O construtor, no Pará, quando não havia escola de Engenharia

A primeira Escola de Engenharia Civil surgiu na França, nos anos de 1740.

Antes disto, os únicos profissionais que recebiam uma formação regular como construtores de edificações eram os engenheiros-militares.

No Brasil,eram portugueses os primeiros profissionais que tinha esta formação.

Eram poucos porque a Coroa Portuguesa não dispunha de muitos.

Cinco, apenas, vieram para o Brasil, por volta de 1650.

No entanto, já existiam 15, entre nós no período de 1700 a 1725.

O que não significou só aumento no número dos vindos de Portugal.

Ocorreu que naquele período começaram a atuar no Brasil, também, os primeiros profissionais formados na própria colônia.

Seus centros de formação eram chamados de Aulas Militares.

A metrópole portuguesa terminou autorizando a criação destas Aulas Militares no Brasil, devido à insuficiência de engenheiros-militares em Portugal.

Foi no Maranhão que surgiu uma destes primeiros centros de formação.

Na época, o Maranhão era uma colônia coirmã do Gram-Pará, um Estado independente do Brasil, dentro do reino lusitano.

Antes desta Aula Militar, há notícia somente de outra, no Brasil,em Pernambuco, provavelmente a mais antiga da colônia.

 A Aula Militar do Maranhão surgiu em 11 de janeiro de 1699.

No mesmo dia, a Bahia também passou a ter seu centro semelhante.

No Rio de Janeiro isto ocorreria um pouco depois, embora ainda em 1699.

 Quanto ao Gram-Pará,  os nomes dos seus primeiros professores de Engenharia-Militar à Amazônia ficaram registrados em documentos do antigo estado.

Entre eles, o de Joseph Velho de Azevedo, cujo corpo foi enterrado na sacristia da Igreja de Santo de Alexandre.

Até hoje está lá a lápide de sua sepultura.

Custódio Pereira e Carlos Varejão foram outros dois docentes desta época.

 Infelizmente, não há registro conhecido dos nomes dos seus alunos.

O único discente identificado é Henrique Wilkens.

Mas, ele era um jovem português, que só chegou a Belém, em 1753.

Filho do farmacêutico que servia à Rainha-Mãe, veio para o Gram-Pará, junto com os engenheiros-militares italianos e alemães que compunham a Comissão de Demarcações de Limites,  enviada pelo governo do Marquês de Pombal.

Da qual participava o arquiteto Antônio Landi, até hoje considerado um dos mais importantes construtores da História de Belém.

Aqui, o governador Mendonça Furtado fez de Wilkens um soldado de sua força militar.

Depois, vendo que ele tinha algum conhecimento de Geometria, pediu a um dos engenheiros-militares da comissão que o encaminhasse para a Engenharia-Militar.

O rapaz, contudo, não se mostrou inteiramente disposto a obedecer às ordens daquele engenheiro-militar.

Furtado, então, encarregou o astrônomo da comissão, o padre Inácio Sanmartoni, de lhe dar formação adequada.

O padre levou Wilkens para o Colégio dos jesuítas, onde está instalado o Museu de Arte Sacra, ao lado da Igreja de Santo Alexandre.

E, lá, Wilckens se aplicou ao estudo aprofundado de Geometria.

Com isto, Mendonça Furtado conseguiu junto ao rei sua nomeação para o posto de Ajudante de Engenheiro.

Assim, Wilckens pôde dar início à sua carreira, dentro da qual teria uma impressionante escalada profissional.

Wilckens permaneceria cerca de 40 anos no Gram-Pará.

Faria uma carreira militar completa, chegando a Tenente Coronel Engenheiro.

Deste modo, a rigor, o primeiro aluno de Engenharia-militar na Amazônia não se formou profissionalmente num centro de ensino.

Mas através de aulas particulares e da vivência prática do exercício profissional ao lado de experientes engenheiros-militares.

Antes de Wilckens atingir o ápice de sua carreira militar, um outro companheiro de Landi, na Comissão de Demarcações, também chegado a Belém em 1753, o engenheiro-militar italiano Antônio Galluzzi, criou e dirigiu, nos meados do século XVIII, uma Aula Militar, no Gram-Pará.

Não em Belém, contudo.

Mas em Macapá, onde construiu a Fortaleza de São José de Macapá, considerada o mais belo, o mais imponente e o mais sólido monumento militar do Brasil colonial.

 Quanto a Belém, a cidade viria a ter a sua primeira Aula Militar de Belém em 1757.

Criada pelo engenheiro-militar português Manuel Álvares Calheiros.

A quem coube também a responsabilidade de recriar aquela Aula Militar do Maranhão, de 1699, no desempenho de uma das tarefas mais importantes confiadas a ele pelo governador Mendonça Furtado, entre as que teve de desempenhar na região amazônica.

Em Belém, Calheiros obteve bons resultados com seu centro de formação.

Diante disto, Mendonça Furtado escreveu uma carta à Metrópole, no dia 21 de fevereiro de 1759, mencionando os progressos obtidos pela Aula Militar dele.

Na carta, Mendonça Furtado encaminhou uma encomenda de livros e instrumentos feita pelo engenheiro-militar português.

Depois desta Aula Militar, o momento seguinte, dentro da longa História do Ensino da Engenharia na Amazônia, é o da criação do segundo centro de formação de engenheiros-militares de Belém.

O da Aula Militar do engenheiro-militar e historiador Antônio Baena, cuja carreira como professor de futuros militares não poderia ter sido mais constrangedor.

Diante da sua condenação à morte, por um Tribunal Militar, durante o movimento da Cabanagem.

