Da Escalada Convencional à Guerra Irregular: Israel, Estados Unidos e o Confronto com o Irã – O que se pode evidenciar na Doutrina Militar Terrestre

Da Escalada Convencional à Guerra Irregular: Israel, Estados Unidos e o Confronto com o Irã – O que se pode evidenciar na Doutrina Militar Terrestre Foto divulgada pela Agência de Notícias Militar do Irã, em 23JUN2025, Gen Exército Amir Hatami, centro, Almirante Mahmoud Mousavi, direita e Almirante Habibollah Sayyarino QG Zolfaghar com o objetivo que as suas principais lideranças militares ainda estavam vivas.

Frederico Salóes
Mestre em Ciências Militares
Especialista em Guerra Irregular

INTRODUÇÃO

Em 21 de junho de 2025, bombardeiros B-2 norte-americanos golpearam as instalações do programa nuclear iraniano. O ataque marcou o ponto mais perigoso de uma escalada iniciada em outubro de 2024, quando Israel lançou três ondas de ataque contra alvos localizados no Irã, e acompanhada por protestos anti-ocidentais em Teerã, Bagdá e Beirute.

Consciente de que uma campanha convencional total poderia incendiar o Oriente Médio, Washington e Tel-Aviv podem recorrer a uma estratégia híbrida: combinar bombardeios limitados a operações de informação e guerra irregular, por meio do apoio clandestino a grupos de oposição, apostando em explorar fissuras internas que desestabilizem o regime.

Teerã, por sua vez, ativa a sua própria caixa de ferramentas assimétricas. A Guarda Revolucionária sustenta uma rede de proxies que vai do Hezbollah, no Líbano, a Saraya al Ashtar, no Bahrein, financiada por circuitos ilícitos de drogas, ouro e criptomoedas. Nesse tabuleiro de sombras, o Brasil não é mero espectador. A Tríplice Fronteira da América do Sul, entre Brasil, Argentina e Paraguai, abriga células de apoio logístico e financeiro ao Hezbollah (UNICRI, 2024), enquanto a economia brasileira depende de fertilizantes que atravessam o Estreito de Ormuz — gargalo que o Irã já ameaçou bloquear.

Este artigo examina como a guerra irregular se tornou opção viável para mudança de regime, de que forma o nexo crime-terror amplia a resiliência iraniana e como a doutrina militar terrestre se encontra em consonância com os conflitos modernos. Ao cruzar esses referenciais com casos curdos, proxies regionais e cenários 2025-27, o estudo propõe uma visão heterodoxa acerca da incerteza que paira sobre o Irã.

1 Da Pérsia a Teerã: identidade milenar, cisnes negros e guerras cíclicas

Em 21 de março de 1935, Reza Xá Pahlavi solicitou à Liga das Nações que as chancelarias abandonassem a designação “Pérsia” e passassem a usar Irã, “terra dos arianos”. A mudança não revogou uma herança que remonta aos aquemênidas: a consciência de ser uma civilização sitiada, habituada a confrontos periódicos com potências ocidentais.

A noção de continuidade persa alimenta tanto o discurso nacionalista do atual regime quanto as contranarrativas liberais que evocam um passado pré-islâmico para desejar um “Irã que poderia ter sido”. Reportagens recentes recordam que tribos persas já se espalhavam pela Ásia Central há 3.000 anos e que suas guerras contra as pólis gregas marcaram o nascimento da historiografia de Heródoto. Num arco longo, tais confrontos criaram o padrão cíclico de contenção ao Oriente que ainda molda o cálculo estratégico de Atenas, Roma, Londres, Washington — e, hoje, Tel-Aviv.

O historiador Demétrio Magnoli observa que a “luta contra os persas galvanizou a Liga Helênica” nos séculos V e IV a.C., obrigando cidades rivais a forjar alianças marítimas e terrestres contra um inimigo comum (MAGNOLI, 2013). O episódio ilustra dois traços permanentes:

(i) a capacidade persa de projetar poder muito além do planalto iraniano;
(ii) o reflexo de Estados, alguns vizinhos, em criar coligações assimétricas para conter essa projeção — de Esparta e Atenas a Estados Unidos e Israel.

Entretanto, a história persa ⁄ iraniana não evolui em linha reta: avança por saltos imprevisíveis. Nassim Taleb chama tais rupturas de Cisnes Negros — eventos raros, de impacto extremo, explicados retroativamente, mas jamais previstos antes do estopim (TALEB, 2007, p. 25-27). A Revolução Constitucional de 1906, o golpe patrocinado pela CIA e MI-6 em 1953 e a Revolução Islâmica de 1979 são exemplos locais de “raridade, impacto extremo e previsibilidade retrospectiva”. Cada um reconfigurou o tabuleiro regional, abrindo janelas para atores externos ou fechando-as de modo abrupto.

