A Justiça Federal acolheu os pedidos do Ministério Público Federal (MPF) e condenou a empresa Transporte e Comércio de Madeiras Bonfim Ltda., conhecida comercialmente como Transbon, ao pagamento de R$ 22,8 milhões em indenização por danos ambientais causados na Terra Indígena (TI) Alto Rio Guamá, localizada no nordeste do Pará. A sentença, proferida no último dia 3, é resultado de uma ação penal que expôs um sofisticado esquema de exploração ilegal de madeira, desmatamento e fraude documental dentro do território do povo indígena Tembé.
Segundo a denúncia do MPF, a empresa foi responsabilizada pela derrubada e comercialização ilegal de pelo menos 1.700 árvores nativas em área de domínio público, sem qualquer tipo de autorização ambiental. Os crimes ocorreram, em sua maioria, no ano de 2012, mas as fraudes foram identificadas em ações da empresa entre 2008 e 2013.
As investigações foram conduzidas pelo MPF em conjunto com a Polícia Federal e com apoio técnico da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas/PA). Os órgãos revelaram que a derrubada das árvores era apenas o início de uma cadeia criminosa que visava dar aparência de legalidade à madeira extraída de forma clandestina.
O núcleo do esquema consistia na manipulação deliberada dos sistemas oficiais de controle florestal, por meio da inserção de dados falsos para gerar créditos florestais fraudulentos.
Esquema de fraudes: como a Transbon “esquentava” madeira ilegal
A análise técnica dos sistemas revelou inúmeras incongruências que comprovaram o uso fraudulento das ferramentas de controle ambiental. Entre os indícios mais gritantes, destacam-se:
- Veículos incompatíveis: automóveis de passeio e até motocicletas foram registrados como responsáveis pelo transporte de toras de madeira de grandes dimensões;
- Viagens fisicamente impossíveis: trajetos de mais de 200 km registrados como realizados em apenas 12 minutos, e outras operações com guias reutilizadas por meses;
- Valores irreais: as notas fiscais indicavam preços de compra e venda muito abaixo dos valores de mercado estipulados pelo fisco, o que reforça a tese de que as operações comerciais eram simuladas apenas para movimentar os créditos florestais.
Além dessas irregularidades, os investigadores reuniram farto material probatório, incluindo fotografias de toras com a logomarca da empresa, anotações contábeis feitas à mão pelos funcionários e depoimentos de auditores fiscais que participaram das diligências no local.
Penalidades adicionais e impactos
Além da indenização milionária, a sentença impôs à Transbon a prestação de serviços à comunidade, o que incluirá o custeio de projetos ambientais, obras de recuperação de áreas degradadas e ações de manutenção de espaços públicos. A empresa também foi multada em R$ 20 mil, quantia que será destinada a entidades de proteção ambiental.
A decisão ainda é passível de recurso, mas representa, segundo o MPF, um marco importante na responsabilização criminal de empresas que historicamente se beneficiaram da devastação de terras públicas e indígenas na Amazônia.
O caso da Transbon demonstra, mais uma vez, a fragilidade dos mecanismos de fiscalização ambiental diante da ação articulada de empresas dispostas a burlar sistematicamente o controle público em benefício próprio. A impunidade e a conivência, por muito tempo, permitiram que esquemas como esse prosperassem em regiões remotas, afetando diretamente populações tradicionais e provocando danos irreversíveis aos ecossistemas amazônicos.
O valor da indenização, embora significativo, não reverte a destruição causada, tampouco repara integralmente os prejuízos culturais e ambientais impostos aos povos indígenas. Este caso ilustra a urgência de reformas estruturais nos sistemas de monitoramento florestal, bem como de ações coordenadas entre os órgãos de controle, justiça e sociedade civil, para garantir que a exploração econômica da Amazônia seja feita com respeito à lei, ao meio ambiente e aos povos originários.
Processo nº 0000491-94.2019.4.01.3906 – Justiça Federal, Subseção de Paragominas (PA)
Para mais informações: Consulta processual TRF1
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