Brasil: espectador ou protagonista da nova era nuclear?

Acontece nesta semana, em Viena, a 69.ª Conferência Geral da Agência Internacional de Energia Atómica (IAEA) com um movimento surpreendente. Foto Sessão abertura da Conferência com Rafael Grossi Diretor-Geral IAEA

Leonam Guimarães
Pesquisador na Área Nuclear

A energia nuclear voltou ao centro do debate mundial. Depois de décadas de preconceito e estagnação, ela ressurge como candidata forte a integrar a cesta de soluções para enfrentar a crise climática e garantir energia firme. O que antes era visto como herança incômoda da Guerra Fria hoje se revela como peça-chave para um futuro que precisa ser ao mesmo tempo limpo, confiável e estratégico.

Não é exagero dizer: sem nuclear, a transição energética corre o risco de ficar manca. Solar e eólica são fundamentais, mas dependem do vento e do sol. Quem garante estabilidade 24 horas por dia, 7 dias por semana, sem emitir carbono, é o átomo. E é exatamente essa confiabilidade que o mundo redescobriu em meio às metas de descarbonização e às tensões geopolíticas sobre o fornecimento de energia.

O renascimento da nuclear tem dois rostos. De um lado, potências como China, Índia e Rússia continuam erguer usinas de grande porte, entregando gigawatts de energia firme. De outro, Estados Unidos, Canadá, França e Japão apostam em pequenos reatores modulares (SMRs), uma revolução em curso que promete flexibilidade, rapidez de implantação e usos inovadores. Esses reatores podem abastecer cidades isoladas, polos industriais, mineradoras, bases militares e, no futuro, até navios mercantes.

E o leque de aplicações vai muito além da eletricidade. Hidrogênio limpo para indústrias pesadas, dessalinização de água do mar, aquecimento urbano e propulsão naval são apenas alguns exemplos. Quem ainda insiste em dizer que nuclear é coisa do passado simplesmente não percebeu o futuro batendo à porta.

A questão da segurança, sempre usada como argumento contra, também mudou de patamar. Reatores de nova geração são projetados com sistemas passivos, capazes de agir sozinhos em situações de emergência. E o dilema dos resíduos radioativos começa a ser resolvido: a Finlândia já inaugurou o primeiro repositório geológico profundo do mundo. O que antes parecia impossível agora é fato.

Mas a energia nuclear não é apenas uma questão de tecnologia: é também de poder. A Rússia lidera a exportação de usinas, a China avança para se tornar potência nuclear civil, enquanto EUA e Europa tentam recuperar espaço. O jogo é claro: quem domina a nuclear não só garante sua segurança energética, mas também amplia sua influência geopolítica.

E o Brasil? Aqui temos um diferencial que poucos países podem ostentar: dominamos o ciclo do combustível, temos duas usinas em operação, uma terceira em construção, um programa de submarino nuclear e condições de avançar em pequenos reatores. Ou seja: temos a chance de transformar a nuclear em motor de soberania, desenvolvimento e inovação.

Ignorar essa oportunidade seria um erro histórico. O futuro da energia não será definido apenas pelo vento e pelo sol — será decidido também pelo átomo. A pergunta que fica é: o Brasil vai assistir de camarote ou vai assumir o protagonismo que já tem condições de exercer?

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