O Ministério Público Federal (MPF) identificou graves falhas na assistência oferecida a pessoas em situação de rua em Belém (PA) durante inspeção realizada nesta quinta-feira (27). A ação, conduzida pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), evidenciou o descaso do poder público em dois centros de acolhimento, contrariando diretrizes da Política Nacional para a População em Situação de Rua e uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
As visitas ocorreram na Casa Nazareno Tourinho, conhecida como Casa Rua, e no Centro Pop do bairro de São Brás. Em ambos os locais, a equipe do MPF encontrou estruturas deterioradas, falta de segurança, ausência de profissionais de saúde, carência de insumos básicos e relatos de violação de direitos.
Na Casa Rua, vinculada à Secretaria Municipal de Saúde (Sesma), a situação é alarmante. Definida oficialmente como uma “unidade de saúde multiprofissional”, a instituição não oferece qualquer tipo de atendimento médico. Com apenas dois funcionários, o espaço funciona como um albergue improvisado: oferece banho, abrigo e alimentação, mas sofre com infiltrações, alagamentos e escuridão. Segundo a equipe, não há medicamentos, ventilação ou camas. Parte dos usuários dorme no chão ou sobre papelões.
“Eu vivi 11 anos na rua. Hoje, do outro lado, tento fazer por eles o que eu gostaria que tivessem feito por mim. Mas a Casa Rua está totalmente precária, e a população está gritando por socorro”, alertou a assistente de Bem-estar Social, Thayla Silva.
Já no Centro Pop São Brás, gerido pela Fundação Papa João XXIII (Funpapa), a inspeção encontrou instalações degradadas, banheiros sem portas, falta de ventiladores, colchonetes e infraestrutura mínima. Usuários também relataram a ausência de cadastradores sociais, o que dificulta o acesso a benefícios públicos via CadÚnico. Cursos profissionalizantes – como eletricista, padeiro e cabeleireiro – também são inexistentes, o que, segundo os atendidos, impede a reinserção no mercado de trabalho.
As irregularidades apontam para o descumprimento da ADPF 976, ação do STF que, desde 2023, obriga União, estados e municípios a implementarem medidas protetivas e respeitosas às pessoas em situação de rua. A norma proíbe práticas como remoções forçadas, apreensão de pertences e ações que violem a dignidade dessa população.
“Não é a primeira vez que realizamos inspeções. O que surpreende é que, apesar das visitas anteriores, nada tenha melhorado”, criticou o procurador da República Sadi Machado. Ele também destacou a preocupação com possíveis ações de remoção em função da COP 30, que será sediada em Belém em novembro.
Para o MPF, há risco de que, em vez de garantir os direitos das pessoas em situação de rua, o poder público opte por escondê-las durante o evento internacional. “Nosso objetivo é garantir que essa população seja vista e respeitada. Não aceitaremos políticas de invisibilização”, afirmou Machado.
A inspeção contou com a presença do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), representado pelo promotor Firmino Matos, e das Defensorias Públicas do Estado e da União, representadas por Júlia Rezende e Marcos Teixeira, respectivamente. O MPF prometeu reforçar a fiscalização para que os centros de acolhimento sejam aprimorados e ofereçam serviços condizentes com a dignidade humana.
Fonte: Ministério Público Federal (MPF)
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