Essas viradas moldam a psique estratégica de Teerã. Ao mesmo tempo que se percebe herdeira de um império de 2 500 anos, a república pós-1979 lê sua própria história como sucessão de invasões, conspirações e ressurgimentos — narrativa que legitima a doutrina de “resistência avançada” (defesa além-fronteiras por meio de proxies). Para opositores seculares, entretanto, o apelo à “grande Pérsia” funciona como lembrete de que regimes passam, enquanto a nação persevera.

O impasse atual, com bombardeios norte-americanos e retaliações israelenses, insere-se nesse quisco de longa duração: potências ocidentais tentam limitar o alcance iraniano; Teerã responde evocando Ciro, Xerxes e a epopeia das Termópilas.

Compreender tal continuum histórico-identitário é essencial para avaliar por que guerra irregular e operações clandestinas aparecem, em Washington e Tel-Aviv, como opção “segura” de derrubar ou remodelar um regime que se diz invencível desde Dario I — e por que, paradoxalmente, cada tentativa ocidental produz novos “cisnes negros” que prolongam o ciclo. Nas seções seguintes, examinaremos como essa dialética se manifesta na doutrina de Guerra Irregular, nas redes de proxies financiadas por ilícitos e, enfim, nos reflexos que já chegam à Tríplice Fronteira e ao Atlântico Sul.

2 Escalada 2024-2025: ataques aéreos, guerra naval e o retorno da zona cinzenta

A presente crise começou em 7 de outubro de 2024, quando milícias ligadas ao Corpo da Guarda Revolucionária Iraniana (IRGC) intensificaram o lançamento de foguetes a partir da Síria contra o norte de Israel. A retaliação de Tel-Aviv incluiu, em novembro, ataques a depósitos de drones perto de Isfahan. Em março de 2025, drones “Shahed-type” atingiram petroleiros no golfo de Omã, provocando uma operação de escolta dos EUA semelhante à Earnest Will (1987-88). O ponto de inflexão veio na noite de 21 de junho de 2025, quando bombardeiros B-2 norte-americanos atingiram sistemas de radar e de guerra eletrônica no sudoeste iraniano, abrindo a Fase 1 de “coerção cinzenta”: danos militares limitados, alto impacto psicológico.

Documento divulgado pelo Pentagono Operação Midnight Hammer. Clique na imagem para maior resolução

Para Washington e Tel-Aviv, a “pancada” precisa ser bastante forte para dissuadir, mas não tão devastadora que obrigue Teerã a declarar guerra formal. Esse cálculo enquadra-se no conceito de zona cinzenta, apresentado em 2016 pelo General Joseph Votel, ex-Comandante do Comando de Operações Especiais do Estados Unidos da América e do Comando Central, responsável pelas operações militar no Oriente Médio, em que se caracteriza um “confronto abaixo do limiar da guerra aberta, explorando ambiguidade jurídica, negação plausível de responsabilidade e ritmo incremental”. O objetivo é manter a iniciativa sem ultrapassar a “linha vermelha” que levaria potências como China ou Rússia a apoiar abertamente o Irã.

Logo após o bombardeio, milhares saíram às ruas de Teerã, Bagdá e Beirute, bradando “Morte à América” e queimando bandeiras israelenses. Paralelamente, a oposição iraniana no exílio viu “uma janela rara, mas ainda estreita” para mobilizar protestos de massa, embora o medo de repressão e a fragmentação de lideranças limitem a adesão. Analistas observam que boa parte da juventude permanece “exausta e cética”, lembrando que revoltas anteriores — 2009, 2019, 2022 — terminaram em centenas de mortos e zero reforma estrutural.

O regime, por sua vez, intensificou a coerção interna: a Guarda Revolucionária deteve três parentes da âncora da rede de TV Iran International, exigindo que a jornalista “saísse do ar” sob pena de tortura. Esse método — punir a família para silenciar a diáspora — sustenta a narrativa de “cerco externo” e, ao mesmo tempo, inibe articulações oposicionistas dentro do país.

Em entrevista ao canal de TV norte-americano Fox News, Jamil Jaffer, ex-conselheiro do Senado norte-americano, afirmou que “as greves abriram oportunidade inédita para um levante interno”. No entanto, oposicionistas alertam contra abraçar “planos de mudança de regime traçados em capitais estrangeiras” — receio que ecoa a memória amarga do golpe de 1953. Essa dissonância interna torna‐se fator-chave no cálculo da Guerra Irregular: quanto maior o hiato entre as oposições ao regime dos aiatolás, menor a probabilidade de que um Movimento Revolucionário, patrocinado ou não, tenha êxito.

A doutrina norte-americana de Guerra Irregular (FM 3-05.130) sugere que ataques limitados devem ser acompanhados por operações de informação e apoio clandestino a movimentos de resistência. Entretanto, o manual alerta: prolongar-se na zona cinzenta gera “fadiga de credibilidade” entre aliados e abre espaço para cisnes negros — eventos imprevisíveis de alto impacto.

