EXCLUSIVO – Família narra drama da idosa paraense condenada pelo STF e agredida na cadeia

Caso de Jucilene chega aos Estados Unidos. Em Belém, familiares relatam ao Ver-o-Fato os dias de medo, angústia e depressão na cadeia em Florianópolis

O drama vivido por Jucilene Costa do Nascimento, paraense de 62 anos, mãe solo de um jovem de 22 anos, ultrapassou as grades do presídio feminino em Santa Catarina e chegou à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos. O caso, que mistura alegações de perseguição política, violência física dentro da prisão e bloqueio de renda, tornou-se mais um capítulo polêmico do pós-8 de Janeiro.

Natural de Belém, Jucilene deixou a capital paraense há cerca de cinco anos, mudando-se para o município de Palhoça (SC) com o filho, Caio. Pensionista, vivia com a renda de dois salários mínimos deixados pelo pai e pela mãe já falecidos. A rotina simples, porém, foi interrompida após ela participar de manifestações políticas em Brasília.

Segundo relato da família ao portal Ver-o-Fato, ela esteve em Brasília três vezes durante o período de acampamentos e protestos na capital federal. Na última viagem, no domingo dos episódios de 8 de janeiro de 2023, chegou à Esplanada dos Ministérios quando o clima já era de tensão.

“Ela me contou que já havia muita confusão. A polícia começou a jogar bombas de efeito moral, balas de borracha e a bater no pessoal. Só que, na realidade, foi uma armação. A polícia, que estava na frente do palácio, começou a chamar as pessoas para entrar, dizendo que era para se proteger da fumaça. Lá dentro, quando ela entrou, já havia coisas quebradas”, disse um familiar.

Ainda segundo o relato, policiais teriam identificado algumas pessoas com pulseirinhas e liberado umas, enquanto outras eram detidas de forma ostensiva. Para a família, todo o cenário foi “montado”.

Prisão e sete meses sem liberdade

Presa no próprio dia, Jucilene foi levada para um centro de detenção e, depois, transferida para o presídio feminino Colmeia. Passou sete meses presa. A família afirma que ficou quase cinco meses sem qualquer notícia, até conseguir contato com o advogado Hélio Júnior, integrante de uma comissão de defesa dos presos que eles chamam de “patriotas”.

Após deixar a prisão, retornou para Palhoça e passou a cumprir medidas restritivas, comparecendo toda segunda-feira para assinar presença e sem viajar nos fins de semana. Mas, em junho de 2024, foi novamente presa às seis da manhã, em meio a uma nova operação que recolheu de volta mais de 200 pessoas, sob a alegação de que alguns detentos tentavam deixar o país.

Condenação dura e bloqueio de renda

Nesse período, Jucilene já havia sido condenada pela pena implacável e exagerada do ministro Alexandre de Moraes a 14 anos de prisão, mais meses adicionais e multa. O bloqueio judicial atingiu sua pensão, deixando o filho em situação financeira delicada.

“Antes, quando bloquearam, tivemos que ajudar para ele não passar fome. Agora ele já trabalha, mas ainda precisa de apoio para pagar apartamento e outras despesas. Ele quer continuar em Santa Catarina, acredita que é melhor para a carreira dele e já começa a ter uma vida estruturada lá”, disse a família.

Choro nas visitas virtuais e sinais de perseguição

Até pouco tempo, a família tinha direito a uma visita virtual por mês. Porém, nas últimas conversas, Jucilene começou a chorar e pedir para ser retirada do local.

“Ela dizia que não estava aguentando mais. A gente começou a desconfiar que estava sendo perseguida dentro da prisão, como já aconteceu com outras pessoas por serem patriotas. Ela não falava muito para não preocupar, mas a gente percebia pelo jeito dela”, acrescentou um familiar ao Ver-o-Fato.

O histórico de depressão voltou a se manifestar, obrigando-a a retomar medicamentos. Houve incidentes anteriores, como a quebra de seus óculos por outra detenta, mas sem que ela revelasse detalhes à família.

Espancamento e denúncia internacional

O episódio mais grave ocorreu recentemente, quando, segundo a defesa, ela foi espancada dentro do presídio feminino de Florianópolis, após ser atacada a socos por uma detenta.

De acordo com o documento enviado à Comissão de Direitos Humanos dos EUA, o ataque deixou um hematoma extenso na região do olho, colocando em risco sua integridade física e mental. A defesa sustenta que ela convive com presas de alta periculosidade e não tem segurança mínima garantida.

