Para Steven Levitsky, renomado professor de Harvard e um dos mais influentes estudiosos da política contemporânea, o Brasil — sim, o Brasil — está hoje mais afinado com os princípios democráticos do que os Estados Unidos. Em entrevista à BBC News Brasil nesta segunda-feira (21), o autor do best-seller Como as democracias morrem não economizou nas palavras: “As instituições brasileiras estão funcionando melhor do que as americanas.”
A comparação não é gratuita. Levitsky aponta que, ao contrário do que aconteceu nos EUA após a tentativa de golpe de Donald Trump em 2021, o Brasil agiu de forma mais firme e coordenada para conter investidas antidemocráticas, especialmente após os eventos de 2022 que envolveram Jair Bolsonaro.
“O Supremo Tribunal Federal cumpriu um papel crucial na defesa da democracia brasileira. E, ao impedir que Bolsonaro concorresse novamente, o país mostrou que há, sim, consequências para quem ameaça as instituições democráticas”, afirma. Para ele, a resposta brasileira foi mais parecida com a de democracias maduras do que a dos próprios EUA.
O “bullying” de Trump e a ameaça à soberania
Levitsky também criticou duramente a recente decisão do ex-presidente americano Donald Trump de aplicar uma tarifa de 50% sobre exportações brasileiras — além de impor sanções ao ministro Alexandre de Moraes, do STF. Para o professor, trata-se de “bullying internacional” e “intimidação autoritária”.
“Não é uma política de Estado como durante a Guerra Fria. Não tem lógica estratégica. É pura vaidade. Trump age com desinformação, arrogância e ressentimento pessoal. É triste e patético ver isso moldando a política externa dos EUA em pleno 2025”, dispara.
Segundo Levitsky, a atual política americana em relação ao Brasil tem mais a ver com o ego de Trump e sua aliança informal com a família Bolsonaro do que com qualquer estratégia racional: “Trump não entende nada do Brasil, mas se convenceu de que Bolsonaro, assim como ele, é vítima de perseguição judicial.”
A democracia americana em xeque
Se os elogios ao Brasil soam surpreendentes, as críticas ao estado atual da democracia americana são alarmantes. Levitsky afirma que os EUA atravessam um momento de “autoritarismo brando” e que a democracia no país “descarrilou”.
“O custo de se opor ao governo cresceu. Protestar, financiar um opositor ou escrever um editorial pode trazer retaliações. A Justiça, o Legislativo, o Partido Republicano… todos falharam em conter Trump. Nossos famosos freios e contrapesos não funcionaram.”
Para ele, Trump opera fora das regras: ataca o Judiciário, a imprensa e adversários com o apoio de um partido cada vez mais submisso. E agora, no segundo mandato, sem conselheiros que o contenham, ele está mais livre do que nunca para impor sua vontade.
Brasil sob pressão
O professor considera que o Brasil se tornou alvo justamente por não se curvar à vontade americana. “Trump espera obediência cega de países que não são potências nucleares. Quando isso não acontece, esses países viram alvos.”
Levitsky também alerta para o risco de outros líderes globais imitarem Trump caso ele continue obtendo sucesso político: “Se ele se safar, se for visto como vencedor, muitos o seguirão. Por isso, contê-lo é vital para preservar a ordem internacional.”
STF: guardião temporário, não eterno
Apesar dos elogios ao Supremo Tribunal Federal por sua atuação durante a crise democrática, Levitsky faz um alerta: “Nenhum órgão não eleito deve ter poder demais por muito tempo. Passada a tempestade, é fundamental recolocar o STF em seu devido lugar institucional.”
Ele ressalta que, no caso específico do julgamento de Bolsonaro, o STF está dentro de sua função: julgar crimes contra a democracia. “Se houver provas, ele deve ser condenado. Isso é o que uma democracia faz com seus transgressores.”
Democracia em disputa
Ao fim da entrevista, Levitsky sintetiza a diferença entre as respostas de Brasil e EUA às tentativas de golpe: “No Brasil, houve esforço real de responsabilização. Nos EUA, não. Bolsonaro pode acabar preso. Trump, reeleito.”
E conclui com uma observação provocadora, que parece feita para virar manchete: “Hoje, o Brasil é mais democrático que os Estados Unidos. Isso pode mudar, claro. Mas, neste momento, vocês estão fazendo um trabalho melhor.”
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