O arquiteto e professor de Arquitetura Antonio Giuseppe Landi, nascido em Bolonha, na Itália, viveu por mais de três décadas no Gram-Pará, a partir de 1755.
Ao longo deste tempo, ele, construiu (ou participou da construção) de onze igrejas e quatro obras de arquitetura civil, em Belém, segundo um balanço feito pela arquiteta e pesquisadora Elna Trindade, em entrevista à jornalista Cíntia Magno, autora da reportagem “O legado de Antônio Landi na arquitetura e no centro histórico de Belém”.
Entre estas obras se destacam algumas projetadas pelo próprio Landi, como a Casa das Onze Janelas, o Palácio do Governo, a Igreja de São João Batista, a Igreja de Sant’Ana, a Igreja do Rosário dos Homens Pretos, a Capela Pombo e casarões do centro antigo.
E outras obras nas quais ele apenas fez intervenções, como a Igreja da Sé, a Igreja das Mercês, a Igreja do Carmo, e, a Igreja de Santo Alexandre.
Nesta sua produção arquitetônica, Landi levou em conta duas referências, segundo dois pesquisadores estrangeiros da História das Artes.
Ambas de fora do Gram-Pará.
Uma de suas referências foi a atualidade da arquitetura de então, como observou o historiador de arte norte-americano Robert Smith.
Ele visitou Belém em 1951.
E, chegou a comparar a importância de Landi na História das Artes do Brasil, à de Aleijadinho, considerado pela crítica brasileira, quase em consenso, como o maior expoente da arte colonial no Brasil.
Smith lembra o que era atual na Arquitetura, de então: o movimento internacional do neopalladianismo.
Um movimento, surgido na Inglaterra no século XVIII, inspirado pelas obras e teorias do arquiteto italiano Andrea Palladio.
E que se caracterizava pela simetria e pela proporção e uso de elementos clássicos da arquitetura romana e grega.
Segundo Smith, o chamado “italianismo de Landi” era produto deste movimento que figuraria em cada uma das obras do arquiteto italiano, em Belém.
Especialmente, no templo de Sant’Ana, no interior das Mercês e na fachada posterior do Palácio dos Governadores.
Onde havia íntimas semelhanças com vários monumentos das colônias britânicas das décadas anteriores à revolução de 1776.
Assim como, com os edifícios públicos de Havana e de Santiago do Chile, do fim do século XVIII.
Outra referência para a execução de obras, em Belém, Landi tinha dentro da arquitetura portuguesa, da época, no chamado estilo pombalino.
O historiador de arte francês, Germain Bazin, autor “A Arquitetura Religiosa Barroca no Brasil”, define o estilo pombalino como “uma regulamentação neoclássica do rococó”.
Isto é, o estilo pombalino mostraria uma preocupação com a sobriedade e a simplicidade, numa corrente estética, como a do rococó, caracterizada pelo excesso de curvas caprichosas e pela profusão de elementos decorativos.
Para Bazin, o estilo pombalino se traduzia por uma ênfase nos elementos que acentuam as estruturas, reduzindo a decoração ao conjunto de molduras de uma construção,amodinatura,e, à aplicação de somente alguns adornos com formas de conchas.
De acordo com este historiador de arte francês, as obras arquitetônicas de Landi em Belém, junto com construções que surgiriam, depois, no Rio de Janeiro, eram as que mais estavam “de acordo com o estilo vigente em Lisboa, sob a autoridade implacável de Pombal”.
Diz ainda Bazin:
“As relações entre os edifícios de Belém e de Portugal são, aliás, tão estreitas que alguns elementos da decoração são de lioz”.
Que Landi, um profissional com formação obtida na Itália, fosse capaz de reproduzir elementos daquele estilo arquitetônico nos seus trabalhos, é algo, afirma Bazin, demonstrativo de sua “flexibilidade de espírito”.
O pesquisador supõe que tal captação do estilo pombalino por Landi se deu através de:
1a.) um contato pessoal, ocorrido durante o pouco tempo que o arquiteto italiano passou em Portugal, “justo na época em que o estilo que iria ser o pombalino começava a tomar forma no Alentejo e em Lisboa”.
