Pedido via LAI que incluía link para evento no RS foi negado pelo Exército, que alegou falta de clareza, contrariando a CGU
Cleber Lourenço
O Exército Brasileiro recusou-se a prestar informações sobre os custos públicos relacionados à realização de um torneio de polo promovido no Rio Grande do Sul. O evento foi amplamente divulgado nas redes sociais oficiais do 2º Regimento de Cavalaria de Guarda, unidade subordinada ao Comando Militar do Sul. A recusa em fornecer os dados ocorreu mesmo após um pedido formal, amparado pela Lei de Acesso à Informação (LAI), que incluía link direto para a publicação do evento, com data, local, imagens e identificação clara da atividade.
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Registrado em 17 de março de 2025 sob o número 60143.001329/2025-51, o pedido questionava quanto custou aos cofres públicos a realização do torneio, realizado nas instalações do Exército no estado. Apesar do detalhamento, a resposta do Serviço de Informação ao Cidadão (SIC) do Exército, emitida em 14 de abril, alegou que o pedido “não apresenta especificação, clareza e precisão nas informações requeridas”, motivo pelo qual não seria possível calcular ou mensurar os valores despendidos. A negativa foi fundamentada nos incisos III do artigo 12 e I do artigo 13 do Decreto nº 7.724/2012, que regulamenta a aplicação da LAI no âmbito da administração federal.
A postura do Exército fere diretrizes estabelecidas pela Controladoria-Geral da União (CGU), que, por meio da Portaria Normativa nº 71, publicada em abril de 2023, consolidou interpretações sobre a transparência na gestão de recursos públicos. O Enunciado nº 5 da portaria é categórico ao afirmar que “informações sobre licitações, contratos e gastos governamentais, inclusive os que dizem respeito a processos conduzidos pelas Forças Armadas, são, em regra, públicas”.
O caso levanta questionamentos adicionais sobre o grau de transparência das instituições militares quando submetidas a instrumentos de controle social. Ainda que a legislação brasileira preveja que o acesso à informação é a regra e o sigilo a exceção, o padrão de resposta negativa adotado pelo Exército tem sido reiteradamente criticado por entidades da sociedade civil que monitoram os gastos públicos e a atuação das Forças Armadas.
A resposta do Exército tampouco observou o princípio da boa-fé administrativa e da ampla publicidade, pilares da LAI. O Decreto 7.724/2012 determina que, em caso de dúvida ou falta de informação complementar, a autoridade responsável deve entrar em contato com o requerente antes de indeferir sumariamente a solicitação. Não houve tentativa de solicitar esclarecimentos adicionais por parte do SIC/EB, o que indica um movimento deliberado de negar o acesso sem esgotar as possibilidades administrativas. O manual da CGU sobre boas práticas no atendimento à LAI recomenda, inclusive, o oferecimento de apoio técnico ao cidadão para que o pedido seja reformulado, o que não ocorreu no caso em questão.
Pedido contém link do evento de polo
Diante da negativa, foi interposto recurso em primeira instância no dia 15 de abril. No recurso, o ICL Notícias rebateu o argumento da falta de clareza, destacando que o próprio link contém elementos suficientes para identificar o evento questionado, inclusive com informações sobre o local, a data e a finalidade institucional do torneio de polo, o que inviabiliza a alegação de imprecisão. Até o momento, o recurso segue sem resposta definitiva, e a ausência de retorno dentro do prazo pode configurar descumprimento de dever funcional.
A recusa em informar os gastos chama ainda mais atenção diante do contexto de restrição orçamentária enfrentado por diversas áreas essenciais do setor público, como saúde, educação e ciência e tecnologia. O debate sobre prioridades orçamentárias é amplamente discutido no Congresso Nacional e nos tribunais de contas, e a transparência em eventos com uso de verba pública é fundamental para a fiscalização cidadã.
O evento de polo, por sua vez, envolve custos com infraestrutura, transporte de tropa, uso de cavalos e uniformes, e pode ter mobilizado recursos humanos e materiais em escala significativa. Segundo fontes envolvidas na realização destes eventos, os militares chegam a usar de 4 a 8 cavalos por atleta em cada partida realizada. Há também despesas com alimentação dos animais, logística de transporte, manutenção de campo e pagamento de diárias a servidores eventualmente deslocados.
Eventos similares, na iniciativa privada, sem recursos públicos, chegam a custar a partir de R$ 100 mil e podem chegar a custar dezenas de milhares de reais por dia.
Além disso, a realização de torneios como esse levanta debates sobre a função social das atividades promovidas por unidades militares, especialmente quando envolvem práticas esportivas tradicionalmente associadas a elites econômicas, como o polo. O silêncio institucional diante de um pedido de esclarecimento pode acirrar questionamentos sobre o uso de estruturas militares para fins não diretamente vinculados à atividade-fim das Forças Armadas.
Procurado, o Exército não ofereceu qualquer detalhamento adicional ou indicativo de que os dados serão disponibilizados posteriormente.
A matéria será atualizada caso haja nova manifestação após o julgamento do recurso.
ICL Notícias – Edição: Montedo.com
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