O próximo movimento, portanto, dependerá de duas variáveis: (i) capacidade do regime de evitar que protestos locais se transformem em massa crítica revolucionária; (ii) apetite dos EUA e de Israel para sustentar uma campanha de desgaste que, por definição, oferece vitória difusa e custos diluídos, mas não nulos.

3 Irã sob pressão: pilares de poder, fissuras sociais e apoio ilícito

A estabilidade do atual regime repousa sobre três pilares interligados: a autoridade religiosa do líder supremo; o braço armado‐ideológico da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC); e uma teia de mercados ilícitos que garante recursos financeiros, lealdade de facções armadas e capacidade de projetar força. O relatório da Global Initiative Against Transnational Organized Crime (GI-TOC) mostra que Teerã “weaponiza” mercados ilícitos para cumprir cinco objetivos estratégicos: conter dissidência, enfraquecer adversários sem confronto direto, fortalecer aliados, recuperar acesso a divisas e ampliar capacidades assimétricas.

A IRGC funciona como “Estado dentro do Estado”, controlando conglomerados industriais, canais de contrabando e meios de comunicação. Seu braço externo, a Força Quds, gere o apoio a proxies no Levante, na Península Arábica e até na América Latina. A mesma estrutura, nota o GI-TOC, conduz operações de sequestro e assassinato contra dissidentes no exterior, usando redes criminais que oferecem negação plausível de responsabilidade ao regime iraniano.

Apesar de três ondas de manifestações na última década (2009, 2019, 2022), nenhuma delas atingiu um potencial revolucionário crítico. De maneira geral, a oposição iraniana se encontra dividida, cautelosa, temerosa da repressão. Jovens iranianos assumem um “dilema de dois males”: rejeitam o regime, mas temem que uma guerra com Israel ou EUA piore a situação.

Sanções corroeram receitas formais de petróleo; a resposta foi integrar IRGC, Hezbollah e redes de lavagem de dinheiro em hubs como Dubai, Turquia e Tríplice Fronteira sul-americana. Segundo o GI-TOC, Hezbollah “ocupa papel crucial” na limpeza de capitais via câmbio paralelo, diamantes e empresas de fachada. O mesmo documento revela que cartéis de droga se envolveram em tentativas de fornecimento de urânio e plutônio ao Irã, evidenciando a fusão entre crime organizado e ambição nuclear.

Partido da Vida Livre do Curdistão (PJAK)

Segundo o GI-TOC (2024), a convergência entre crime transnacional e ambição nuclear iraniana ganhou contornos evidentes em 21 de fevereiro de 2024, quando o Departamento de Justiça dos EUA indiciou o chefe da Yakuza, Takeshi Ebisawa, e o contrabandista tailandês Somphop Singhasiri por tentar vender urânio e plutônio de grau bélico, originários de Mianmar, para intermediários que diziam representar Teerã. A dupla já respondia por negociar toneladas de heroína e metanfetamina — evidência de que redes especializadas em narcóticos podem migrar para mercados ainda mais sensíveis quando o lucro compensa o risco.

O mesmo pacote incluía a oferta de mísseis terra-ar desviados do Afeganistão, mostrando que a infraestrutura de tráfico de drogas, armas e minerais raros opera como corredor único para demandas estratégicas do Irã. O episódio, descrito como “exemplo paradigmático de convergência de ameaças”, ressalta que proxies de Teerã não apenas lavam dinheiro de entorpecentes, mas também recorrem a cartéis e máfias para adquirir insumos nucleares altamente regulados, encurtando a distância entre economia ilícita e proliferação de armas de destruição em massa.

Ainda que resiliente, o regime exibe rachaduras: inflação de dois dígitos, desemprego juvenil superior a 27 %, minorias baluchs e curdas marginalizadas. Para analistas internacionais, sanções cirúrgicas sobre as estruturas de lavagem de dinheiro (corretoras de câmbio, bandeiras de conveniência marítima) podem gerar tanta pressão no governo de Teerã quanto as bombas de precisão. Em síntese, o regime iraniano combina repressão doméstica inteligente com economia ilícita transnacional para absorver choques externos e impedir convergência oposicionista. Esse equilíbrio tenso define o tabuleiro em que EUA e Israel cogitam empregar guerra irregular: amplificar fissuras internas sem escalar para confronto convencional.

4 Guerra irregular como ferramenta de mudança de regime

A preferência de Washington por “levar o regime a colapsar por dentro” assenta-se em doutrinas consolidadas que descrevem como capacitar insurreições quando o emprego de forças convencionais seria politicamente demasiado caro.  Nos Estados Unidos, a Guerra Irregular é descrita como um conjunto de “atividades destinadas a capacitar um movimento de resistência para coagir, perturbar ou derrubar um governo em área negada”. O arcabouço doutrinário ocidental converge na lógica de protagonismo local, negação plausível de responsabilidade e execução em sete fases — preparação, contato, infiltração, organização, expansão, emprego e transição.