2a.) correspondências.
“Não podemos esquecer também que as trocas de informações e documentos entre metrópole e colônia eram intensas e isso permitia aos artistas das regiões mais longínquas se manterem a par das novas modas”.
Bazin enfatizou a capacidade de Landi de, em Portugal, sintonizar com esta aspiração de resistência aos excessos do estilo rococó.
Algo, aliás, que, segundo ele, corresponderia à origem da formação de Landi.
E isto fez Belém, segundo o pesquisador francês, gozar de uma situação inversa à existente na Bahia, em Pernambuco e, sobretudo, em Minas Gerais.
Enquanto nestas regiões, vigia o rococó “prolongado além de sua duração normal”, Belém, “uma das cidades mais longínquas e provinciais do Brasil” se tornava “a mais moderna da América portuguesa, juntamente com o Rio”.
A proeza foi facilitada, ao talento de Landi, pela ausência de tradição arquitetônica na cidade, afirma Bazin.
Como Belém, o Rio de Janeiro, segundo o pesquisador, também se distinguiu de outras localidades brasileiras “por uma tendência à sobriedade, influência da reforma pombalina que preparou o neoclássico”.
Mas, embora aproxime as duas cidades na resistência aos exageros do rococó, Bazin, no entanto, não deixa de reconhecer que Belém se antecipou até mesmo em relação ao Rio de Janeiro.
Ele sustenta que, no Brasil, “a influência neoclássica só se manifestou quase que somente por volta de 1810, exceto em Belém onde graças a Landi, ela foi bem precoce”.
A peculiaridade de Belém, em relação ao Rio de Janeiro, é bem destacada por Leandro Tocantins, em “Santa Maria de Belém do Grão-Pará”.
Lembra este autor que só em 1816 chegou ao Rio de Janeiro a missão de artistas franceses – entre os quais estava o grande arquiteto Grandjean de Montigny -, responsável pela introdução do estilo neoclássico no Rio de Janeiro.
Foi a partir deste ano que o estilo chamado de “Império Brasileiro”, caracterizado por uma simplicidade de formas, começou a se materializar, através de “magníficas lições de Montigny”, em “palácios, solares, edifícios públicos”, espalhados, a partir do Rio de Janeiro, para outras partes do Brasil.
Por isto, Tocantins afirma, categoricamente:
Landi, “o grande arquiteto de Belém”, foi o “introdutor do neoclassicismo no Brasil, antecipando-se à escola clássica da Missão Francesa de 1816”.
*Oswaldo Coimbra é escritor e jornalista
Translation (tradução)
Belém at the forefront of brazilian architecture
The architect and professor of Architecture Antonio Giuseppe Landi, born in Bologna, Italy, lived for over three decades in Grão-Pará, starting in 1755.
During this time, he built (or took part in the construction of) eleven churches and four civil architecture works in Belém, according to an assessment by architect and researcher Elna Trindade, in an interview with journalist Cíntia Magno, author of the report “The Legacy of Antonio Landi in the Architecture and Historic Center of Belém.”
Among these works stand out some directly designed by Landi himself, such as the Casa das Onze Janelas (House of Eleven Windows), the Government Palace, the Church of São João Batista, the Church of Sant’Ana, the Church of the Rosary of Black Men, the Pombo Chapel, and several mansions in the old city center.
And others in which he only intervened, such as the Cathedral (Sé), the Church of Mercês, the Church of Carmo, and the Church of Santo Alexandre.
In his architectural production, Landi drew upon two main references, according to two foreign art historians.
Both came from outside Grão-Pará.
One of his references was the contemporary architecture of his time, as noted by American art historian Robert Smith, who visited Belém in 1951.
He went so far as to compare Landi’s importance in the history of Brazilian art to that of Aleijadinho, considered by Brazilian critics, almost unanimously, the greatest figure of colonial art in Brazil.
