Clã Bolsonaro está nu

Políticos, marqueteiros contratados pelos partidos, operadores do direito, eleitores em geral, puxa-sacos juramentados, e a raia miúda, ainda não digeriram inteiramente, as 170 páginas do bombásticos relatório da Polícia Federal, que revela o DNA, modos operandi, e caráter do Clã Bolsonaro.

Imersão
Ao imergimos na análise dos fatos para interpretar e desvendar as complexas camadas de revelações arreganhadas ao distinto público, o relatório tem o poder de uma bomba de alta destruição. A peça investigatória das autoridades federais, traça um panorama contundente sobre a situação política e judicial do ex-presidente Jair Bolsonaro e de seu círculo mais próximo, com destaque para seu filho Eduardo Bolsonaro e o pastor Silas Malafaia.

Roteiro
A linha central do raciocínio converge para a tese de que a “ruína de Bolsonaro” representa uma “chance para a direita”, sugerindo um imperativo para os “verdadeiros conservadores” se desvencilharem do clã Bolsonaro.

Interesses pessoais explícitos
A análise do relatório revela uma linha argumentativa que posiciona os interesses pessoais e familiares como o motor principal das ações do ex-presidente, em detrimento de qualquer consideração de interesse nacional ou partidário. Qualquer que seja o viés interpretativo, é categórico afirmar que o indiciamento de Jair e Eduardo Bolsonaro por “crimes de coação no curso do processo e abolição violenta do Estado Democrático de Direito” na Ação Penal 2.668, referente à tentativa de golpe de Estado, “escancarou” a prioridade da família: assegurar a impunidade do ex-presidente.

Eu, só eu
Segundo o encadeamento dos fatos, a preocupação primordial é que Bolsonaro “jamais seja responsabilizado pela pletora de crimes que o fizeram réu perante o Supremo Tribunal Federal (STF)”.

Indiciamentos
Os indiciamentos de Jair e Eduardo Bolsonaro pelos crimes de coação no curso do processo e abolição violenta do Estado Democrático de Direito escancarou, de uma vez por todas, aquilo que já estava implícito no comportamento do clã: sua única preocupação é garantir, a qualquer custo, que o ex-presidente jamais seja responsabilizado pelos crimes que o fizeram réu perante o Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Penal 2.668, que trata da tentativa de golpe de Estado.

Rosário de mal feitos
A divulgação da íntegra do relatório da Polícia Federal (PF), autorizado pelo ministro Alexandre de Moraes, que indicaria uma trama entre Bolsonaro, Eduardo e Silas Malafaia para “interferir no bom andamento da Ação Penal 2.668” revela e desnuda o trio. Embora reconheça que a tipificação jurídico-penal ainda depende do crivo da Procuradoria-Geral da República, os fatos enfatizam o caráter “devastador” do material obtido pela PF do ponto de vista político para os Bolsonaros. Esta é uma das bases que sustenta a argumentação de que os interesses mesquinhos da família se sobrepõem aos nacionais.

Prejuízos incalculáveis
Não é possível quantificar em prejuízos concretos para o Brasil o que veio a seguir após as gestões de Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo, junto a cúpula da Casa Branca, sede do Poder Executivo norte-americano. A começar pela imposição de uma sobretaxa de 40% sobre 10% anterior, que passaram a incidir sobre as exportações brasileiras pelos EUA, sob a presidência de Donald Trump, e sanções ao ministro Moraes no âmbito da Lei Magnitsky. Estes eventos são apresentados como evidências do “preço da cruzada delinquente de Jair e Eduardo Bolsonaro”, resultando em um “incalculável prejuízo para o País em nome da impunidade de um só homem”.

