós associarmos a eles outras tecnologias, processadores com inteligência artificial, a capacidade que eles têm de aportar dados para a tomada de decisão é muito maior do que ter que alguém lá no terreno, colocar lá um helicóptero com uma tripulação, ou uma embarcação com uma tripulação. O drone hoje realmente proporciona uma economia de pessoal, de recursos, muito grande. O problema é desenvolvê-lo. Uma vez desenvolvido, ele se paga muito rápido. E os recursos para isso? Nós estamos tentando conscientizar os nossos chefesquanto a isso. Eu sou otimista, eu acho que a gente vai conseguir.
Mas é óbvio que, para isso, é imprescindível ter previsibilidade orçamentária. Porque quando a gente projeta algo nessa natureza, a gente precisa ter uma ideia sobre quanto dinheiro vou ter no ano que vem, e no outro. Em 2027, o que eu vou ter de recurso? Porque eu tenho que encontrar a base industrial de defesa. As empresas, elas investem capital para produzir determinados produtos dessa natureza. Eu não posso, então, deixar continuar um projeto por falta de recurso. Então, esse é um dos grandes problemas que a gente enfrenta. Não é só o ponto de o orçamento ser baixo, mas sim de ele ser imprevisível.
O que é pior?
Ambos. Então, esse é um grande problema. Eu acredito que nós estamos em um bom caminho nesse momento. Ministro Múcio e o comandante aqui do Exército, comandante das Forças, eu falo aqui pelo Exército, como chefe do Estado-Maior do Exército. Eu vejo um empenho muito grande do nosso ministro da Defesa, José Múcio, do nosso comandante, general Tomás, nesse trabalho com o Congresso Nacional de articulação, de convencimento dos parlamentares da importância da aprovação da PEC 55.
Mas há também bastante oposição no sentido de que seriam cortados recursos da educação da saúde, para o setor de Defesa?
A nossa fronteira tem 17 mil quilômetros quadrados, com 10 países. Não se trata de uma competição. Nós somos um seguro. Precisamos estar em condições, sempre ligados. Eu estava pensando nisso porque sempre se fala pra que as Forças Armadas querem dinheiro, querem equipamento, querem isso. E aí volta a conversa de que no Brasil não tem guerra. É uma conversa muito estreita por que, como já disse aqui mesmo no começo da entrevista, todo país que acha caro ter um exército, ter Forças Armadas preparadas, sofre um grande risco: o de ter, efetivamente, Forças Armadas estrangeiras dentro do seu território.
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