Ao mesmo tempo que comanda um batalhão em Gaza, tenente-coronel do exército de Israel mantém vínculos com empresas do ramo tecnológico no Brasil
Junio Silva, Jonatas Martins
Erez Yerushalmi é um, entre tantos outros militares das Forças de Defesa de Israel (FDI), que lutam contra o Hamas na Faixa de Gaza desde outubro de 2023. Ao mesmo tempo, no entanto, o tenente-coronel atua também no ramo do empreendedorismo e mantém laços com o setor de tecnologia e inovação no Brasil.
Entenda
- Erez Yerushalmi é um militar das Forças de Defesa de Israel (FDI). Ele também é um empreendedor no setor de tecnologia e possui diversas ligações com a área de inovação no Brasil.
- Além de sua atuação militar e empresarial, Yerushalmi aparece como mentor da BrazilLAB, uma associação privada que atua como “hub de inovação”. A organização busca conectar empreendedores de tecnologia com líderes políticos brasileiros para melhorar os serviços públicos.
- Yerushalmi é o chefe do 8105º Batalhão das FDI, que esteve intensamente envolvido na destruição da cidade de Beit Hanoun, no norte da Faixa de Gaza.
- A destruição sistemática de cidades em Gaza tem sido alvo de críticas internacionais, com a ONU apontando possíveis crimes de guerra por parte de militares israelenses.
- Yerushalmi, por sua vez, defende as ações de Israel em suas redes sociais, compartilhando sua experiência militar e elogiando a determinação de seu grupo.
Fundador de diversas empresas no ramo tecnológico, Yerushalmi se descreve como um “empreendedor e investidor no cenário da economia com propósito” no Linkedin — um conceito que, na teoria, visa não só lucro, mas também o valor social e humano.
Anos atrás, uma das fintechs do tenente-coronel foi adquirida por uma empresa brasileira que oferece crédito para microempreendedores nos estados do Ceará, do Maranhão, da Paraíba e de Pernambuco. Com a fusão, Yerushalmi foi elevado ao posto de diretor-geral da companhia no braço em Tel Aviv e alçado a um dos mentores da associação BrazilLAB.
Mentor no setor de inovação
A BrazilLAB é uma associação privada fundada em 2016 e, atualmente, tem sede na cidade de São José dos Campos (SP), sendo descrita como um “hub de inovação”. Basicamente, funciona como plataforma para unir e conectar empreendedores do setor de tecnologia com “líderes públicos” brasileiros. A organização também auxilia soluções desenvolvidas por startups, com foco na melhoria dos serviços governamentais.
As empresas que estão ligadas à associação divulgam, muitas vezes, que possuem respostas inovadoras e estratégicas para os setores públicos brasileiros, o que inclui propostas que podem ser implementadas desde uma pequena prefeitura até um grande órgão federal.
O nome da associação, inclusive, consta no site da Controladoria-Geral da União (CGU), em um página caracterizada como “iniciativas do governo aberto”. O lugar é um espaço em que a CGU disponibiliza uma relação de organizações da sociedade civil que realizam algum tipo de incidência em políticas públicas, como acompanhamento de ações governamentais, pesquisas e outras ações. A presença da empresa no site tem apenas caráter informativo.
A BrazilLAB diz que o seu time de mentores é formado por pessoas que atuam no poder público, no setor privado e em instituições de ensino. São profissionais com diferentes experiências e que, unidos, “formam o pilar essencial para levar os empreendedores selecionados a alcançarem seus objetivos”.
Um deles é, justamente, Erez Yerushalmi. Descrito como “líder e influenciador na área de impacto”, o israelense atuaria “apoiando startups a escalarem rapidamente seus negócios através da adoção do pensamento do capitalismo consciente e formando grandes lideranças”.
O Metrópoles entrou em contato com a BrazilLAB para esclarecer a ligação do militar israelense com a associação. No entanto, não houve resposta até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestações.
Vida militar
Tenente-coronel do Exército de Israel, Yerushalmi aparece em registros oficiais das FDI como chefe do 8105º Batalhão da 646ª Brigada de Paraquedistas da Reserva. Esse é o mesmo agrupamento que, nos últimos meses, se envolveu em disputas intensas e na destruição da cidade de Beit Hanoun.
Localizada no norte da Faixa de Gaza, a região foi uma das primeiras a serem invadidas por tropas israelenses em outubro de 2023, quando a guerra entre Israel e Hamas voltou à tona. Assim como outras áreas na Faixa de Gaza, os cerca de 65 mil moradores da cidade foram forçados a abandonar suas casas após a intensificação da violência.
Em dados recentes divulgados pela Organização das Nações Unidas (ONU), Beit Hanoun aparece como a sexta cidade com mais construções danificadas na Faixa de Gaza. No início deste mês, a ofensiva militar israelense na região aumentou significativamente, após cinco soldados das FDI morrerem em uma emboscada do Hamas.
Veja o antes e depois:

Os últimos registros nas redes sociais de Yerushalmi no campo de batalha são datados de abril de 2024, o que deixa incertezas sobre sua participação direta nas recentes operações em Beit Hanoun.
O comandante do 8105º Batalhão da 646ª Brigada de Paraquedistas da Reserva das FDI — a mesma patente e posto de Yerushalmi —, no entanto, é citado em uma entrevista ao jornal israelense Maariv divulgada no dia 11 de julho. Na conversa, o militar, identificado apenas como “tenente-coronel ‘Y’”, comenta sobre as ações em Beit Hanoun.
“Os bairros de Beit Hanoun estão sendo sistematicamente eliminados usando equipamentos de engenharia e mecânicos, bem como cargas explosivas”, declarou o atual comandante do batalhão que opera na área. “Todos os dias, continuamos a destruir a área até que não reste nada aqui”.
Centro de Beit Hanoun antes e depois:
A principal justificativa do exército israelense para as operações é eliminar membros do Hamas que ainda operam na região, assim como destruir supostos túneis que seriam utilizados por terroristas.
Organizações internacionais, no entanto, criticam a destruição em larga escala de cidades em Gaza. A Comissão Internacional Independente de Inquérito da ONU apontou, recentemente, em relatório sobre a guerra, que militares de Israel podem ter cometido crimes de guerra no enclave palestino. Isso porque a devastação de cidades, sem justificativa plausível, e outros casos documentados em Gaza são proibidos pelo Direito Internacional.
Diante disso, a ligação entre o tenente-coronel das FDI e a associação brasileira é alvo da PAL Comission. O projeto, que atua na busca de medidas políticas e jurídicas em prol dos direitos de palestinos, enviou um ofício à BrazilLAB, questionando se as atividades militares de Yerushalmi são compatíveis com as diretrizes da empresa, capacitadora de empreendedores que atuam com o Estado.
A reportagem entrou em contato com Yerushalmi, mas não obteve respostas.
METRÓPOLES – Edição: Montedo.com
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