Relatório dos EUA de março já antecipava investigação ao Brasil

Um relatório do USTR (Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos) publicado em março de 2025 antecipava possíveis investigações contra o Brasil. O Poder360 já mostrou que o país norte-americano declarava que há um excesso de protecionismo com a imposição de barreiras às importações dos EUA para o Brasil.  

O relatório de março do USTR cita, em parte, temas da última carta, de junho, que anunciava as investigações contra o Brasil. O órgão do governo dos EUA é responsável por formular e negociar a política comercial do país. Atua diretamente com acordos bilaterais e multilaterais, além de representar os norte-americanos em disputas comerciais. Também lidera negociações tarifárias e define medidas contra práticas desleais de comércio.

O 1º documento (pouco mais de 5 páginas) antecipava as críticas, por exemplo, ao contrabando na rua 25 de Março e às barreiras tarifárias impostas contra o etanol dos Estados Unidos. 

A 2ª carta é mais completa, com um pouco mais de 14 páginas, e anuncia a abertura formal de uma investigação sobre as políticas e práticas comerciais do Brasil. O documento de março é um relatório anual que lista barreiras comerciais de diversos países.

Leia as duas cartas (em inglês):

  • março, das páginas 29 a 34 (PDF – 3 MB); 
  • julho (PDF – 189 kB). 

Os documentos são vistos como parte da pressão norte-americana durante o aumento de tensões comerciais, especialmente após o anúncio de tarifas de 50% por parte do governo Donald Trump (Partido Republicano) sobre produtos brasileiros. Os documentos tratam de assuntos como o sistema de pagamentos Pix, o etanol, a tributação de serviços digitais, contrabando na rua 25 de Março, benefícios fiscais e políticas industriais do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

O 1º documento tem uma visão panorâmica dos problemas comerciais e sugere diálogo com o Brasil, mas sem entrar em muitos detalhes técnicos. Já a 2ª carta detalha com precisão os setores mais sensíveis, cita leis específicas, regulamentos e programas brasileiros considerados “distorcivos” pelos EUA.

Em março, o governo dos EUA já citava as tarifas do Brasil sobre o etanol dos EUA como uma barreira tarifária. O relatório descreve a imposição de uma TRQ (cota tarifária) e depois da TEC (Tarifa Externa Comum) do Mercosul. 

Ambos os documentos expressam preocupação com a proteção e aplicação “inadequadas e ineficazes” dos direitos de propriedade intelectual. Também citam que o Brasil está na “Watch List” (Lista de Vigilância) do Relatório Especial 301 de 2024. O documento de março menciona desafios como a falta de penalidades dissuasórias e altos níveis de falsificação e pirataria on-line e em mercados físicos (citando a Rua 25 de Março). 

O 1º documento também demonstra preocupações com a transferência de dados pessoais para fora do Brasil. O documento de março fala sobre as “disposições relativas às restrições à transferência de dados pessoais para fora do Brasil” pela LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais) e a “incerteza para as empresas e obstáculos ao processamento e compartilhamento rotineiro de dados”. 

O documento de julho tem mais detalhes sobre a “censura” e afirma que o Brasil “impõe restrições excessivamente amplas à transferência de dados pessoais para fora do Brasil”, inclusive para os Estados Unidos.

NOVIDADES DA 2ª CARTA

Dentre as novidades da 2ª carta está o tom mais duro sobre o comércio digital e serviços de pagamento eletrônico. Cita que há imposição de censura às empresas de tecnologia, e que o STF (Supremo Tribunal Federal) tornou as big techs responsáveis por publicações “ilegais” de seus usuários mesmo sem ordem judicial prévia. 

Menciona que a recusa em cumprir as ordens da Corte resultou em multas substanciais, suspensão de plataformas e ameaças de prisão ou processo criminal para executivos dos EUA. A 2ª carta diz que a medida pode restringir a liberdade de expressão e aumentar o risco econômico para as empresas dos EUA.

Segundo os norte-americanos, as medidas comprometem a previsibilidade para investimentos. Além disso, o governo dos EUA critica o que chamam de um “excesso de multas e sanções regulatórias”, que provoca insegurança jurídica para empresas norte-americanas atuando no Brasil. 

Sobre o Pix, afirmou que o sistema de pagamento do BC (Banco Central) não sofre concorrência, o que impacta companhias estrangeiras de meio de pagamento, como a Visa, Mastercard, PayPal e outras. Esse tema não foi abordado no 1º relatório de março. 

O documento de julho destaca explicitamente que o Brasil concede tarifas preferenciais mais baixas para “certos grandes parceiros comerciais em setores específicos”, enquanto os EUA enfrentam taxas mais altas, de 14% a 35%. 

Embora o 1º documento de março mencione as tarifas do Mercosul, o bloco econômico da América Latina, não foca especificamente em “tarifas preferenciais injustas”.