Um novo capítulo na investigação dos atos de 8 de janeiro de 2023 no Distrito Federal revelou um embate inusitado e tenso dentro da própria Polícia Militar. Dois coronéis da ativa, ambos réus por suposta omissão nos atos de vandalismo ocorridos naquela data, estão trocando acusações diretas no Supremo Tribunal Federal (STF). O confronto público entre o coronel Jorge Eduardo Naime, ex-comandante do Departamento de Operações da PMDF, e o também coronel Paulo José da Silva, que ocupava função de coordenação operacional, tem causado perplexidade nos bastidores da Justiça Militar e civil.
A crise entre os dois oficiais veio à tona após petições protocoladas pelas respectivas defesas no processo que tramita no STF. Naime acusa Paulo José de tentar “enganar o Supremo” com versões inverídicas dos acontecimentos do fatídico dia. Para Naime, o colega tenta livrar-se das próprias responsabilidades jogando a culpa exclusivamente sobre ele, ainda que os registros e documentos internos apontem, segundo sua defesa, para uma gestão compartilhada das ações (ou da falta delas) no controle da manifestação que resultou na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes.
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“É inadmissível que se use da boa-fé da Suprema Corte para tentar manipular os fatos”, diz trecho do documento entregue ao STF pela defesa de Naime. O coronel afirma ainda que Paulo José “omite informações cruciais” e tenta reescrever a narrativa dos fatos de maneira “ardilosa”, responsabilizando-o por decisões que, segundo ele, foram determinadas em conjunto ou por superiores hierárquicos da segurança pública do DF.
Paulo José, por sua vez, rechaça as acusações e sustenta que Naime era o responsável direto pelas ordens operacionais no 8 de janeiro. A defesa do coronel argumenta que Paulo atuava em funções de suporte e que “jamais teve autoridade plena para interferir na estratégia de ação ou contenção” durante os atos de vandalismo. Segundo ele, Naime, como chefe das operações, falhou em convocar reforços, mobilizar barreiras ou agir de forma preventiva diante dos sinais de que os protestos ganhariam proporções perigosas.
O entrevero entre os dois militares chama atenção por expor uma disputa interna que pode afetar diretamente o curso do processo no STF. Ambos são acusados de omissão, prevaricação e falha grave no dever funcional, e enfrentam ações penais que podem culminar em penas severas, incluindo a perda do posto e da patente, além de condenações em regime fechado, caso haja sentença condenatória.
Fontes próximas ao processo revelam que o ministro Alexandre de Moraes, relator da ação, tem observado com atenção a escalada de tensões entre os réus. Interlocutores do STF avaliam que o confronto pode indicar um esforço de delação cruzada informal, no qual cada parte tenta colaborar espontaneamente, entregando informações comprometedoras sobre o outro para aliviar sua própria responsabilidade.
O clima dentro da PMDF também é de tensão. Apesar de a corporação oficialmente não comentar processos em andamento, a cúpula da segurança pública está preocupada com os reflexos institucionais do embate. O comando da PM avalia que o episódio prejudica a imagem da corporação, já bastante desgastada desde os acontecimentos de janeiro de 2023, e teme que novos nomes possam surgir à medida que as acusações se intensificam.
Especialistas em direito penal e militar analisam o episódio como um reflexo típico de estratégias defensivas de réus em processos de alta repercussão. Segundo o jurista e ex-magistrado militar Rodrigo Silva, “quando há múltiplos acusados, é comum que surjam disputas de versões, ainda mais quando há risco real de prisão e perda de carreira. O problema é quando isso ultrapassa o campo técnico e vira confronto pessoal”.
Até o momento, o STF não se pronunciou sobre o conteúdo específico das acusações entre os coronéis, mas fontes do tribunal indicam que novos depoimentos poderão ser agendados para esclarecer as divergências.
A expectativa é que o julgamento dos PMs envolvidos nos atos de 8 de janeiro avance ainda neste primeiro semestre de 2025. A Procuradoria-Geral da República já solicitou a manutenção da prisão preventiva de alguns réus e indicou que deve apresentar alegações finais até junho.
Enquanto isso, o processo que deveria unir os acusados em uma linha de defesa comum tem provocado divisões que podem comprometer ainda mais a situação dos envolvidos. O cenário agora é de incerteza, com possíveis novas revelações à medida que o cerco judicial se fecha e os próprios réus passam a disputar não só a liberdade, mas também a própria reputação.
A novela do 8 de janeiro ganha, assim, mais um capítulo — e, desta vez, protagonizado por quem deveria ter mantido a ordem.
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