No século seguinte, a riqueza provinda da exportação da borracha permitiria ao Pará mandar para a Europa os jovens paraenses que queriam estudar Engenharia.

No nosso estado, a primeira escola de Engenharia, já desvinculada do ensino militar, só foi fundada em 1931.

Chamou-se Escola de Engenharia do Pará.

A EEP, como ficou conhecida, um dos poucos centros isolados de ensino superior existentes em nosso estado, em 1957,contribuiu para o surgimento da atual Universidade Federal do Pará.

Dentro da UFPa, se tornou a Faculdade de Engenharia Civil.

Escola mãe do Instituto de Tecnologia, atualmente com 11 diferentes faculdades.

*Oswaldo Coimbra é escritor e jornalista

English translation (tradução para o inglês)

The Builder, in Pará, When There Was No School of Engineering

The first School of Civil Engineering appeared in France in the 1740s.
Before that, the only professionals who received formal training as builders of constructions were military engineers.
In Brazil, the first professionals with such training were Portuguese.
There were few of them, as the Portuguese Crown did not have many available.
Only five came to Brazil, around 1650.
However, between 1700 and 1725, there were already 15 among us.
This did not mean only an increase in the number of Portuguese arrivals.
It also happened that, during that period, the first professionals trained in the colony itself began to work in Brazil.

Their training centers were called Military Classes (Aulas Militares).
The Portuguese Crown eventually authorized the creation of these Military Classes in Brazil, due to the shortage of military engineers in Portugal.
One of the first such training centers appeared in Maranhão.
At the time, Maranhão was a sister colony of Grão-Pará, an independent state of Brazil within the Portuguese realm.
Before this Military Class, there is record of only one other in Brazil, in Pernambuco, probably the oldest in the colony.

The Maranhão Military Class was established on January 11, 1699.
On the same day, Bahia also received a similar center.
In Rio de Janeiro, this would happen a little later, though still in 1699.

As for Grão-Pará, the names of its first professors of Military Engineering in the Amazon were recorded in documents of the former state.
Among them was Joseph Velho de Azevedo, whose body was buried in the sacristy of the Church of St. Alexander.
His gravestone remains there to this day.
Custódio Pereira and Carlos Varejão were two other teachers of that era.

Unfortunately, there are no known records of the names of their students.
The only identified student is Henrique Wilkens.
But he was a young Portuguese who only arrived in Belém in 1753.
The son of the pharmacist who served the Queen Mother, he came to Grão-Pará along with Italian and German military engineers who composed the Boundary Demarcation Commission, sent by the government of the Marquis of Pombal.
Among them was the architect Antônio Landi, still regarded as one of the most important builders in the history of Belém.

Here, Governor Mendonça Furtado enlisted Wilkens as a soldier in his military force.
Later, noticing he had some knowledge of Geometry, Furtado asked one of the military engineers of the commission to guide him into Military Engineering.
However, the young man did not fully comply with that engineer’s orders.
So Furtado entrusted the commission’s astronomer, Father Inácio Sanmartoni, with giving him proper instruction.

The priest took Wilkens to the Jesuit College—today the Museum of Sacred Art, beside the Church of St. Alexander—where Wilkens devoted himself to the study of Geometry.
With this, Mendonça Furtado secured from the king his appointment as Assistant Engineer.
Thus, Wilkens began a career that would see an impressive professional rise.

Wilkens remained in Grão-Pará for about 40 years.
He completed a full military career, reaching the rank of Lieutenant Colonel Engineer.
Strictly speaking, then, the first military engineering student in the Amazon was not formally trained in an official school, but through private lessons and hands-on professional experience alongside seasoned military engineers.

Before Wilkens reached the peak of his military career, another of Landi’s colleagues in the Demarcation Commission, the Italian military engineer Antônio Galluzzi, who had also arrived in Belém in 1753, created and directed, in the mid-18th century, a Military Class in Grão-Pará.
Not in Belém, however, but in Macapá, where he built the Fortress of St. Joseph of Macapá, considered the most beautiful, imposing, and solid military monument of colonial Brazil.

As for Belém, the city would only have its first Military Class in 1757.
It was created by the Portuguese military engineer Manuel Álvares Calheiros, who was also tasked with recreating the Maranhão Military Class of 1699—one of the most important assignments given to him by Governor Mendonça Furtado in the Amazon region.

In Belém, Calheiros achieved good results with his training center.
As a result, on February 21, 1759, Mendonça Furtado wrote a letter to Lisbon mentioning the progress of Calheiros’s Military Class.
In that letter, he forwarded a request for books and instruments made by the Portuguese military engineer.

After this Military Class, the next milestone in the long history of engineering education in the Amazon was the creation of the second training center for military engineers in Belém: the Military Class of Antônio Baena, a military engineer and historian, whose career as a teacher of future officers ended in disgrace when he was sentenced to death by a Military Court during the Cabanagem revolt.

In the following century, the wealth from rubber exports allowed Pará to send young locals to Europe to study engineering.
In our state, the first engineering school not tied to military instruction was only founded in 1931.
It was called the School of Engineering of Pará (EEP).
The EEP, one of the few independent higher education centers in Pará, contributed in 1957 to the founding of today’s Federal University of Pará (UFPA).
Within UFPA, it became the Faculty of Civil Engineering, the parent school of the Institute of Technology, which today encompasses 11 different faculties.

Oswaldo Coimbra is a writer and journalist
(Illustration: Military Engineers of the 1800s)

The post O construtor, no Pará, quando não havia escola de Engenharia appeared first on Ver-o-Fato.