Da esq. p/ dir.: tenente-coronel Mauro Cid, Jair Bolsonaro, general Marco Antônio Freire Gomes e brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior. Arte: Cláudio/Folhapres

Ações do clã
O peso das ações do clã no cenário internacional, vinculando diretamente as sanções e sobretaxas à busca por impunidade é por si só uma crime de lesa pátria.
Um dos pontos mais reveladores nas mensagens atribuídas a Eduardo Bolsonaro, nas quais ele explicitaria ao pai que a tão falada “anistia ampla, geral e irrestrita” não passava de um “artifício retórico”. O verdadeiro objetivo, segundo o relatório, seria unicamente “livrar Bolsonaro da cadeia”. A distinção entre essa anistia e uma “anistia light” para os envolvidos nos atos de 8 de janeiro é exposta, reforçando a ideia de que a energia da família estava focada exclusivamente em garantir a liberdade de Jair Bolsonaro e o resto que se dane.

Retórica e desfaçatez
Em mensagens ao pai, Eduardo foi explícito ao dizer que a tal “anistia ampla, geral e irrestrita” jamais passou de um artifício retórico. O que importa, disse ele, é tão somente livrar [Jair] Bolsonaro da cadeia. Caso contrário, segundo Eduardo, Trump poderia sustar suas ações para subjugar o STF em favor do pai.

Além dos embates externos
Os fatos extrapolam e vão além dos embates externos, mas também explora as fissuras internas no campo bolsonarista. A relação com o governador Tarcísio de Freitas é exemplar desse “projeto personalista” que, “atropela aliados”. Tarcísio, tido como potencial “herdeiro do espólio eleitoral”, teria se tornado alvo da “fúria de Eduardo” por tentar dialogar com autoridades americanas para mitigar os impactos do “tarifaço”, especialmente em São Paulo. As interações de Eduardo com Tarcísio, embora velada em respeito ao leitor, sugere um nível de agressividade e desconsideração pelos interesses políticos de um aliado, reforçando a narrativa de que a pauta familiar se sobrepõe a qualquer outro arranjo. É o egoísmo em estado bruto.

Metralhadora giratória
Como se disparasse uma metralhadora giratória, o clã Bolsonaro erra quase todos os objetivos e arma os adversários reais e imaginários. O governador [de São Paulo] Tarcísio de Freitas, por exemplo, tido como candidato a herdeiro do espólio eleitoral de Jair Bolsonaro, tornou-se alvo da fúria de Eduardo apenas por tentar abrir canais de diálogo com autoridades americanas a fim de reduzir os impactos do tarifaço, particularmente duros para São Paulo. Lula foi brindado da irrelevância na qual estacionara e ressurgiu das cinzas da mediocridade de seu governo, como um novo “Sassá Mutema”, para o desespero de muitos.

Desmistificação
A retórica do clã culmina na desmistificação do que pode se classificar como a “causa bolsonarista”. Longe de ser uma defesa da democracia, soberania ou liberdade de expressão, o comportamento do clã pode ser descrito como um “projeto de autopreservação familiar que explora seguidores e sacrifica o Brasil”. Essa é a base do apelo final dos objetivos a serem atingidos.

Encruzilhada
Aos “verdadeiros conservadores”, aqueles que “repudiam a ruptura e prezam as instituições democráticas”, encontram-se diante de uma encruzilhada histórica, para que reavaliem sua posição ao lado de um “golpista desqualificado”. Os fatos podem explicar também que apenas o “fanatismo” explica a “fidelidade canina” de alguns, enquanto lideranças com pretensões eleitorais e que se consideram decentes não deveriam mais se associar a um clã que “já demonstrou ser capaz de trair os interesses mais vitais do País em troca da liberdade do líder da facção”. Está em jogo o futuro da direita no país.

Prazo
Alexandre de Moraes deu um prazo para a defesa de Jair Bolsonaro se manifestar sobre quebra de medidas cautelares até as 20h34 desta sexta-feira. Após isso, será aberto prazo de mais 48 horas para que a Procuradoria-Geral da República se manifeste. Só depois Moraes tomará uma decisão.

Val-André Mutran é repórter especial para o Portal Ver-o-Fato e está sediado em Brasília.
 
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