Bolsonaro omitiu repasse de R$ 2 milhões a Michelle, aponta PF

Relatório indica que transferência foi feita um dia antes de depoimento e tinha como objetivo blindar Eduardo Bolsonaro no exterior

Por Sandra Venancio – Foto: Leandro Schmidt/Secom/ND

A Polícia Federal revelou, em novo indiciamento, que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) transferiu R$ 2 milhões para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro um dia antes de prestar depoimento sobre a atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) em favor de sanções dos Estados Unidos contra o Brasil. O repasse, segundo os investigadores, foi omitido por Bolsonaro em seu interrogatório no âmbito do Inquérito 4.995/DF.

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O relatório aponta que, além de não justificar a transação para Michelle, Bolsonaro também deixou de informar que havia repassado outros valores a Eduardo. Publicamente, o ex-presidente havia admitido apenas a transferência de R$ 2 milhões para custear a estadia do filho nos Estados Unidos.

“Vale ressaltar que Jair Bolsonaro omitiu informação à Polícia Federal em seu depoimento (…) de que teria repassado outros valores a Eduardo Bolsonaro, além dos R$ 2 milhões. Também não houve qualquer justificativa para transferência de recursos no mesmo valor para Michelle Bolsonaro apenas um dia antes do interrogatório”, diz o documento.

Na conclusão, enviada ao ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF, a PF afirma que Bolsonaro agiu “de forma livre e consciente” para apoiar Eduardo em sua estratégia internacional. Segundo os investigadores, o ex-presidente buscou esvaziar seus próprios recursos financeiros para evitar bloqueios judiciais e, ao mesmo tempo, financiar as ações do filho no exterior.

O caso ocorre em meio a um ambiente de crescente pressão internacional. Em maio, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, solicitou abertura de investigação contra Jair e Eduardo, após denúncias de que o deputado teria incitado o governo dos Estados Unidos a adotar medidas contra Moraes.

Desde então, Washington anunciou sanções contra autoridades brasileiras, entre elas o próprio Moraes sob a Lei Magnitsky, além de um tarifaço de 50% sobre produtos brasileiros e uma investigação contra o Pix. Eduardo, por sua vez, está licenciado do mandato desde março e se mudou para os EUA, alegando perseguição política.

Na Câmara, sua situação também se agrava: um pedido de cassação apresentado por PT e PSOL já foi encaminhado pelo presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos), à Comissão de Ética.

Investigações sobre Michele Bolsonaro

A transferência de R$ 2 milhões para Michelle Bolsonaro, revelada pela Polícia Federal, reacende a atenção sobre o papel da ex-primeira-dama em diferentes frentes de investigação. Embora ela nunca tenha sido denunciada formalmente, seu nome aparece em inquéritos que miram o núcleo familiar do ex-presidente:

  • Caso das joias sauditas: Michelle foi citada no escândalo envolvendo a tentativa de entrada ilegal de joias milionárias no Brasil, presenteadas por autoridades sauditas. Parte dos itens era destinada diretamente a ela, segundo registros apreendidos. O caso segue sob análise da PF e do STF.
  • Cartão corporativo da Presidência: A primeira-dama foi alvo de questionamentos sobre gastos com cartão corporativo durante o governo Bolsonaro, com despesas que incluíam viagens e compras de luxo. Embora os processos administrativos não tenham resultado em indiciamento, permanecem sob escrutínio em auditorias do TCU.
  • Vínculo com Michele Recebe Pix: Reportagens investigativas apontaram Michelle como destinatária de doações via Pix enviadas ao clã Bolsonaro após a derrota eleitoral de 2022. A movimentação financeira ainda é analisada pela Receita Federal e pelo Coaf.
  • Instituto Alvorada: A ONG ligada ao entorno da ex-primeira-dama é investigada por suspeita de recebimento irregular de doações e desvio de finalidade em convênios firmados com prefeituras e entidades privadas.
  • Depósitos em espécie revelados por Queiroz: Em 2019, a quebra de sigilo bancário de Fabrício Queiroz revelou depósitos de R$ 89 mil em dinheiro vivo em conta de Michelle. O caso foi arquivado sem denúncia, mas segue sendo mencionado em inquéritos sobre o esquema das “rachadinhas” no gabinete de Flávio Bolsonaro.

Com a descoberta da nova transferência milionária, Michelle passa a ter risco jurídico ampliado: o STF pode incluir seu nome em investigações por lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio, além de avaliar sua participação em eventuais tentativas de blindagem financeira de Jair e Eduardo Bolsonaro.