Justiça decide que Boeing pode contratar engenheiros no Brasil

A 3ª Vara de São José dos Campos (SP) decidiu que a Boeing poderá contratar engenheiros no Brasil. O entendimento favorável à fabricante de aviões se deu em ação que argumenta que a empresa norte-americana estaria praticando concorrência desleal ao contratar profissionais brasileiros e prejudicando companhias consideradas estratégicas para a defesa nacional.

No processo, a Abimde (Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Defesa) e a AIAB (Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil) solicitaram limitar as contratações a 0,6% do corpo de engenharia de empresas estratégicas de defesa. As entidades também pediram multa de R$ 5 milhões para a Boeing, com valores destinados a instituições de ensino aeronáutico.

A disputa judicial começou em setembro de 2022, quando o presidente da Akaer, relatou a perda de profissionais para a Boeing. Em novembro do mesmo ano, as associações formalizaram a ação. A Justiça negou em junho de 2024 o pedido de liminar (decisão provisória e urgente), mas determinou a continuidade do processo com a produção de provas.

ENTENDA

De 2022 a 2023, a Boeing teria contratado 470 profissionais que atuavam nas companhias brasileiras. Cerca da metade deles era da Embraer.

Em outubro de 2023, a empresa norte-americana inaugurou o 1º centro de engenharia e tecnologia na América Latina em São José dos Campos (SP), mesma cidade na qual a Embraer tem sede.

O Poder360 procurou a Abimde, a AIAB, a Boeing e a Embraer por aplicativo de mensagens para perguntar se gostariam de se manifestar a respeito do processo.

A Boeing informou que não se pronunciará, pois o processo corre em segredo de Justiça. Não houve resposta dos demais envolvidos até a publicação desta reportagem. O texto será atualizado caso uma manifestação seja enviada a este jornal digital.

GOVERNO ENVOLVIDO

O governo federal afirmou, em fevereiro de 2023, com base em um parecer do Ministério da Defesa, que não via ameaça à soberania nacional caso as contratações de brasileiros pela norte-americana fossem realizadas.

A administração disse ser notória a ação de captura de talentos profissionais brasileiros pelo grupo Boeing, mas afirmou que os argumentos apresentados pelas associações ainda não eram suficientes para demonstrar o interesse processual da União.

Em maio do mesmo ano, o governo pediu para fazer parte do processo.

A mudança de opinião se baseou em parecer de outro ministério, o do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, que viu “possível abuso de poder econômico” e “provável concorrência desleal” da gigante dos EUA nas contratações.

O órgão emitiu nota técnica afirmando que haveria risco de perda de talentos na Base Industrial de Defesa brasileira. O documento foi assinado pela secretária-executiva adjunta do ministério, Aline Schleicher.

Em 2020, a desistiu de comprar parte majoritária da Embraer. Alegou que o lado brasileiro das negociações não satisfez as condições necessárias para fechar acordo. A Embraer, à época, afirmou que a Boeing rescindiu “indevidamente” o acordo de aviação comercial.

Eis uma linha do tempo do caso:

  • 2017 – Boeing oferece US$ 4,2 bilhões por 80% das áreas de aviação comercial da Embraer;
  • 2018 – governo autoriza venda;
  • 2020 – negociação é desfeita e a Embraer processa a Boeing. A norte-americana diz que Embraer descumpriu cláusulas de contrato;
  • 2022 – associações da indústria aeronáutica entram com processo contra contratação de engenheiros brasileiros;
  • fev.2023 – Ministério da Defesa diz não ter interesse no caso. Justiça Federal envia processo para o Judiciário estadual e associações recorrem;
  • mai.2023 – Justiça Federal mantém caso consigo depois de o MDIC enviar relatório apoiando a causa. A União se torna parte do parte do processo. O Ministério da Defesa afirma haver perda de empregos estratégicos;
  • jun.2023 – Justiça nega liminar para interromper contratações;
  • ago.2023 – Justiça dá andamento ao caso para apresentação de provas e testemunhas.