Entenda o que muda com o novo licenciamento ambiental

A Câmara aprovou na madrugada desta 5ª feira (17.jul.2025) o PL (Projeto de Lei) 2.159/2021  que estabelece o 1º marco legal para o licenciamento ambiental no Brasil. A votação foi de 267 votos a favor e 116 contra. O Brasil não tinha uma lei geral que regulamenta o tema. O projeto segue para a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

Defendido por setores do agro e da indústria, o texto é apresentado como uma forma de trazer agilidade e padronização ao processo. Por outro lado, ambientalistas dizem que as mudanças podem fragilizar os controles regulatórios e reduzir a transparência.

O QUE É LICENCIAMENTO AMBIENTAL?

É um processo administrativo pelo qual o poder público autoriza a instalação, ampliação e operação de atividades e empreendimentos que utilizam recursos ambientais ou que são capazes de causar degradação ambiental. 

Ele serve para avaliar os impactos de um projeto, definir medidas de controle e mitigação, e garantir a sustentabilidade das atividades.

POR QUE UMA NOVA LEI?

O consenso é que o licenciamento ambiental precisa ser reformulado. A legislação atual é fragmentada, baseada em normas federais, estaduais e resoluções infralegais. 

Relatórios do Ibama e da CGU (Controladoria Geral da União) apontam sobrecarga, falta de funcionários públicos e desintegração entre os entes federativos. A Abema (Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente) já alertava para o “colapso” do sistema desde 2013.

Setores do agronegócio, energia, mineração e infraestrutura defendem o PL como solução para dar previsibilidade, destravar obras e reduzir a burocracia. Ao todo, 98 entidades do setor produtivo assinaram uma carta elogiando o texto.  Leia a íntegra (PDF – 153 kB).

Por outro lado, 350 organizações criticam o projeto e pedem outro modelo de reforma. Reconhecem que o sistema atual precisa de melhorias, mas dizem: “Não dessa forma”. Eis a íntegra (PDF – 194 kB) da manifestação. 

COMO É HOJE O LICENCIAMENTO AMBIENTAL NO BRASIL?

O licenciamento ambiental é considerado a principal ferramenta da Política Nacional do Meio Ambiente, instituída pela Lei nº 6.938/1981 e mencionada no artigo 225 da Constituição Federal

No entanto, o Brasil ainda não possui uma lei federal específica que regulamente esse instrumento. 

O processo é regido pela Resolução Conama nº 237/1997, por normas estaduais e municipais, e por regulamentações internas de órgãos como o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

Na prática, o licenciamento ambiental é obrigatório para empreendimentos ou atividades consideradas potencialmente poluidoras ou que possam causar degradação ambiental.

O modelo padrão é o LAT (Licenciamento Ambiental Trifásico), previsto na Resolução Conama nº 237/1997, e composto por 3 etapas:

  • LP (Licença Prévia): concedida na fase de planejamento, atesta a viabilidade ambiental e estabelece as diretrizes para as próximas fases;
  • LI (Licença de Instalação): autoriza o início da obra ou da instalação do empreendimento;
  • LO (Licença de Operação): permite o funcionamento depois de verificada a adequação às exigências das etapas anteriores.

EIA/RIMA (Estudos de impacto ambiental) e audiências públicas são exigidos conforme o grau de impacto do empreendimento. 

Também são previstas, em alguns casos, consultas prévias a povos indígenas e comunidades tradicionais, conforme a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

O QUE MUDA COM O PL 2.159/2021

O projeto institui uma Lei Geral do Licenciamento Ambiental. 

A proposta define 7 tipos de licenças, com prazos específicos para emissão:

  • LP (Licença Prévia): 6 ou 10 meses (dependendo do estudo requerido);
  • LI (Licença de Instalação): 3 meses;
  • LO (Licença de Operação): 3 meses;
  • LAU (Licença Ambiental Única): 3 meses;
  • LAC (Licença por Adesão e Compromisso);
  • LOC (Licença de Operação Corretiva): 3 meses;
  • Licença Ambiental Especial.

Alguns empreendimentos podem exigir mais de um tipo de licença. 

