Base Naval de Guam é estratégica para os americanos no Indo-Pacífico e pode servir como centro logístico regional e um potencial ponto de partida para operações no Oriente Médio
Thayz Guimarães, com agências internacionais
Ao menos seis bombardeiros furtivos B-2 dos EUA sobrevoaram o Oceano Pacífico neste sábado em direção à Base Naval de Guam, de acordo com dados abertos de tráfego aéreo. As aeronaves são as únicas capazes de transportar bombas de 14 toneladas que, segundo estimativas de Israel, poderiam destruir a fortaleza nuclear de Fordow, peça central da capacidade do Irã de produzir armas nucleares. O reposicionamento dos aviões militares ocorre num momento em que a Casa Branca avalia se irá se juntar aos israelenses no conflito, com uma intervenção militar podendo acontecer “em até duas semanas”, segundo o presidente Donald Trump. Neste sábado, as forças israelenses alegaram terem matado mais três comandantes da Guarda Revolucionária e bombardeado a central nuclear de Isfahã, enquanto Teerã manteve disparou ataques combinados de drones e mísseis para atingir o território inimigo, em mais um episódio de escalada da guerra.
Os bombardeiros decolaram durante a noite da Base Aérea de Whiteman, no Missouri, e foram imediatamente reabastecidos no ar, o que sugere uma carga pesada, como bombas. A Base Naval de Guam é estratégica para os EUA, particularmente na projeção de poder e na resposta a potenciais conflitos na região do Indo-Pacífico. Embora não esteja diretamente na rota para o Irã e distante quase 11 mil quilômetros, sua proximidade com o Oriente Médio e seu papel como centro logístico regional tornam-na um potencial ponto de partida para operações.
— Teoricamente, poderia ser uma primeira escala para ir a Diego Garcia, no Índico — disse ao GLOBO o coronel da reserva Paulo Filho, mestre em Ciências Militares, referindo-se à base militar conjunta dos EUA e do Reino Unido onde, há cerca de dois meses, estavam estacionados outros seis caças B-2, distante cerca de 3.800 km do Irã. — Eles [os americanos] também podem decolar de Guam, serem reabastecidos no ar e bombardear o Irã. Na verdade, poderiam fazer isso a partir dos EUA mesmo, mas sair de Diego Garcia facilitaria muito. Foi o que fizeram nas guerras do Golfo.
Paralelamente, os EUA enviaram cerca de 30 aviões de abastecimento para a região e vão deslocar seu maior porta-aviões, o USS Gerald R. Ford, para o leste do Mar Mediterrâneo, perto de Israel, na próxima semana. Com capacidade para cerca de 4.600 militares e até 90 aeronaves, ele se juntará a outros dois superporta-aviões americanos: o USS Nimitz, que estava no sudeste da Ásia, e o USS Carl Vinson, antes em operação no Oceano Índico.
Os porta-aviões são utilizados pelas Forças Armadas dos EUA para projetar poder em qualquer lugar do mundo e estão entre os primeiros a serem mobilizados em tempos de crise. Além de transportarem dezenas de jatos capazes de realizar ataques e interceptar mísseis e drones, eles nunca navegam sozinhos, sendo acompanhados por navios de guerra que podem se defender contra ameaças aéreas, de superfície e submarinas.
— Pode ser apenas uma demonstração de força [dos EUA], mas se for, será a mais cara da História — concluiu o coronel Paulo Filho, dando indícios de que os americanos devem intervir no conflito.
O presidente Trump, que raramente passa os fins de semana em Washington, deve retornar à Casa Branca na noite deste sábado para uma “Reunião de Segurança Nacional” não especificada, segundo informações da AFP. Na véspera, ele advertiu que Teerã tem “no máximo” duas semanas para evitar possíveis ataques aéreos americanos, enquanto Washington avalia se deve se juntar à campanha de bombardeios sem precedentes de Israel.
KC135s NITRO61-64 are joined with B2s MYTEE21 FLT.