A fase de transição se torna a mais crítica e a que apresenta maior chance de insucesso. De acordo com o documento da Universidade Conjunta das Operações Especiais (Joint Special Operations University – JSOU), do Comando de Operações Especiais dos Estados Unidos da América, “Resistance Operating Concept” (JSOU, 2020a), a última fase deve ser concebida ainda no planejamento e consiste na construção da estrutura de governança que substituirá o regime. Sua dificuldade resulta no alinhamento de interesses entre a liderança de Washington e os anseios dos protagonistas do novo governo.

O Processo de Tomada de Decisão para Apoio de Resistência (JSOU, 2020b) acrescenta cinco pré-requisitos para autorizar uma campanha: (1) objetivos compatíveis; (2) refúgios seguros; (3) liderança coesa; (4) comunicações protegidas; (5) apoio popular mínimo de 15 %. No Irã, porém, esses requisitos trombam com realidade adversa: oposição fragmentada, vigilância eletrônica intensa e controle quase absoluto da Guarda Revolucionária sobre espaços físicos e digitais.

Os precedentes recentes revelam o perigo de subestimar o pós-conflito. No Afeganistão (2001-2002), o Talibã ruiu em semanas, mas retornou ao poder em 2021 porque a fase de transição foi mal concebida (JSOU, 2019). Na Líbia (2011), a derrubada de Khadafi legou um mosaico de milícias rivais (ECEME, 2022). A advertência de Stanley McChrystal permanece válida: “derrubar é fácil; estabilizar exige décadas” (CRAFTING STRATEGY, 2021, p. 112).

Essas lições forçam planejadores a integrar ação cinética mínima com domínio informacional máximo. O estudo “Proxy Warfare in the Information Age”, realizado em 2019, comprova que sabotagem só se converte em efeito estratégico quando vem acompanhada de campanhas digitais capazes de viralizar em 48 h (JSOU, 2019). Num Irã hiperfragmentado, eventuais ataques a depósitos da IRGC precisariam de hashtags em persa, árabe e curdo que deslegitimem o poder antes que ele recupere a narrativa.

Um vetor potencial para a Guerra Irregular são as facções curdas do Curdistão iraniano. O Partido da Vida Livre do Curdistão (Partiya Jiyana Azad a Kurdistanê – PJAK), braço iraniano do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (Partiya Karkerên Kurdistan – PKK), busca discretamente abrir canais com o serviço secreto israelense, oferecendo inteligência sobre depósitos de drones e rotas de combustível da Guarda Revolucionária em troca de apoio logístico.

Outras organizações, como a Sociedade de Trabalhadores Revolucionários do Curdistão Iraniano, comumente abreviado de Komalah e o Partido Democrático Curdo do Irã (حزب دموکرات کردستان ایران – KDPI), reagem à guerra Israel-Irã com cautela: avaliam que um patrocínio estrangeiro pode fortalecer a causa curda, mas temem virar “bode expiatório” de Teerã e perder respaldo popular se forem vistos como marionetes externas. Jornalistas locais acrescentam que segmentos curdos no norte do Iraque declaram apoio aberto às operações israelenses contra o regime iraniano, enxergando-as como oportunidade histórica para enfraquecer Teerã.

Essa fragmentação entre “abertos ao apoio” e “temerosos de estigmatização” representa um grande desafio: o patrocinador só avança se houver convergência real de objetivos e liderança coesa; caso contrário, a infiltração converte-se em passivo estratégico.

Mesmo atendendo a todos os requisitos, três riscos persistem. Escalada regional do conflito: o “Eixo da Resistência” – Hezbollah no Líbano e na Síria, as Forças de Mobilização Popular (PMF) no Iraque, os Houthis no Iêmen e facções palestinas prometeram retaliar qualquer tentativa de mudança de regime, o que poderia arrastar EUA e Israel para uma guerra declarada, com “boots on the ground” e sangue norte-americano e israelense derramado. Desgaste de legitimidade internacional: ações clandestinas evocam o golpe de 1953, reforçando reflexos nacionalistas que hoje dividem a oposição. Vacância de poder: se Teerã cair sem transição pactuada, o país pode reproduzir o caos líbio — proliferação de milícias, tráfico de armas e crise humanitária — anulando ganhos estratégicos (JSOU, 2019).

Diferença entre a Guerra Convencional e a Guerra Irregular Fonte Autor

Em suma, a Guerra Irregular oferece alavanca relativamente barata em termos de tropas convencionais, mas seu custo estratégico final depende de variáveis quase sempre fora do controle do patrocinador. O Eixo da Resistência costuma monopolizar a atenção sobre a projeção militar do Irã. Contudo, a malha de terceiros atores de Teerã inclui grupos tão diversos quanto o Jaish al-Adl, milícia sunita baluch baseada no Paquistão, alvo de mísseis iranianos em 2024 e considerada organização terrorista pelo governo iraniano, norte-americano e japonês. O ataque balístico agravou uma relação já tensa entre Islamabad e Teerã, do mesmo modo que o grupo reivindicou dezenas de emboscadas contra postos da Guarda Revolucionária no Sistan-Baluchistão. A lição é clara: o Irã opera com proxies, alguns xiitas e outros com interesses convergentes, mas também enfrenta sunitas separatistas.