O texto também facilita a renovação. Elas poderão ser sucessivas e, se não houver alteração no empreendimento, a renovação poderá ser automática, mediante declaração do empreendedor via formulário on-line. 

O projeto aprovado ainda estabelece a renovação provisória, que autoriza a continuidade da atividade enquanto a renovação definitiva estiver em análise.

Das novas modalidades de licença, as com menos exigências técnicas são: 

  • LAC (Licenciamento por adesão e compromisso): o empreendedor preenche um formulário e se compromete a seguir as regras impostas previamente;
  • Licença única ou monofásica: substitui as 3 etapas tradicionais (LP, LI e LO) por uma só;
  • LAE (Licença Ambiental Especial): incluída por emenda no Senado (conhecida como “Emenda Alcolumbre”), cria um modelo simplificado para empreendimentos definidos como “estratégicos” ou “prioritários”, ainda que “utilizador de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente”.

QUAIS ATIVIDADES FICAM ISENTAS DE LICENCIAMENTO?

O texto isenta de licenciamento ambiental uma série de atividades e empreendimentos, como:

  • cultivo de espécies agrícolas (temporárias, semiperenes e perenes);
  • pecuária extensiva e semi-intensiva;
  • pecuária intensiva de pequeno porte;
  • pesquisa de natureza agropecuária sem risco biológico;
  • empreendimentos militares;
  • empreendimentos de porte insignificante;
  • intervenções emergenciais (resposta a colapso de infraestrutura, acidentes, desastres, ou para prevenir danos iminentes);
  • obras de serviço público de distribuição de energia elétrica até 69 quilovolts (em área urbana ou rural);
  • usinas de triagem e reciclagem de resíduos sólidos e da construção civil;
  • pátios e estruturas para compostagem de resíduos orgânicos.

Já para o saneamento básico, o texto estipula procedimentos simplificados e prioridade na análise para a emissão de licenciamento ambiental, com o objetivo de agilizar obras nesse setor.

A pecuária intensiva de médio porte poderá ser licenciada de forma simplificada, por meio da LAC, sem análise técnica prévia.

CONSULTA PRÉVIA E AUDIÊNCIA PÚBLICA

O PL 2.159/2021 mantém a exigência de estudos de impacto ambiental (EIA/RIMA) apenas para empreendimentos considerados “potencialmente causadores de significativa degradação do meio ambiente”.

No entanto, o projeto não define o que caracteriza essa degradação. A decisão fica a cargo do órgão licenciador, com base em normas complementares. 

A realização de audiência pública é limitada à fase posterior à elaboração do EIA –ou seja, a comunidade não participa das etapas iniciais do processo.

QUAIS SÃO AS CRÍTICAS AO NOVO LICENCIAMENTO AMBIENTAL?

As organizações da sociedade civil se mobilizaram contra o PL 2159/2021. Em notas técnicas e manifestações públicas, entidades disseram que a proposta reduz a participação social e enfraquece o papel do Estado na fiscalização.

A principal crítica recai sobre a LAC, também chamada de autolicenciamento. Segundo o Observatório do Clima, esse tipo de regra poderia ter permitido a aprovação, sem fiscalização, de empreendimentos como a barragem de Brumadinho.

A relatora do PL, a senadora Tereza Cristina (PP-MS), ligada ao agro, defendeu a modalidade: “Não há autolicenciamento. (…) Não é assim que funciona. Quem determina é a autoridade licenciadora em atividades já conhecidas”, disse.

A ONU (Organizações das Nações Unidas) expressouprofunda preocupação” com essa modalidade, argumentando que ela pode agravar a crise climática e de biodiversidade.

Embora 2/3 da base do governo no Senado tenham votado a favor do projeto, o MMA (Ministério do Meio Ambiente) também se manifestou contra o projeto. A ministra Marina Silva defende modificações no texto e, se necessário, vetos presidenciais. 

O QUE DIZEM OS DEFENSORES?

O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD), defendeu afrouxar o licenciamento. Afirmou que o projeto “vai provocar o desenvolvimento do país”. 

O Instituto Pensar Energia afirmou que as regras trazem necessária previsibilidade ao licenciamento, reduzindo gargalos que atrasam obras críticas, como hidrelétricas e linhas de transmissão. O Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração) também celebrou.