Tarifaço de Trump entra em vigor: entenda como isso afeta a economia brasileira

A partir desta quarta-feira, 6, produtos brasileiros exportados para os EUA passam a pagar tarifa de 50% – exceto os 694 itens que constam de uma lista do governo americano

A partir desta quarta-feira, 6, os produtos brasileiros embarcados para os Estados Unidos ficam mais caros. Entrou em vigor à 0h01, horário de Washington (ou 1h01, horário de Brasília), a tarifa de 50% sobre as exportações do Brasil. A exceção são os 694 itens que constam de uma lista publicada na semana passada pelo governo americano, que continuarão pagando uma taxa de 10% que já estava em vigor.

O Brasil não estará sozinho por muito tempo nessas tarifas elevadas. Na quinta-feira, 7, sobem as taxas dos produtos de mais algumas dezenas de países que exportam para os EUA, entre eles o Japão, Coreia do Sul e a União Europeia (veja tabela abaixo). A diferença é que em nenhuma dessas dezenas de nações a taxa é tão alta quanto no Brasil.

O presidente americano Donald Trump lançou mão desse tarifaço global com a justificativa de tentar reverter ou equilibrar uma balança comercial que ao longo de décadas tem sido extremamente deficitária para os Estados Unidos. Trump acusa esses países de estarem “se aproveitando” dos EUA, já que vendem muito para os EUA, mas compram pouco do que os americanos produzem.

No caso brasileiro, porém, essa lógica não se aplica. O comércio entre o Brasil e os EUA tem sido há bastante tempo favorável aos americanos – desde 2009, para ser mais exato. E, no primeiro semestre deste ano, a balança apontou um novo superávit para os americanos, de US$ 1,674 bilhão.

Segundo o próprio Trump, a motivação para a taxação tão alta para o Brasil é política. O presidente americano diz haver uma “caça às bruxas” no País contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, que responde no Supremo Tribunal Federal (STF) pela acusação de liderar uma tentativa de golpe de Estado após ser derrotado na eleição presidencial de 2022. Seria, dessa forma, uma espécie de “punição” ao Brasil, já que não há justificativa técnica.

E esse quadro político mudou bastante desde que Trump anunciou as tarifas de 50%, em 9 de julho. Nesta segunda-feira, 4, o ministro do STF Alexandre de Moraes decretou a prisão domiciliar de Bolsonaro. Para muitos analistas, esse movimento complicou ainda mais as tentativas já infrutíferas do governo brasileiro de tentar reverter as taxas do presidente americano – ou pelo menos de incluir mais setores e produtos na lista de exceções.

Impacto na economia

Para a economia brasileira como um todo, a avaliação é de que o impacto será grande, mas não exatamente um desastre. Isso porque o Brasil é um país muito fechado, e depende pouco, no fim das contas, do comércio externo para sobreviver. Um relatório divulgado na segunda-feira pelo UBS BB aponta que o efeito do tarifaço no PIB nacional será de no máximo 0,6 ponto porcentual – levando-se em conta que 74% das exportações brasileiras para os Estados Unidos poderiam ser redirecionadas com uma certa facilidade a outros países, especialmente as commodities agrícolas.

O banco americano Goldman Sachs projeta um efeito ainda menor, de 0,25 ponto porcentual no PIB, em um cenário que não considera uma retaliação significativa por parte do governo brasileiro.

“Medidas de apoio fiscal e de crédito aos setores mais afetados e alguma diversificação de comércio para mercados alternativos poderiam reduzir o impacto na atividade real devido às tarifas de importação mais altas dos EUA”, disse o diretor de pesquisa macroeconômica para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, em relatório a clientes.

Mas, para as empresas diretamente afetadas, pode ser um desastre. Muitas fabricam produtos específicos para o mercado americano, sob demanda, e teriam muita dificuldade em direcionar sua produção rapidamente para outros mercados. É o caso de muitas fabricantes de máquinas e equipamentos, por exemplo.

Alguns setores já vinham sofrendo os efeitos do tarifaço antes mesmo de ele entrar efetivamente em vigor. Nesta segunda-feira, em Curiúva, no interior do Paraná, a Depinus, que exporta painéis e molduras feitos a partir de madeira reflorestada (plantada) de pinus e eucalipto, anunciou a demissão de 23 dos seus 50 empregados. A empresa exporta 90% do que fabrica para os EUA.