5 Rede de proxies e nexo crime-terror: das montanhas do Baluchistão à Tríplice Fronteira

No plano conceitual, o estudo “Proxy Warfare in the Information Age” define proxies como “instrumentos de baixo custo, alta negação plausível de responsabilidade e profunda valia estratégica” (JSOU, 2019). Um segundo ensaio da própria JSOU — “Economia Não-Convencional: Operações Econômicas na Guerra Irregular” — observa que campanhas desse tipo só prosperam quando contam com sustentação logística externa robusta e fluxos financeiros resilientes, oriundos de atividades ilícitas ou de Estados patrocinadores (JSOU, 2016). É aí que entra o nexo crime-terror: segundo o relatório GI-TOC, Teerã e seus aliados controlam cadeias de drogas, ouro de conflito, cigarro de contrabando e criptoativos para financiar operações, contornar sanções e premiar lideranças locais (GI-TOC, 2024).

Um dos casos mais ilustrativos ocorreu em fevereiro de 2024, quando uma aliança formada por um líder da Yakuza e um contrabandista tailandês citado anteriormente. O episódio demonstra que as mesmas rotas usadas para narcóticos podem trafegar materiais estratégicos, encurtando distância entre economia ilícita e proliferação nuclear.

A América do Sul é peça desse quebra-cabeça. Relatório da UNICRI confirma que a Tríplice Fronteira Brasil-Paraguai-Argentina funciona como hub de lavagem de dinheiro para Hezbollah desde os anos 1990 (UNICRI, 2024). Em maio de 2025, os EUA ofereceram recompensa de US$ 10 milhões por informações que levem a líderes do Hezbollah na região, recado explícito de que Washington está disposto a atuar fora de seu território.

Do ponto de vista doutrinário, o “JSOU-Unconventional Economy” recorda que insurgências “só sobrevivem se converterem mercados ilícitos em sistema de tributação próprio” (JSOU, 2016). Thomas Rid e Marc Hecker, em “Irregular War 2.0”, acrescentam que esses mesmos atores dominam redes sociais para recrutar, intimidar e lavar reputação – fenômeno que reduzirá ainda mais a linha entre crime organizado, propaganda e poder militar (RID & HECKER, 2009).

A fim de neutralizar esse nexo, especialistas que qualquer operação externa contra cartéis ou redes terroristas deve responder a cinco perguntas-chave: quais condições de vitória, qual amparo legal, quem apoia localmente, como mitigar baixas civis e como evitar escalada (SMALL WARS JOURNAL, 2025). Tais interrogações são pertinentes ao Brasil, que enfrenta a presença Hezbollah-PCC na fronteira, mas reluta em permitir ações unilaterais dos EUA em seu território.

Dessa combinação emerge um quadro no qual proxies iranianos e cartéis latino-americanos convergem em logística, finanças e narrativa online, formando um ecossistema híbrido que amplia a resiliência de Teerã e complica qualquer campanha de Guerra Irregular planejada por potências ocidentais em razão dos vínculos geopolíticos estabelecidos.

6 Cenários prospectivos 2025-2027

O conflito Israel–Estados Unidos × Irã entrou num ciclo de ação-reação típico da zona cinzenta, em que cada ajuste coercitivo gera contra-ajuste até que um evento maior desestabilize o sistema. O estudo Perseverando na Zona Cinzenta descreve esse fenômeno como “escaladas graduais, porém cumulativas, que empurram os atores para o limiar do confronto aberto” (USSOCOM, 2016, p. 12). Quatro trajetórias se destacam para os próximos 24 meses:

1.Escalada cibernética dirigida: Israel pode repetir a lógica do Stuxnet (2010), lançando exploits contra centrífugas em Natanz ou contra refinarias no Khuzistão. Em resposta, a unidade de guerra cibernética da Guarda Revolucionária dispõe de ferramentas aptas a atacar portos mediterrâneos ou distribuidoras elétricas no golfo. Custos financeiros são baixos, negação plausível de responsabilidade é alta e a margem de escalar para combate convencional permanece opcional.

2. Bloqueio naval seletivo: Minas “limpet” ou drones navais aplicados em navios-tanque no Estreito de Ormuz podem elevar o Brent para além de US$ 120, afetando diretamente o agronegócio brasileiro, dependente de diesel marítimo e fertilizantes que transitam por essa rota. A Global Initiative projeta que “ações limitadas sobre gargalos marítimos tendem a ser o primeiro recurso de Teerã quando a diplomacia falha”.

3. Implosão interna assistida: Washington e Tel-Aviv podem intensificar apoio clandestino a protestos urbanos e a minorias baluchs ou curdas. Entretanto, sem liderança alternativa visível a queda do regime tende a gerar violência sectária e fragmentação territorial. No Brasil, as consequências seriam demandas de extradição e eventual pressão para adotar sanções secundárias.

