O que deixou para Belém o maior arquiteto paraense

Francisco de Paula Lemos Bolonha, o brilhante sobrinho do construtor do Palacete e da Vila Bolonha preservou até o fim da vida sua ligação afetiva com Belém, onde nasceu.

Isto ficou claro em estudos acadêmicos realizados sobre suas obras, assim como, em entrevistas concedidas por ele.

Uma das pesquisadoras que mais tempo dedicou à análise da produção arquitetônica de Francisco de Paula foi Márcia Poppe, ligada à Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 

Consciente desta ligação dele com sua cidade natal, Márcia inseriu duas frases do filósofo Merleau-Ponty, como epígrafe, do seu ensaio “Para dentro da concha. Um olhar sobre a produção do arquiteto Francisco Bolonha”.

As frases eram:

“É certo que a vida não explica a obra, porém, é certo, também, que se comunicam. A verdade é que esta obra exigia esta vida”.

Neste ensaio, Márcia, antes de se referir a Belém, registra a impressão de “simplicidade e despojamento” que lhe causou Francisco de Paula, nos contatos que os dois mantiveram.

Ele – diz Márcia – “apesar de nunca ter feito publicidade do que construiu”, teve “sua obra largamente publicada em revistas nacionais e estrangeiras”.

De fato, embora leal à sua origem Francisco, expandira muito o alcance de seu trabalho.

Entre as revistas nacionais que divulgaram os projetos dele, Márcia menciona “Habitat”, “Revista da Diretoria de Engenharia do Distrito Federal”, “Arquitetura Revista”, e, “Arquitetura & Urbanismo”.

E, entre as estrangeiras: “L´Architectured´Aujourd´hui”, “Architectural Forum”, “Architectural Journal”, “BrasilianisheArchitectur”, “The Architectural Review”, “Bauen + WohnenInternationaleZeitschrift”, “Abitare”, e, “Architektur und KultiviertesWohnen”.

Márcia acrescenta:

“Bolonha nasceu em Belém do Pará no dia 3 de junho de 1923 e optou muito cedo pela Arquitetura. Em função disto, seu pai, Benjamin de Paiva Bolonha, o enviou para o Rio de Janeiro para cursar o ginásio, já com o intuito de prepará-lo melhor para o ingresso na Escola Nacional de Belas Artes”.

Mais adiante, a pesquisadora retorna, em seu ensaio, à feição cosmopolita de Francisco.

Diz ela sobre o arquiteto:

“Aficionado por Marcel Proust, além das correspondências do escritor, leu sua obra completa sete vezes na língua original”.

E, completa o perfil de Francisco de Paula, como homem culto, dizendo:

“Tinha em sua biblioteca autores como FyodorDostoyevsky, Lawrence Durrell, Otávio de Faria, Graciliano Ramos, Eça de Queirós e José Lins do Rego; poetas como João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade, além de filósofos como Jean-Paul Sartre, Sören Kierkegaard e Maurice Merleau-Ponty”. 

 Márcia preparou outro ensaio sobre Francisco, destinando-o à DOCOMOMO, uma instituição com sede em Paris e representação em mais de 40 países, dedicada à documentação e preservação das criações do Movimento Moderno na Arquitetura.

Nele, Belém reaparece.

Afirma a pesquisadora referindo-se a Francisco:

“A marca fundamental de sua trajetória talvez tenha sido sua formação. Logo, garoto, acompanhou a arquitetura art nouveau de seu tio, o engenheiro homônimo Francisco Bolonha, que encantava Belém no rico ciclo da borracha. Diante de edifícios como o Palacete Bolonha e o Mercado da Carne não é de se estranhar que despertasse no menino Bolonha o desejo de desenhar casas”.

Em 2005, menos de um ano antes de sua morte, Francisco de Paula concedeu uma entrevista a Flávio Castellotti que só foi publicada em 2007 na “ProjetoDesign”.

Para Flávio, Francisco de Paula disse de um modo direto e claro:

“Eu sou de Belém do Pará (…) Sempre me bati para que a pessoa, quando estudasse, ficasse no local de nascimento. Acho que você deve desenvolver o seu estado. Mas escola de Arquitetura não existia em Belém. Nem de Engenharia. Foi meu tio quem a criou”.

No mesmo período, Francisco de Paula também se referiu a seu tio numa entrevista concedida a um pesquisador paraense, Célio Lobato, para o livro “Palacete Bolonha, uma promessa de amor”.

A Célio, Francisco de Paula disse que conviveu com ele no Palacete Bolonha, do qual ainda guardava, no Rio de Janeiro, diversas peças de porcelana.

Se Francisco de Paula se manteve fiel à sua cidade, em contrapartida, Belém, mantém lembranças dele.

A mais visível é o monumento a Lauro Sodré, que ele projetou.

Do monumento fazem parte esculturas de Bruno Giorgi, o mesmo escultor companheiro de Oscar Niemeyer nas construções de Brasília, naquele período.

Em 1959, o monumento foi levantado em Belém por solicitação do então governador Magalhães Barata, ao engenheiro Nicholas Chase.

A outra lembrança deixada para nossa cidade por Francisco de Paula também envolveu o engenheiro Nicholas Chase.

Os dois foram responsáveis pelo projeto, e por sua execução, de construção do Hospital Guadalupe, na Rua Arcipreste Manoel Teodoro. 

Em Belém, as lembranças pessoais de Francisco de Paula foram mantidas por seus familiares.

Seu sobrinho, Alex Bolonha Fiúza de Mello, se manteve reitor da UFPA durante oito anos.