KC135s NITRO71-74 are joined with B2s MYTEE11 FLT.
Two groups of B2s. pic.twitter.com/LAF1JV9Uch
— Aircraft Spots (@AircraftSpots) June 21, 2025
AR #2 out of Travis AFB, CA.
KC-46s HIFI81-82 supporting B-2s MYTEE21 FLT.
KC-46s HIFI83-84 supporting B-2s MYTEE11 FLT. pic.twitter.com/u9s1ksh6UJ
— Aircraft Spots (@AircraftSpots) June 21, 2025
Mais perigosa do mundo
Os bombardeiros furtivos B-2, de fabricação americana, são os únicos certificados para transportar as “bunker busters”, bombas de quase 14 toneladas projetadas para destruir bunkers subterrâneos profundos ou armas bem enterradas em instalações altamente protegidas. Acredita-se que a arma, cujo nome oficial é GBU-57/B Massive Ordnance Penetrator (MOP), também seja a única lançada por via aérea com alguma chance de destruir Fordow, a instalação nuclear mais fortemente protegida do Irã.
Considerada a arma não-nuclear mais perigosa do mundo, a bunker buster tem um revestimento de aço muito mais espesso e contém uma quantidade menor de explosivos do que bombas de uso geral de tamanho semelhante. Sua carcaça pesada permite que a munição permaneça intacta ao atravessar solo, rocha ou concreto antes de detonar, alcançando ao menos 60 metros de profundidade.
Atacar Fordow é central para qualquer esforço de destruir a capacidade do Irã de produzir armas nucleares. Mas a avaliação predominante é que Israel não consegue destruir Fordow sozinho. Os EUA bloquearam o fornecimento da bunker buster ao seu aliado e, embora as forças israelenses tenham caças, não desenvolveram bombardeiros pesados capazes de transportar essa arma.
Washington vê essa arma principalmente como um elemento de dissuasão, um ativo de segurança nacional exclusivo, mas que, se disponibilizado, poderia incentivar Israel a iniciar uma guerra com o Irã
Israel iniciou em 13 de junho uma campanha de ataques aéreos contra o Irã, alegando que Teerã estava prestes a produzir uma arma nuclear — uma ambição que Teerã negou. Os iranianos responderam com lançamentos de mísseis e drones.
Neste sábado, as Forças Armadas de Israel disseram que seus caças mataram o alto oficial iraniano Saeed Izadi, comandante da Guarda Revolucionária responsável pela coordenação com “a organização terrorista Hamas”, o movimento palestino com o qual Israel está em guerra em Gaza, em um ataque noturno em Qom, cidade ao sul de Teerã, próxima à usina de Fordow.
Além disso, alegaram a morte de outros dois comandantes da Guarda Revolucionária, o exército ideológico de Teerã: Aminpour Joudaki, que supostamente comandou “centenas” de ataques com drones contra Israel, segundo a fonte, e Behnam Shahriyari, comandante da Força Quds, o braço da Guarda Revolucionária para ações no exterior.
Quatro combatentes da Guarda Revolucionária também foram mortos em um ataque aéreo israelense contra um centro de treinamento em Tabriz, no noroeste do país, informou a agência de notícias Isna. Outros ataques israelenses atingiram “a infraestrutura de armazenamento e lançamento de mísseis no centro do Irã”, segundo os militares.
Israel também bombardeou “dois locais de produção de centrífugas” na instalação iraniana em Isfahã, na “segunda onda de ataques” contra o local desde o início da guerra, disse à AFP uma fonte militar, que pediu anonimato. A informação foi confirmada pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), segundo a qual “não havia material nuclear e, portanto, o ataque não terá consequências em termos de radiação”. As agências de notícias iranianas Mehr e Fars já haviam noticiado o ataque, que, segundo elas, não causou danos, graças às defesas aéreas.