Indicadores estratégicos para monitorar qual cenário prevalecerá incluem: frequência de incidentes cibernéticos reivindicados; cotação diária do Brent acima de US$ 110; protestos em Teerã com mais de 100 000 manifestantes; e a retomada (ou congelamento) oficial das negociações nucleares em Viena.

7 Paralelos com a Doutrina Militar Terrestre

Se transpusermos o tabuleiro Irã–Estados Unidos–Israel para a lógica da Doutrina Militar Terrestre brasileiro manuais MC 3.0 – Operações (2025) e EB20-MF-07.101 – Operações de Convergência 2040 (2023), emergem três eixos doutrinários particularmente úteis para compreender — ou planejar — campanhas sob o limiar da guerra aberta.

O primeiro deles se concentra na Moldagem multidomínio. O capítulo 3 do novo Manual de Operações do Exército Brasileiro, Manual de Campanha 3.0 – Operações (2025), define moldagem como “ações destinadas a influenciar, cooperar e preparar o ambiente operacional antes do emprego decisivo”. No caso do conflito no Oriente Médio, isso equivaleria a infiltrar narrativas em persa, árabe e curdo, sincronizar ataques cibernéticos a infraestruturas críticas e estimular pressões econômicas que enfraqueçam a coesão do regime. O manual enfatiza que moldagem bem-sucedida deve ser invisível ou ambígua, para que o adversário só perceba o deslocamento do equilíbrio quando já estiver em posição desfavorável.

Convergência de domínios. O documento EB20-MF-07.101, Operação de Convergência 2040 (2025), propõe a sobreposição simultânea de efeitos letais e não letais em todos os domínios — terrestre, aéreo, marítimo, cibernético, espacial e eletromagnético — de modo a “colapsar o sistema de decisão inimigo antes que ele possa reagir”. No Golfo, isso significaria articular, no mesmo ciclo de decisão, a interdição de drones Shahed, o bloqueio de criptocarteiras vinculadas à Guarda Revolucionária e a saturação da opinião pública iraniana com mensagens que ressuscitem memórias traumáticas, como a guerra Irã-Iraque. Quanto maior a simultaneidade, menor a probabilidade de escalada convencional, pois o alvo fica sem ponto focal para responder.

Estabilização como operação de base. Ambos os manuais convergem ao elevar estabilização ao mesmo patamar dos esforços ofensivos e defensivos. O MC 3.0 define estabilizar como “proteger a população, restaurar a ordem e reconstruir instituições”; o documento de Convergência reforça que a fase deve iniciar “no dia zero” do planejamento, em vez de ser delegada a atores civis após o conflito. Para um eventual pós-Teerã, isso implicaria prever forças de segurança e de ajuda humanitária, corredores humanitários e mecanismos de justiça transicional antes mesmo do primeiro drone decolar.

8 Moldagem, Convergência e Estabilização vistas pelas Guerra Irregular

Os manuais brasileiros MC 3.0 – Operações (2025) e EB20-MF-07.101 – Operações de Convergência 2040 (2023) oferecem um tripé ― moldagem, convergência e estabilização ― que se encaixa com precisão nas sete fases da Guerra Irregular, conforme a doutrina norte-americana (FM 3-05.130) e permite compreender como a Doutrina Militar Terrestre está atualizada e visualizar pontos de tangência com os conflitos do Século XXI.

Fases 0-II = Moldagem multidomínio. A Preparação (0) identifica fissuras socioeconômicas, constrói narrativas e estabelece canais clandestinos. No conflito Irã–EUA–Israel, isso traduziu-se em hashtags em persa e árabe que ligavam apagões à incompetência da Guarda Revolucionária (TIMES OF ISRAEL, 2025), sanções financeiras seletivas e sondagens discretas aos curdos. A Contato Inicial (I) testa convergência de objetivos com líderes de resistência; se falha, o patrocínio é negado (JSOU, 2020b). A Infiltração (II) posiciona Inteligência Forças Especiais, Assuntos Civis e Operações Psicológicas, refletindo a exigência, prevista no MC 3.0, de reunir inteligência financeira, diplomacia e guerra cibernética no terreno antes do emprego físico.

Fases III-V = Convergência de domínios. Na Organização (III), Força de Guerrilha (urbana ou rural), Força Subterrânea e Força de Sustentação são fundidos a lavadores de capitais e células de mídia social em uma mesma rede de Comando e Controle. A Expansão (IV) dispara ataques simultâneos a oleodutos, congela criptocarteiras da IRGC e viraliza a hashtag #Iran_Collapse; é a “massa de efeitos” preconizada pelo Convergência 2040. A Emprego (V) lança operações quase convencionais — drones suicidas, fogos de precisão, bloqueios navais — sincronizadas com ofensivas de informação, tudo sem roubar o protagonismo local, conforme orienta o Resistance Operating Concept (JSOU, 2020a).