Ele se recordou:

“O arquiteto, a partir de uma idade avançada, tornou-se uma pessoa recolhida, solitária, reclusa em seu apartamento na Avenida Niemeyer, na Praia de São Conrado, no Rio de Janeiro”.

Àquela altura, lembrou Alex:

“Francisco de Paula vivia imerso em sua coleção de obras de pintores famosos. Ele as guardava, com carinho, na sala de visita e em quartos de seu apartamento”.

*Oswaldo Coimbra é escritor e jornalista  

Translation (tradução)

What the Greatest Architect from Pará Left to Belém

Francisco de Paula Lemos Bolonha, the brilliant nephew of the builder of the Palacete and Vila Bolonha, preserved his emotional connection with Belém—his birthplace—until the end of his life.
This was made clear in academic studies of his works, as well as in interviews he gave.

One of the researchers who dedicated the most time to analyzing Francisco de Paula’s architectural output was Márcia Poppe, affiliated with the School of Architecture at the Federal University of Rio de Janeiro.

Aware of his deep bond with his hometown, Márcia chose two quotes from the philosopher Merleau-Ponty as the epigraph to her essay “Into the Shell: A Look at the Work of Architect Francisco Bolonha.”
The quotes read:
“It is true that life does not explain the work, but it is also true that they are connected. The truth is that this work required this life.”

In this essay, before referring to Belém, Márcia recalls the impression of “simplicity and unpretentiousness” Francisco de Paula left on her during their meetings.
He – Márcia writes – “despite never publicizing what he built,” had “his work widely published in both national and international magazines.”
Indeed, although loyal to his origins, Francisco expanded the reach of his work considerably.

Among the national magazines that featured his designs, Márcia lists Habitat, Revista da Diretoria de Engenharia do Distrito Federal, Arquitetura Revista, and Arquitetura & Urbanismo.
And among the international ones: L’Architecture d’Aujourd’hui, Architectural Forum, Architectural Journal, Brasilianishe Architectur, The Architectural Review, Bauen + Wohnen Internationale Zeitschrift, Abitare, and Architektur und Kultiviertes Wohnen.

Márcia adds:
“Bolonha was born in Belém do Pará on June 3, 1923, and chose Architecture very early in life. Because of that, his father, Benjamin de Paiva Bolonha, sent him to Rio de Janeiro for secondary school, already with the intention of better preparing him for admission to the National School of Fine Arts.”

Later in the essay, the researcher returns to Francisco’s cosmopolitan nature.
She writes about the architect:
“A devotee of Marcel Proust, he not only read the author’s letters but also read his complete works seven times in the original language.”
And she completes the profile of Francisco de Paula as a cultured man by saying:
“He kept in his library authors such as Fyodor Dostoyevsky, Lawrence Durrell, Otávio de Faria, Graciliano Ramos, Eça de Queirós, and José Lins do Rego; poets like João Cabral de Melo Neto and Carlos Drummond de Andrade; as well as philosophers such as Jean-Paul Sartre, Søren Kierkegaard, and Maurice Merleau-Ponty.”

Márcia wrote another essay about Francisco, this one for DOCOMOMO, an organization headquartered in Paris with branches in over 40 countries, dedicated to documenting and preserving Modernist Architecture.

In this essay, Belém reappears.
The researcher states, referring to Francisco:
“The fundamental hallmark of his path was perhaps his early education. As a boy, he followed the art nouveau architecture of his uncle, the engineer of the same name, Francisco Bolonha, who dazzled Belém during the rubber boom. Facing buildings like the Bolonha Palace and the Meat Market, it’s no wonder that the young Bolonha was inspired to design houses.”

In 2005, less than a year before his death, Francisco de Paula gave an interview to Flávio Castellotti, which was only published in 2007 in ProjetoDesign.
To Flávio, Francisco de Paula stated directly and clearly:
“I am from Belém do Pará (…) I always believed that people, when they studied, should remain in their place of birth. I think you should develop your own state. But there was no School of Architecture in Belém. Not even Engineering. It was my uncle who created one.”

Around the same time, Francisco de Paula also spoke about his uncle in an interview with a researcher from Pará, Célio Lobato, for the book “Palacete Bolonha: A Promise of Love.”
To Célio, Francisco de Paula revealed that he had lived with his uncle in the Palacete Bolonha, from which he still kept various porcelain pieces in his home in Rio de Janeiro.

While Francisco de Paula remained faithful to his city, Belém, in return, keeps memories of him.
The most visible one is the monument to Lauro Sodré, which he designed.
The monument includes sculptures by Bruno Giorgi, the same sculptor who worked alongside Oscar Niemeyer on the construction of Brasília.
In 1959, the monument was erected in Belém at the request of then-governor Magalhães Barata, through engineer Nicholas Chase.

Another reminder left to our city by Francisco de Paula also involved engineer Nicholas Chase.
The two were responsible for the design and construction of Hospital Guadalupe, on Arcipreste Manoel Teodoro Street.

In Belém, Francisco de Paula’s personal memories were kept alive by his family.
His nephew, Alex Bolonha Fiúza de Mello, served as rector of UFPA for eight years.
He recalled:
“The architect, as he grew older, became a reserved, solitary person, reclusive in his apartment on Niemeyer Avenue, at São Conrado Beach, in Rio de Janeiro.”
At that stage, Alex remembered:
“Francisco de Paula lived immersed in his collection of paintings by famous artists. He kept them lovingly in the living room and bedrooms of his apartment.”

— Oswaldo Coimbra is a writer and journalist
(Monument to Lauro Sodré featured by the Santarém newspaper Impacto)

The post O que deixou para Belém o maior arquiteto paraense appeared first on Ver-o-Fato.