A agressão foi levada também ao Supremo Tribunal Federal, onde seus advogados pedem prisão domiciliar imediata. A equipe jurídica — formada por Hélio Júnior, Taniéli Telles, Ana Carolina Sibut, Marta Padovani e Luiz Cunha — destaca que ela sofre perseguição por suas posições políticas e que o Estado brasileiro é responsável por preservar sua vida.

Situação atual

Segundo a família, Jucilene está isolada em Santa Catarina, com visitas e comunicação limitadas. A rotina no cárcere é marcada por tensão, hostilidade e medo de novos ataques.

“Ela sempre cumpriu as regras. Não tentava sair do país, não saía aos fins de semana, ia assinar toda segunda-feira. Mesmo assim, foi levada de volta e agora sofre por estar exposta a pessoas que não toleram sua posição política.”

O caso, agora repercutindo fora do Brasil, coloca em debate as condições dos presos do 8 de Janeiro, a atuação das forças de segurança durante os protestos e o respeito aos direitos humanos no sistema prisional.

Outros casos semelhantes

O caso de Jucilene não é isolado. Desde o 8 de Janeiro, diversas denúncias de maus-tratos a presos ligados às manifestações chegaram a entidades de direitos humanos no Brasil e no exterior. Há registros de:

Falta de atendimento médico adequado.

Agressões físicas e verbais.

Transferências para presídios distantes da família.

Restrições arbitrárias a visitas e comunicação.

Organizações como a Associação Nacional dos Familiares de Presos Políticos (ANFPP) têm reunido dossiês para encaminhar a organismos internacionais.

Repercussão política e jurídica

No Brasil, setores da oposição denunciam abusos nas prisões do 8 de Janeiro, enquanto o governo e o Supremo Tribunal Federal sustentam que as medidas são necessárias para punir atos que classificam como tentativa de golpe de Estado.

Nos Estados Unidos, a entrada do caso na Comissão de Direitos Humanos pode gerar pressão diplomática sobre o Brasil. Ainda não há manifestação oficial do Itamaraty ou do Ministério da Justiça sobre essa denúncia específica.

O que dizem os advogados

A equipe jurídica de Jucilene — formada por Hélio Júnior, Taniéli Telles, Ana Carolina Sibut, Marta Padovani e Luiz Cunha — afirma que o caso é emblemático e que “o Estado brasileiro será responsabilizado caso algo mais grave aconteça”.

Eles pedem prisão domiciliar imediata, alegando risco à vida e agravamento de problemas de saúde.

Limites da legalidade

O caso Jucilene é mais que uma história pessoal: tornou-se símbolo da disputa narrativa em torno do 8 de Janeiro e da tensão entre justiça e direitos humanos no Brasil.
Se a denúncia prosperar nos EUA, poderá reacender um debate incômodo para o governo brasileiro e para o Judiciário — o de até que ponto o rigor da punição pode ultrapassar o limite da legalidade e da dignidade humana.

Linha do tempo do caso

2019 – Jucilene deixa Belém e se muda para Palhoça (SC) com o filho, Caio, então adolescente.

2022 – Intensifica participação em atos políticos contra o governo federal.

2023 (início do ano) – Viaja três vezes a Brasília, acompanhando acampamentos e protestos.

8 de janeiro de 2023 – Chega à Esplanada no meio da confusão. Segundo relato da família, a polícia teria chamado manifestantes para entrar no prédio “para se proteger da fumaça”. Lá dentro, já havia objetos quebrados.

Jan–Ago/2023 – Presa no mesmo dia, é levada para o presídio feminino Colmeia e permanece detida por sete meses.

Junho/2024 – É novamente presa às seis da manhã, junto com mais de 200 pessoas, sob alegação de tentativa de fuga de alguns detentos.

2024 (meados) – É condenada a 14 anos e alguns meses de prisão, mais multa.

2025 (meados) – Passa a se queixar nas visitas virtuais de perseguição, chora e pede para sair do presídio.

Julho/2025 – É agredida fisicamente por outra detenta. A defesa afirma que houve um hematoma extenso no olho e que a motivação foi política.

Agosto/2025 – Defesa leva o caso ao Supremo Tribunal Federal e à Comissão de Direitos Humanos dos EUA, denunciando risco à integridade física e psicológica da idosa.

Com informações exclusivas do Ver-o-Fato, obtidas em Belém, e da revista Oeste.


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