Fase VI = Estabilização como operação de base. Encerrada a fase cinética, inicia-se a transição. O MC 10.251 – Assuntos Civis (EB, 2021) define estabilizar como proteger a população e reconstruir instituições “desde o dia zero”. Estudos do JSOU (2014) mostram que 70 % das insurreições vitoriosas voltam à guerra civil se serviços essenciais não são restabelecidos em 72 h. Nesse quadro, equipes CIMIC distribuem compensações rápidas, reativam mercados e negociam com clérigos um acordo social mínimo, enquanto diplomatas garantem que potências vizinhas não preencham o vácuo.

Ao relacionar as sete fases da Guerra Irregular aos conceitos mais modernos da Doutrina Militar Terrestre, percebe-se um ciclo indivisível: moldagem cria condições, convergência neutraliza a resistência e estabilização legitima o resultado. Falhar em qualquer elo produz o “efeito-bumerangue” visto no Afeganistão e na Líbia: vitórias táticas degeneram em crises prolongadas. Para o tabuleiro iraniano, isso explica por que os bombardeios de 21 de junho foram seguidos por campanhas de informação multilíngues e discretos contatos com dissidências internas: sem moldagem, as bombas nada mudariam; sem plano de estabilização, o ganho estratégico evaporia ao nascer do dia seguinte.

9 Lições Antecipadas: o que já pode ser internalizado

Mesmo antes de um desfecho, o confronto Irã–EUA–Israel oferece algumas lições que forças terrestres e formuladores de política podem assimilar imediatamente.

  • 1. Preeminência do domínio cognitivo. O primeiro projétil a ser disparado foi na dimensão informacional: hashtags em persa (#قطع_برق, “corte de luz”) e em árabe (#إيران_تنهار, “Irã em colapso”) que culpavam a Guarda Revolucionária pelos apagões em Teerã. Em menos de 48 horas, o Ministério das Relações Exteriores de Israel converteu esse impulso em uma engrenagem de propaganda multilíngue. Vídeos-explicativos de 30 segundos em inglês circularam no X e no YouTube com o título “From the Straits of Hormuz to Your Backyard”, vinculando drones iranianos ao aumento do frete global. Infográficos foram adaptados para espanhol e português, associando Hezbollah a cartéis sul-americanos; um carrossel em francês no Instagram da embaixada em Paris retratava ataques houthis a navios de bandeira europeia; podcasts em hebraico reforçavam a coesão interna israelense; e memes em farsi, distribuídos via canais Telegram anti-regime, ridicularizavam o gasto de Teerã com proxies enquanto faltava gás de cozinha em casa. Até micro-influenciadores africanos foram cooptados no TikTok para explicar como um Irã nuclear encareceria grãos e fertilizantes em Lagos ou Nairóbi, transformando a percepção de ameaça de regional em planetária.

Esse ecossistema de influência opera em três camadas integradas: células de análise monitoram tendências em tempo real e injetam conteúdo nos picos de audiência; equipes especializadas segmentam mensagens para xiitas descontentes, sunitas temerosos e consumidores ocidentais preocupados com o preço do petróleo; e um laboratório de detecção de deepfake publica contranarrativas em até duas horas, corroendo a credibilidade de vídeos forjados pelo IRGC. O resultado confirma a premissa doutrinária de que, no poder militar moderno, “sistemas de influência” são tão essenciais quanto artilharia ou blindados: quem captura o fluxo informacional amplia a própria margem política, mina a legitimidade do adversário e molda o ambiente internacional antes que o primeiro míssil deixe o silo.

  • 2. Cadeias ilícitas como centro de gravidade. A greve contra depósitos de drones causou menos atrito que a operação financeira que congelou US$ 4 bilhões em criptos vinculadas à Guarda Revolucionária. Cortar fluxos ilícitos pode desgastar o inimigo com custo logístico menor do que prolongar campanhas cinéticas. Especialistas em economia não-convencional enfatizam que cada dólar negado equivale, a longo prazo, a um foguete que não será lançado.
  • 3. Necessidade de interoperabilidade interagências. A apreensão de plutônio na Ásia contou com cooperação entre DEA, Interpol e Forças de Operações Especiais dos Estados Unidos da América. Moldar, convergir e estabilizar exige integração de inteligência financeira, diplomacia e poder terrestre — repetir o modelo isolado das campanhas de 2001-2010 é receita certa para fracasso.
  • 4. Preparação para vacância de poder. Estudos comparativos do JSOU mostram que cerca de 70 % das insurreições vitoriosas acabam deslizando para nova guerra civil quando a etapa de transição é improvisada. A doutrina brasileira de Assuntos Civis (MC 70-10.251, 2021) alerta que, tão importante quanto a mudança de regime, é antecipar o vácuo político-administrativo que se abre no dia seguinte: cabe às frações de Assuntos Civis conduzir avaliações rápidas de necessidades, mapear lideranças comunitárias legítimas, estabelecer canais de cooperação civil-militar (CIMIC) e coordenar ações com agências humanitárias. A publicação destaca que estabilização eficiente começa com mapeamento de redes de poder local, linhas vitais de abastecimento e serviços essenciais, tarefas que exigem equipes treinadas em inteligência humanitária, negociação e gestão de crises — habilidades fora do escopo tradicional de infantaria ou artilharia.

