DefesaNet – Análise
O Ministério da Justiça e Segurança Pública divulgou o balanço da Operação Shamar, realizada entre 1º de agosto e 4 de setembro em todo o território nacional. O resultado impressiona: 12.000 prisões efetuadas, mais de 81 mil vítimas atendidas, 53 mil medidas protetivas concedidas e a mobilização de 65 mil agentes de segurança pública em todas as unidades da federação.
A operação teve como foco o enfrentamento à violência doméstica e ao feminicídio, crimes que atingem índices alarmantes no Brasil. Além do caráter repressivo — com a apreensão de armas, munições e drogas —, a ação também buscou o viés educativo, promovendo palestras, rodas de conversa e campanhas de conscientização que alcançaram cerca de 13,6 milhões de pessoas.
O contraste com o discurso do amor
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem utilizado constantemente a linguagem do afeto em seus discursos. Durante a campanha e após a vitória eleitoral, afirmou que “não faltará amor neste país” e que “no meu coração só tem espaço para amor, porque o amor vai vencer nesse país, não o ódio”.
Contudo, o retrato produzido pela Operação Shamar revela a distância entre esse discurso de esperança e a realidade concreta: em pouco mais de 30 dias, milhares de mulheres precisaram acionar o Estado para sobreviver à violência dentro de suas próprias casas.
A contradição é clara: a retórica do amor convive, na prática, com um ambiente doméstico de hostilidade, onde a violência de gênero segue sendo uma das expressões mais duras da desigualdade social e cultural no país.
Estrutura e coordenação da operação
A Operação Shamar foi coordenada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), através da Diretoria de Operações Integradas e de Inteligência (Diopi) da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp).
Participaram diretamente:
- Polícias Civis e Militares dos estados;
- Polícias Técnico-Científicas;
- Polícias Penais;
- Corpos de Bombeiros e Guardas Municipais.
Além disso, houve cooperação do Poder Judiciário e do Ministério Público, fundamentais na concessão e monitoramento de medidas protetivas.
Trata-se, portanto, de uma operação com alcance nacional e execução descentralizada, mas sob coordenação estratégica do governo federal.
Entre proteção social e risco de instrumentalização política
Operações integradas dessa magnitude trazem consigo um duplo caráter:
- Virtuoso: ampliam a capacidade do Estado de proteger vítimas vulneráveis, reforçam a cooperação federativa e constroem um legado institucional de combate à violência de gênero.
- Perverso: o mesmo aparato de integração pode ser, em cenários de crise política, redirecionado para fins de repressão social ou perseguição a opositores. A narrativa oficial de “proteger quem mais precisa” pode ser ressignificada em “conter quem mais incomoda”.
O êxito da Shamar demonstra a força de coordenação do Executivo federal, mas também levanta debates sobre os limites institucionais desse tipo de mobilização.
Conclusão
A Operação Shamar é um marco no enfrentamento à violência doméstica no Brasil, revelando tanto a dimensão do problema quanto a capacidade do Estado de agir em escala nacional. Ao mesmo tempo, expõe a contradição entre o discurso de Lula — centrado na ideia de amor, união e superação do ódio — e a realidade cotidiana de violência estrutural.
Mais do que números, a operação coloca em evidência uma questão estratégica: até que ponto operações integradas permanecerão instrumentos de proteção cidadã e não se converterão em ferramentas de controle político?
O post Operação Shamar: Entre o Discurso do Amor e a Realidade da Violência Doméstica apareceu primeiro em DefesaNet.