“O motivo é a paralisação de toda nossa venda para o mercado dos EUA”, disse o proprietário da empresa, Paulo Bot. “Iremos manter ainda mais de 20 funcionários para tentar buscar novos mercados e atender os 10% que nos restaram – França, Caribe e um pouco de mercado interno. Caso as tarifas sejam revertidas nos próximos 20 dias, faremos a reintegração destes colaboradores.”

A tendência é que esses se multipliquem pelo Brasil nos próximos dias, principalmente relacionados a pequenas e médias empresas, que têm menos fôlego financeiro para suportar uma quebra na demanda e também menos flexibilidade para buscar novos mercados rapidamente.

Ajuda do governo

Essas empresas vão depender muito, em um primeiro momento, de um plano de contingência que vem sendo preparado pelo governo para dar um suporte aos setores afetados. Mas ainda não está claro o que estará incluído nesse plano.

Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que esse plano pode prever, no curto prazo, compras governamentais e linha de crédito subsidiado para setores prejudicados. “As medidas já estão desenhadas e orçadas, têm impacto primário, que é uma coisa pequena, que pode acontecer, dentro das regras fiscais”, disse, em entrevista à BandNews.

Membros da equipe econômica têm demonstrado uma preocupação de que essas medidas de socorro sejam bem calibradas, para que não se transformem em despesas permanentes, a ponto de agravar o quadro fiscal. Isso foi visto durante a pandemia da covid-19: alguns programas, como o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), acabaram durando muito mais do que se previa.

As empresas, por sua vez, já levaram ao governo seus pedidos. A Confederação Nacional da Indústria (CNI), por exemplo, elaborou um documento com oito pleitos do setor industrial, que foram entregues ao vice-presidente Geraldo Alckmin na semana passada. Na lista figuram, entre outras coisas, a criação de uma linha de crédito do BNDES, com taxas entre 1% a 4% para capital de giro, ampliação do prazo de 750 para 1.500 dias para liquidação dos Adiantamentos de Contratos de Câmbio (ACC), a reativação do Programa Seguro Emprego (PSE) criado na pandemia e o adiamento por 120 dias do pagamento de impostos federais.

Nesta terça-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva também falou dessa ajuda, sem dar detalhes. Segundo ele, diante do “tarifaço” anunciado pelos Estados Unidos, o governo colocará em execução um plano de contingência para mitigar o que chamou de “ataque injusto” e aliviar seus prejuízos econômicos sociais. Ele disse também que todas as medidas cabíveis serão tomadas, até mesmo um recurso à Organização Mundial do Comércio (OMC) – um gesto, na verdade, talvez mais político do que prático, já que Trump nem reconhece a OMC.

No final da semana passada, o presidente Trump parecia ter aberto alguma porta às conversas com o presidente brasileiro, ao dizer que “Lula pode falar comigo quando quiser”, em resposta a um questionamento de uma repórter da GloboNews em Washington. Na sequência, ao ser perguntado sobre o que estaria em pauta para o Brasil, completou: “Vamos ver o que acontece. Eu amo o povo brasileiro”.

Essa ligação, porém, não ocorreu. “Não vou ligar para o Trump para conversar, não, porque ele não quer falar”, disse Lula nesta terça-feira. “Mas eu vou ligar para o Trump para convidá-lo para vir para a COP. Porque quero saber o que ele pensa da questão climática.” Mas essa, definitivamente, não é uma preocupação do presidente americano. Com informações do Estadao.

Tarifas recíprocas

Como ficam os porcentuais por parceiro comercial (alguns, como o Brasil, terão, além do % abaixo, tarifas adicionais)

PAÍSES
Afeganistão 15
África do Sul 30
Argélia 30
Angola 15
Bangladesh 20
Bolívia 15
Bósnia e Herzegovina 30
Botswana 15
Brasil 10% (+40% extra para alguns produtos)
Brunei 25
Camboja 19
Camarões 15
Cazaquistão 25
Chade 15
Coreia do Sul 15

Source: Casa BrancaGet the data

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