A literatura norte-americana converge. O relatório “Community Stability Operations” (JSOU, 2014) demonstra que, no Afeganistão, destacamentos de Forças Especiais só obtiveram sucesso duradouro quando acoplaram “células de governança” capazes de restaurar mercados, escolas e conselhos tribais nas 72 h subsequentes à operação cinética. Mesmo o estudo sobre o Hezbollah (JSOU, 2010) evidencia como serviços sociais — saúde básica, água potável, compensações rápidas por danos — geram capital político superior à mera presença armada. Em termos práticos, preparar-se para a vacância de poder significa projetar tropas com módulos orgânicos de Assuntos Civis, engenheiros de reconstrução ligeira, oficiais de ligação com ONGs e especialistas em finanças de emergência, todos integrados a um mesmo esquema de comando e controle. Sem essa engrenagem, a probabilidade de retrocesso para conflito interno permanece alta, anulando ganhos militares alcançados a duro custo.

Assumir essas lições exige adaptabilidade sistêmica. Afinal, no campo de batalha híbrido o gesto tático — apertar o gatilho do fuzil ou puxar a cordinha do canhão — continua o mesmo, mas os alvos e o propósito tornaram-se mais refinados, direcionados a moldar percepções estratégicas na mente do inimigo e da opinião pública global. O ator que primeiro sincronizar influência, sufocamento financeiro e poder de fogo, ganhará vantagem assimétrica decisiva — mesmo antes de soar o primeiro disparo.

Conclusão

O confronto entre Estados Unidos, Israel e Irã comprova a migração do centro de gravidade da guerra: do choque convencional clássico para operações que unem influência digital, sabotagem precisa e sufocamento financeiro. A lógica tripla extraída da Doutrina Militar Terrestre Brasileira — moldagem, convergência e estabilização — fornece matriz analítica capaz de explicar tanto as ações já observadas quanto os cenários prospectivos.

Primeiro, moldagem deixou de ser prólogo; tornou-se campo de batalha primário. Quem controla a narrativa e a infraestrutura informacional ganha vantagem que bombas sozinhas não recuperam. Segundo, a convergência dos domínios exige sincronia de segundos entre guerra cibernética, fogos de precisão e operações de informação. Sem essa simultaneidade, o inimigo encontra tempo e espaço para absorver o impacto, ajustar-se e contra-atacar. Terceiro, estabilização define o valor estratégico do esforço: vitórias que não produzem ordem legítima são contadas como derrotas no longo prazo.

Esses princípios têm validade além do Oriente Médio. Qualquer teatro que junte economia ilícita transnacional, atores não estatais armados e competição de grandes potências replicará dilemas semelhantes. Para forças terrestres que desejem manter relevância, o caminho passa por incorporar capacidades de influência, inteligência financeira e intervenção humanitária ao mesmo tempo em que preservam letalidade. Para formuladores de política, a lição é que intervenções de curto prazo, sem orçamento e tempo para estabilizar, tendem a gerar crises mais profundas e dispendiosas.

Em última análise, o cálculo estratégico norte-americano repousa em duas realidades incontornáveis. Primeiro, o eleitorado dos EUA não tolerará um “novo Iraque”: o trauma de operações com “boots on the ground” longas, caras e televisivas faz da presença maciça de tropas no solo iraniano um risco político letal, sobretudo quando o relevo montanhoso, os desertos interiores e a ausência de aliados de fronteira transformariam qualquer desembarque em façanha logística. Segundo, o centro de gravidade da segurança dos EUA migrou para o Indo-Pacífico; deter a assertividade chinesa consome frotas, orçamentos e atenção presidencial que não podem ser drenados para Teerã. Nesse contexto, a opção não convencional — guerra irregular, sabotagem cibernética, estrangulamento financeiro — surge como ferramenta de pressão vantajosa e de baixa assinatura. Mas, como demonstrado ao longo do artigo, sua efetividade continua condicionada às mesmas ressalvas: narrativa convincente, convergência de domínios e, sobretudo, um plano realista de estabilização para evitar que a vitória tática se transforme em mais um atoleiro estratégico.

Finalmente, o caso Irã demonstra que operações de guerra irregular não são atalho barato: elas apenas deslocam o ônus logístico e político, exigindo planejamento antecipado de pós-conflito e cooperação interagências em nível não alcançado pelas campanhas do início do século. Ignorar essa realidade equivale a repetir erros já custosos. Aceitá-la, por outro lado, abre caminho para estratégias mais sutis, sincronizadas e sustentáveis — únicas compatíveis com a complexidade dos conflitos do Século XXI.

O post Da Escalada Convencional à Guerra Irregular: Israel, Estados Unidos e o Confronto com o Irã – O que se pode evidenciar na Doutrina Militar Terrestre apareceu primeiro em DefesaNet.