O fim da modernização das FFAA: a burocracia nas aquisições vai nos transformar em sucateiros

DefesaNet levantou um cenário na área de defesa que está se formando com uma tempestade perfeita tornando um futuro mais incerto que o já conhecido.  

Nelson Düring
Editor-Chefe DefesaNet

A burocracia nas Forças Armadas está afastando os fornecedores estrangeiros e acabando com os brasileiros. 

Tradicionais empresas do setor de defesa do Brasil e do exterior estão reclamando da dificuldade de se negociar com os militares brasileiros em processos de aquisição quase intermináveis, com requisitos técnicos únicos no mundo e sem qualquer sentido, além da falta de previsibilidade orçamentária para pagar as encomendas. (Nota DefesaNet – Audiência Pública da Comissão de Relações Exterior do Senado, em 09SET2025 Link)  

Fontes de DefesaNet na caserna afirmam que a imprevisibilidade orçamentária agrava a situação, mas fazem um mea culpa: os militares não sabem fazer requisitos, obrigam empresas a redesenvolver seus equipamentos e produtos. O custo adicional (não recorrente) pode chegar a bilhões de reais.

Um exemplo clássico é o custo do desenvolvimento do Gripen E/F, financiado pelo contribuinte brasileiro. Conforme a recente apresentação da FAB na CRE, 12 aditivos já foram feitos no contrato principal. Mais de uma década após a assinatura do contrato, a FAB recebeu 9 dos 36 aviões, e agora junto com o Ministério da Defesa tenta comprar caças Gripen C/D usados da Suécia, o mesmo avião que no F-X1 não cumpria diversos requisitos básicos, entre eles uma séria crítica pela baixa autonomia operacional, o que fez com que a SAAB oferecesse uma versão mais capaz no F-X2. Então chamado Gripen NG e rebatizado de Gripen E/F teve todo seu desenvolvimento custeado pelo Brasil.

Lâmina da apresentação do chefe do Estado-Maior da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do Ar Walcyr Josué de Castilho Araújo, na Audiência Pública da CRE 09SET2025, 

Fontes da própria FAB afirmam que aquisição de aviões C/D vai despadronizar o Gripen, mantendo duas linhas operacionais e logísticas diferentes, já que são dois aviões que só tem em comum o mesmo nome, além de 40 anos de diferença.

O custo do desenvolvimento do Gripen E/F e da manutenção de uma linha de caças usados C/D (modernizados das versões A/B) no médio – longo prazos vai inviabilizar a atividade de voo da FAB e colocar a Força no radar dos órgãos de controle externo devido a possíveis prejuízos ao erário público. Vide as equivocadas ações, a aquisição dos P-3 Orion e a modernização dos AMX.

Mas o problema se estende às demais forças, onde engenheiros militares sem experiência operacional (sem falar de combate) e as alas operacionais trocam críticas e responsabilidades pelos erros nas especificações.

Um militar disse que a urgência operacional e a impossibilidade de se adquirir na Base Industrial de Defesa diversos equipamentos especiais como helicópteros e blindados fez com que as Forças buscassem soluções de prateleira no mercado internacional, equipamentos testados e consagrados em uso operacional por forças armadas poderosas e tradicionais. Mas mesmo assim, são incluídos requisitos que impõem novos desenvolvimentos, acrescentam tempo de engenharia e acabam dificultando os já engessados processos. 

Soma-se a isso, as mudanças acabam despradonizando projetos de sucesso, concebidos com requisitos baseados na experiência operacional de combate dos seus financiadores,  para serem mais letais e seguros no atual e futuro teatro de operações.

A situação já começa a ficar insustentável. Empresas brasileiras e estrangeiras avaliam deixar o mercado brasileiro. “Não temos segurança jurídica, garantiria de fornecimento e nem previsibilidade. Os cronogramas não são cumpridos pelas forças e sempre aparece um novo problema”.

Um brigadeiro da reserva afirmou que falta experiência e mentalidade de guerra. Não sabemos o que queremos e para que necessitamos. Criamos requisitos que só existem na cabeça de alguém, mas que não fazem diferença alguma no campo de batalha, apenas criam novos pesadelos logísticos.

O denuncismo de generais e coronéis da reserva com interesses empresariais, e o medo do CPF e do TCU tem sabotado as aquisições militares. Por esse motivo as FFAA agora estão visando aquisições Gov-to-Gov.

Uma tradicional empresa estrangeira fornecedora das FFAA brasileiras já disse que avalia deixar o Brasil. “Não conseguimos fechar negócios, já enfrentamos o custo Brasil para manter nossas operações, mas falta vontade e interesse do nosso próprio cliente. Quais as justificativas para manter uma fábrica no Brasil se na Europa e Oriente Médio nossos clientes fazem largas aquisições, pagam no ato e estão satisfeitos com nossos produtos? Está começando a ficar injustificável manter nossas operações no Brasil, criar empregos, transferir tecnologia e criar uma capacidade industrial local e de exportação.”

A atual burocracia nos processos de aquisição ao invés de modernizar vai afastar o Brasil dos fornecedores e parceiros. Voltaremos a ser os Reis da Sucata, comprando blindados, aeronaves e navios velhos e refugos de países do primeiro mundo.

E a culpa é dos próprios militares, não do governo nem da sociedade.


Vídeo notícia da Audiência Pública da Comissão de Relações Exteriores (CRE) do Senado mo dia 09SET2025. Recomenda-se assistir ao vídeo completo da Audiência.

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