Durante a tarde (horário local), o Exército anunciou novos ataques à “infraestrutura militar” no sudoeste do Irã, enquanto a imprensa iraniana noticiou que “poderosas explosões” foram ouvidas no centro e no norte da capital Teerã, no norte do país, embora não tenha ficado imediatamente claro se foram resultado de ataques israelenses ou de fogo da defesa aérea iraniana.
Outro ataque israelense, desta vez na cidade ocidental de Sumar, na província de Kermanshah, no oeste do Irã, matou pelo menos cinco militares e feriu outros nove, segundo a agência de notícias Fars, citando uma autoridade provincial. Hussein Khalil, um ex-guarda-costas de Hassan Nasrallah, o líder assassinado do Hezbollah, foi morto perto da fronteira com o Iraque após cruzar para o Irã, segundo uma autoridade do grupo libanês que falou à AFP sob condição de anonimato. Um grupo armado iraquiano informou que um de seus comandantes também foi morto no ataque e confirmou a morte de Khalil e seu filho.
Israel avalia que seus ataques a instalações nucleares e alvos militares iranianos já tenha “atrasado em pelo menos dois ou três anos a possibilidade de eles terem uma bomba nuclear”, disse o ministro das Relações Exteriores Gideon Saar.
— Faremos tudo o que pudermos para eliminar essa ameaça — afirmou em entrevista ao jornal alemão Bild, acrescentando que os ataques de Israel continuariam.
Importância simbólica
O principal objetivo de guerra restante de Israel é destruir a instalação de enriquecimento nuclear de Fordow, cuja área principal, segundo informações da “CNN”, a partir de acesso a documentos iranianos roubados ao longo dos últimos anos, fica entre 80 metros e 90 metros abaixo do nível do solo. Não há informações exatas sobre quando a instalação começou a ser construída, mas é especulado que isso teria acontecido entre 2002 e 2004.
Localizada perto da cidade de Qom, no centro do Irã, essa usina é uma das instalações mais sensíveis e estratégicas do programa nuclear iraniano. Construída numa montanha, foi projetada para resistir a ataques aéreos, o que a torna extremamente difícil de ser neutralizada militarmente. A existência do complexo foi revelada ao público em 2009, gerando fortes reações da comunidade internacional e aumentando as tensões sobre as intenções nucleares do Irã.
Originalmente desenvolvida para enriquecer urânio, Fordow abriga cerca de 3.000 centrífugas do modelo IR-1, embora o Irã já tenha iniciado o uso de modelos mais avançados, como o IR-6. Um acordo em 2015 previa que a instalação fosse convertida em um centro de pesquisa científica e médica, com atividades limitadas e sob monitoramento rigoroso da Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA). No entanto, após a escalada das tensões, o Irã restringiu o acesso dos inspetores internacionais e ampliou sua capacidade de enriquecimento na planta.
Além de seu papel técnico, Fordow tem grande importância simbólica e estratégica para o Irã. O fato de estar protegida por uma estrutura geográfica reforçada e de operar centrífugas avançadas faz com que ela seja vista como uma infraestrutura crítica por potências como EUA, Israel e aliados europeus. Em março de 2023, a AIEA informou que havia detectado urânio enriquecido a 83,7% de pureza nessa usina — próximo ao nível de 90% necessário para armas nucleares. O Irã, signatário do Tratado de Não Proliferação Nuclear, mantém que seu programa nuclear tem fins pacíficos.
Saída diplomática
As potências europeias estão tentando encontrar uma solução diplomática para a guerra. Na sexta-feira, os ministros das Relações Exteriores de França, Reino Unido e Alemanha, além da chefe da diplomacia da União Europeia, reuniram-se em Genebra com seu homólogo iraniano e o instaram a retomar as negociações com os Estados Unidos, que foram interrompidas pelos ataques de Israel. Teerã, porém, alertou que só consideraria tal possibilidade se Israel cessasse os bombardeios.