Smith pointed to what was current in architecture at the time: the international Neopalladian movement.
This movement, which emerged in 18th-century England, was inspired by the works and theories of Italian architect Andrea Palladio.
It was characterized by symmetry, proportion, and the use of classical Roman and Greek architectural elements.
According to Smith, Landi’s so-called “Italianism” was a product of this movement and could be found in each of the Italian architect’s works in Belém—especially in the Church of Sant’Ana, the interior of the Mercês Church, and the rear façade of the Palace of the Governors.
These bore close resemblance to monuments found in British colonies from the decades preceding the American Revolution of 1776, as well as to public buildings in Havana and Santiago de Chile from the late 18th century.
Another key reference for Landi’s work in Belém came from Portuguese architecture of the period, specifically the so-called Pombaline style.
French art historian Germain Bazin, author of “Religious Baroque Architecture in Brazil,” defines the Pombaline style as “a neoclassical regulation of the Rococo.”
That is, the Pombaline style expressed a concern for sobriety and simplicity within an aesthetic current like Rococo, known for its fanciful curves and profusion of decorative elements.
For Bazin, the Pombaline style emphasized structural elements and reduced ornamentation to moldings—modinature—and to a few shell-shaped decorative features.
According to this French art historian, Landi’s architectural works in Belém—alongside later constructions in Rio de Janeiro—were those that most closely followed “the prevailing style in Lisbon under Pombal’s relentless rule.”
Bazin adds:
“The relationship between the buildings in Belém and those in Portugal is, in fact, so close that some decorative elements are made of lioz limestone.”
That Landi—a professional trained in Italy—could replicate elements of this architectural style in his works, Bazin sees as proof of his “flexibility of spirit.”
The historian suggests that Landi captured the Pombaline style through:
- Personal contact during the brief time he spent in Portugal, “precisely when the style that would become Pombaline was beginning to take shape in Alentejo and Lisbon.”
- Correspondence.
“We must also remember that exchanges of information and documents between the metropolis and the colony were intense, which allowed artists in the most distant regions to stay informed of the latest trends.”
Bazin highlighted Landi’s ability to tune into this resistance to the excesses of Rococo, something, he said, that corresponded to Landi’s own background.
This made Belém enjoy a unique situation, in Bazin’s view, quite the opposite of what occurred in Bahia, Pernambuco, and especially Minas Gerais.
While these regions retained Rococo “beyond its proper time,” Belém—“one of the most remote and provincial cities in Brazil”—was becoming “the most modern in Portuguese America, alongside Rio.”
This achievement was facilitated, Bazin asserts, by Landi’s talent and by the absence of an architectural tradition in Belém.
Like Belém, Rio de Janeiro also stood out from other Brazilian cities “for a tendency toward sobriety, influenced by the Pombaline reforms that paved the way for Neoclassicism,” according to Bazin.
However, although he links both cities in their resistance to Rococo excesses, Bazin acknowledges that Belém actually preceded even Rio de Janeiro.
He argues that in Brazil, “Neoclassical influence was only truly evident around 1810—except in Belém, where thanks to Landi, it arrived much earlier.”
The distinction between Belém and Rio de Janeiro is further emphasized by Leandro Tocantins in his book “Santa Maria de Belém do Grão-Pará.”
He recalls that only in 1816 did the French Artistic Mission arrive in Rio de Janeiro—among them the great architect Grandjean de Montigny—responsible for introducing Neoclassicism to the city.
From that year on, the style known as Brazilian Empire, characterized by simple forms, began to materialize through “magnificent lessons from Montigny” in palaces, mansions, and public buildings that spread from Rio to other parts of Brazil.
For this reason, Tocantins states categorically:
Landi, “the great architect of Belém,” was “the true introducer of Neoclassicism in Brazil, anticipating the classical school of the French Mission of 1816.”
*Oswaldo Coimbra is a writer and journalist
(The small Church of São João was called a jewel of architecture by Bazin).
The post Belém na vanguarda da arquitetura do Brasil appeared first on Ver-o-Fato.
