Julgado, espancado e silenciado: a lei do terror das facções em Parauapebas

No mundo sombrio das facções criminosas, a lei é a do medo, e o juiz é quem tem a arma na mão. Em cada região, o nome muda: “tribunal do crime” aqui, “lei da disciplina” ali. Mas a essência é a mesma — um ritual macabro, inspirado em métodos de grupos terroristas, em que a vida e a morte são decididas sem defesa, sem provas, sem qualquer vestígio de humanidade.

Foi assim em Parauapebas, sudeste do Pará, na noite da última quarta-feira (6). Um homem de 25 anos foi encontrado caído no chão, ensanguentado e com ferimentos espalhados pelo corpo, incluindo um golpe na cabeça, no Bairro Alto Bonito. Segundo a Polícia Militar, a cena lembrava uma execução interrompida.

Consciente, mas claramente aterrorizado, o homem contou que havia acabado de passar por uma sessão do chamado “Tribunal de Disciplina” — o código interno de facções que não conhecem limites. Essa estrutura criminosa atua como um Estado paralelo: eles “julgam” quem consideram culpado, aplicam sentenças brutais e, muitas vezes, decretam a morte. Tudo sem lei, sem direitos, sem chance de defesa.

As agressões, segundo a vítima, ocorreram dentro de um prédio abandonado conhecido como “biqueira”, na Rua do Contorno. O local, já marcado pelo tráfico e violência, virou palco de mais uma demonstração de poder desses grupos. Questionado sobre os autores, o homem não disse — ou não ousou dizer — os nomes. O silêncio, nesse contexto, é instinto de sobrevivência.

A PM foi acionada às 22h30, prestou apoio e chamou o Samu, que socorreu a vítima para um hospital. Mas a ferida mais profunda não foi física: é o sinal de que, em muitos cantos do Brasil, a lei oficial perdeu espaço para a lei do crime, e quem vive ali sabe que desafiar essa “disciplina” pode custar a vida.

Como funciona a “lei” das facções: o ritual de um Tribunal de Disciplina

Embora cada facção tenha suas particularidades, a lógica é quase sempre a mesma — um simulacro grotesco de justiça, com etapas bem definidas para impor medo e manter a obediência cega.

A acusação interna
Tudo começa com uma denúncia — que pode ser real, exagerada ou completamente inventada. Alguém diz que o acusado quebrou uma “regra da casa”: falar com a polícia, desrespeitar ordens, consumir drogas sem pagar, desviar dinheiro ou até olhar “de forma errada” para um membro mais graduado. Não importa a gravidade — dentro da facção, qualquer motivo é suficiente.

A captura
O acusado é localizado e levado à força, geralmente para um local isolado ou de controle da facção — um barraco, um prédio abandonado, um matagal. Nessa etapa, a vítima já está incomunicável. A comunidade, por medo, finge que não viu nada.

O “julgamento” armado
Os integrantes mais graduados fazem perguntas rápidas e agressivas, cercando o acusado. Não há advogado, não há chance de defesa real. Quem decide a culpa são os chefes presentes — ou mesmo um único criminoso de alta patente. O clima é de humilhação e intimidação.

A sentença
A pena é definida na hora: pode variar de espancamentos brutais até execução sumária. Em alguns casos, o castigo é “apenas” quebrar braços e pernas, como aviso. Em outros, é a morte imediata ou a marcação física para que a comunidade saiba que aquela pessoa “desrespeitou” a facção.

A execução da pena
Os castigos são aplicados ali mesmo. Bastões, fios elétricos, armas de fogo, facas e até paus com pregos são usados. A violência serve de exemplo para que outros não se atrevam a repetir a “falha”.

O silêncio forçado
Quem sobrevive sai com a ordem explícita: não falar nada à polícia. A ameaça é clara — qualquer denúncia será punida com a própria vida ou a de familiares.

Resumo da ópera macabra
Esse “tribunal” não é apenas um instrumento de punição, mas uma ferramenta de poder psicológico. É a forma das facções deixarem claro que, nos territórios onde atuam, a lei do Estado é substituída por um código de terror, no qual a justiça é decidida pela força e o medo é a moeda de troca. E o mais perverso: muitas comunidades, sufocadas pela ausência do Estado, acabam se adaptando a essa “lei” paralela, como se fosse inevitável.

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