Os apelos diplomáticos não surtiram efeito até o momento. Em resposta aos ataques israelenses, a Guarda Revolucionária anunciou neste sábado que lançou “operações combinadas” durante a noite com “vários esquadrões de drones Shahed” e mísseis contra território israelense, incluindo a área do Aeroporto Ben Gurion, perto de Tel Aviv. Um prédio residencial no Vale de Beit Shean, no norte de Israel, foi atingido por um ataque de drone, informaram os serviços de resgate, mas não houve vítimas. Um hospital no porto israelense de Haifa registrou 19 feridos, incluindo uma pessoa em estado grave, após a última salva iraniana.
Uma tentativa de ataque planejada pelo Irã contra cidadãos israelenses no Chipre também foi frustrada com a ajuda das autoridades de Nicósia, informou o ministro israelense das Relações Exteriores, Gideon Saar, neste sábado. A uma hora de voo de Tel Aviv, o país é um dos destinos favoritos dos turistas israelenses. O Aeroporto Internacional de Lárnaca, o principal da república cipriota, é um dos principais pontos de trânsito da ponte aérea organizada pelas autoridades israelenses para repatriar dezenas de milhares de israelenses bloqueados no exterior após o fechamento do espaço aéreo nacional pelo início da guerra contra o Irã.
As Forças Armadas do Irã também ameaçaram neste sábado atacar os carregamentos de ajuda militar a Israel durante o conflito:
“Advertimos que o envio de qualquer equipamento militar ou de radar por barco ou aeronave de qualquer país para auxiliar o regime sionista será considerado participação na agressão contra o Irã islâmico e será um alvo legítimo para as Forças Armadas”, disse um porta-voz em um comunicado em vídeo transmitido pela TV estatal.
O presidente francês, Emmanuel Macron, afirmou neste sábado que os países europeus “acelerariam as negociações” com o Irã para “sair da guerra e evitar perigos mais sérios”, após uma conversa telefônica com o presidente iraniano, Massoud Pezeshkian.
“Estou convencido de que existe uma saída para a guerra e para evitar perigos mais sérios”, disse Macron, em inglês, na rede social X. “Para isso, aceleraremos as negociações lideradas pela França e seus parceiros europeus com o Irã. O Irã jamais deve adquirir armas nucleares. Cabe ao Irã fornecer todas as garantias de que suas intenções são pacíficas .”
Por outro lado, Pezeshkian, descartou a possibilidade de seu país cessar as atividades nucleares “sob quaisquer circunstâncias” e ameaçou uma resposta “ainda mais devastadora” à contínua “agressão” de Israel neste sábado.
“Estamos dispostos a dialogar e cooperar para construir confiança no campo das atividades nucleares pacíficas; no entanto, não concordamos em reduzir as atividades nucleares a zero sob nenhuma circunstância”, declarou durante o telefonema com Macron, segundo a agência de notícias oficial Irna.
O líder iraniano também defendeu que o direito de seu país de desenvolver um programa nuclear civil não pode ser retirado por uma guerra.
“O Irã sempre anunciou que está pronto para fornecer garantias e construir confiança em suas atividades nucleares pacíficas dentro da estrutura do direito internacional”, acrescentou Pezeshkian. “Os direitos garantidos a países e nações pelo direito internacional não podem ser retirados deles por ameaças ou guerra.”
Na véspera, Trump desdenhou dos esforços diplomáticos europeus:
— O Irã não quer falar com a Europa. Eles querem falar conosco. A Europa não vai poder ajudar nisso — disse ele a repórteres, acrescentando que é improvável que peça a Israel para parar seus ataques para que o Irã volte à mesa de negociações. — Se alguém está ganhando, é um pouco mais difícil fazer isso.
Desde o início da guerra, mais de 400 pessoas morreram e mais de 3.000 ficaram feridas, segundo o último balanço do Ministério da Saúde iraniano, divulgados neste sábado. Ataques de retaliação iranianos teriam deixado pelo menos 25 mortos em Israel, segundo autoridades israelenses.
(Com agências internacionais).
O GLOBO
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