PARÁ – Incêndio florestal, arma ilegal e falsa identidade: fazendeiro é processado

Análise de celular revelou áudios e vídeos em que o próprio acusado narra a queima de vegetação

A Justiça Federal em Altamira aceitou denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra um fazendeiro acusado de provocar incêndios ilegais em área de vegetação nativa, além de responder pelos crimes de falsa identidade e porte ilegal de arma de fogo de uso restrito. O caso ocorreu no distrito de Castelo dos Sonhos, em Altamira, sudoeste do Pará, região que sofre há décadas com a devastação ambiental provocada por grileiros e grandes fazendeiros.

O recebimento da denúncia, ocorrido no último dia 22, marca o início da ação penal e reconhece que há indícios consistentes de autoria e materialidade dos crimes, conforme a legislação processual penal. A denúncia é assinada pelo procurador da República Gilberto Batista Naves Filho e se apoia em provas periciais, documentos e registros encontrados no celular do acusado.

Segundo o MPF, o fazendeiro foi preso em flagrante pela Polícia Federal em 9 de outubro de 2024, no interior da Gleba Federal Curuaés, uma área de terras públicas da União. Na ocasião, ele havia provocado incêndios para, segundo apontam as investigações, limpar terrenos previamente desmatados com o objetivo de renovar pastagens para gado — uma prática comum e ilegal, que alimenta a devastação da floresta.

Durante a abordagem policial, o acusado tentou ludibriar os agentes apresentando-se com um nome falso e fornecendo informações falsas sobre sua ocupação. Mesmo fugindo do local, retornou espontaneamente à delegacia no mesmo dia, quando sua verdadeira identidade foi confirmada.

Com ele, foram apreendidas uma espingarda calibre .22, uma pistola 9x19mm e diversas munições. Embora registradas, perícia técnica concluiu que a munição de calibre 9x19mm é de uso restrito, por exceder os limites de energia definidos pelo Decreto nº 11.615/2023.

O modus operandi revelado pelo MPF expõe o funcionamento sistemático e articulado de como áreas da Amazônia Legal são queimadas: desmatamento ilegal, seguido da queima para limpeza da área, criação de pastagem e, muitas vezes, com o uso da violência — explícita ou implícita — contra agentes de fiscalização ambiental.

Gravou crimes no celular

Uma das provas mais contundentes da denúncia veio da análise do celular do acusado. O aparelho continha áudios e vídeos gravados por ele mesmo, nos quais descreve as queimadas, com detalhes e sem qualquer constrangimento. Esse material evidenciou o que o MPF chamou de “padrão de reiteração e habitualidade na prática delitiva”. Além disso, análises multitemporais de imagens de satélite e focos de calor entre 2022 e 2024 confirmaram o início sistemático dos incêndios a partir da fazenda do réu.

A Justiça Federal considerou que os crimes estão interligados e devem ser julgados conjuntamente, destacando que as armas de fogo “possivelmente serviriam para obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público no trato de questões ambientais”.

Com o recebimento da denúncia, o fazendeiro torna-se réu na ação penal nº 1002722-95.2024.4.01.3908, em curso na Subseção Judiciária de Altamira. A decisão judicial frisa que este é um juízo preliminar e que as acusações ainda serão objeto de ampla defesa, conforme previsto na Constituição.


O ciclo do fogo ilegal na Amazônia

Como se vê, esse é o padrão criminoso que alimenta a destruição ambiental na Amazônia: grilagem de terras públicas, desmatamento ilegal, queimadas planejadas e consolidação da posse por meio da ocupação com gado ou lavoura.

Em muitos desses casos, a violência acompanha o processo — seja com o uso de armas, seja com intimidações a servidores públicos, ribeirinhos e povos indígenas.

É um mecanismo repetitivo e impune de apropriação do território amazônico, que avança sobre terras públicas, falsifica informações, desafia o Estado e converte floresta em pasto — muitas vezes à custa de fogo, mentira e chumbo.

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