Brasil equipara estrutura à da embaixada nos EUA e amplia presença estratégica também com almirante e adidos da PF e da Receita; representação busca nova sede em Pequim
Nelson de Sá
Pequim – Às voltas com o mercado imobiliário de Pequim, o Itamaraty procura uma casa maior para a sua embaixada, no momento em que a representação brasileira vai crescer em pessoal. Estão para se instalar na China um representante da Receita Federal, outro da Polícia Federal e, mais significativamente, dois novos das Forças Armadas.
Em cenário que hoje só existe na embaixada brasileira nos Estados Unidos, o Brasil passará a ter adidos na China com patente de general ou equivalente. Pelo Exército, chega em dezembro o general Rovian Alexandre Janjar. De início, eles terão seus escritórios na atual adidância militar da embaixada, cujas salas estão sendo reformadas.
Janjar será também o adido da Defesa, representando o Ministério. O adido naval será um contra-almirante, também a partir de dezembro. O atual adido aeronáutico, que é coronel da Força, permanece, assim como os atuais do Exército e da Marinha, que passam a adjuntos. No total, serão cinco militares.
Nos EUA, são três oficiais-generais como adidos, um para cada Força, mais seis outros como adjuntos, com patente de coronel ou equivalente. Também é cargo privativo de oficial-general do Exército Brasileiro o posto de subcomandante do Exército Sul dos EUA.
O decreto com as mudanças foi assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelos ministros da Defesa e das Relações Exteriores em junho, três semanas após a visita de Estado do líder brasileiro à China.
Questionado pela Folha sobre as novas indicações, o porta-voz Guo Jiakun, do Ministério das Relações Exteriores, declarou que, “sob a orientação estratégica dos dois presidentes, a construção da comunidade sino-brasileira para um futuro compartilhado, visando um mundo mais justo e um planeta mais sustentável, produziu frutos”.
“A cooperação mutuamente benéfica e amigável entre a China e o Brasil beneficiou os dois povos, promoveu o processo de modernização de cada país e se tornou um modelo de cooperação entre os principais países em desenvolvimento”, prosseguiu. “A China está disposta a trabalhar com o Brasil para aprofundar continuamente a cooperação em diversas áreas e agregar novas dimensões estratégicas.”
A designação do general Janjar como adido vem um ano após a viagem a Pequim do comandante do Exército, general Tomás Paiva, que se encontrou com o ministro chinês da Defesa, almirante Dong Jun, e com o comandante da força terrestre do Exército de Libertação Popular (ELP) da China, além de visitar a empresa de armamentos Norinco.
O coronel da reserva Paulo Filho, analista militar que estava na delegação de Tomás Paiva e é pós-graduado pela Universidade Nacional de Defesa em Pequim, diz que a presença de generais na representação brasileira é um “movimento natural, que vem sendo amadurecido já há alguns anos e que reflete a realidade atual do sistema internacional”.
Relação entre Brasil e China completa 50 anos
Ele cita não só a posição da China como maior parceiro comercial do Brasil. “Além disso, suas Forças Armadas alcançaram, especialmente a partir das reformas de 2015, um nível que as coloca em posição destaque, não só nos tradicionais domínios terrestre, marítimo e aéreo, mas no cibernético e no espacial.”
Acrescenta que seu “protagonismo naturalmente cria oportunidades de interação que podem ser mais bem exploradas por meio da decisão de enviar adidos no posto de oficial-general”. E que “as compras de sistemas e materiais de emprego militar chineses acontecerão naturalmente, a preços competitivos”.
Maurício Santoro, professor de Relações Internacionais do Centro de Estudos Políticos-Estratégicos da Marinha do Brasil, diz que, “em termos simbólicos, é como se as Forças Armadas brasileiras, o Ministério da Defesa, estivessem equiparando a China aos EUA, em termos do tipo de diplomacia militar que se vai buscar”.
No entanto, “a cooperação militar do Brasil é feita majoritariamente com os EUA e os países da Europa Ocidental, ou seja, a Otan”, a Organização do Tratado do Atlântico Norte. Cita as parcerias com a França, para submarinos, com a sueca Saab, para os caças Gripen, e com a italiana Iveco, para o blindado Guarani.
“Mas, se a gente olhar esta China dos últimos 20 anos, sem dúvida ela deu um salto tecnológico em termos do desenvolvimento de capacidades militares, em vários aspectos. Está voltando a ser uma grande potência naval. Na aviação militar também.”
Santoro conta que há duas semanas deu uma aula na Escola do Comando do Estado Maior do Exército, para oficiais brasileiros e estrangeiros, inclusive indonésios e nigerianos, e ouviu perguntas insistentes sobre o uso de jatos chineses pelo Paquistão, no recente conflito com a Índia. “O desempenho do Paquistão foi muito melhor. É um marco.”
Ele alerta para o ambiente de pressão crescente contra a política externa brasileira de diversificação das parcerias globais, “uma política que vem desde pelo menos os anos 1970”. A pressão “está presente nas ameaças de Donald Trump ao Brasil por causa do Brics, no discurso da Otan ameaçando o Brasil pelo comércio com a Rússia”. Diz que a indicação de generais “por si só não será motivo para retaliações”, prevendo apenas que “as atividades da embaixada serão acompanhadas com mais atenção” por EUA e alguns países europeus.
Defende ser “interessante ter equipes das Forças Armadas seguindo mais de perto o cenário tenso na [região] Ásia-Pacífico, procurando entender o que isso significa para o Brasil, as eventuais consequências para nós”.
Destaca, por exemplo, o Mar do Sul da China. “O comércio do Brasil com a China, com o Japão, a Coreia do Sul, tudo passa por ali. É um tema importante para o Brasil, que poderia contribuir com muito do que é a nossa tradição diplomática, de respeito ao direito internacional, de busca por soluções pacíficas.”
FOLHA – Edição: Montedo.com
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