Petrobras na reta final por licença na Amazônia

A Petrobras prossegue em busca de uma licença de pesquisa da existência de petróleo e gás, e deve concluir nesta quarta-feira (27), a aguardada Avaliação Pré-Operacional (APO) no bloco FZA-M-59, na bacia da Foz do Amazonas. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) acompanha todas as etapas da operação in loco.

O veredito e a encruzilhada
A Bacia da Foz do Amazonas, situada na cobiçada Margem Equatorial, está prestes a receber um veredito que definirá não apenas o destino de uma potencial província petrolífera, mas também a direção da política energética e ambiental brasileira.

Megaoperação
Ao custo de dezenas de milhões, a APO da Petrobras, deve ser finalizada nesta quarta-feira, representa a última etapa de uma série de testes rigorosos, com o objetivo de demonstrar a segurança ambiental necessária para a perfuração de um primeiro poço de pesquisa na região.

O que está em jogo?
O Ibama, após uma recusa inicial e um parecer técnico robusto contrário à licença, encontra-se agora sob os holofotes, com a caneta prestes a chancelar ou negar um projeto de altíssimo impacto:

1. A conclusão de um teste de fôlego
A APO deve revelar os detalhes da fase final de testes, iniciada no último domingo (24), visando comprovar a capacidade da Petrobras em lidar com cenários de risco na exploração. A APO abrangeu a verificação da funcionalidade de equipamentos, a agilidade da equipe em reagir a acidentes, a capacidade de resgate de fauna e a eficácia da comunicação com autoridades e comunidades. Para tal, foram simulados eventos como derramamento de óleo e problemas em sistemas de segurança vitais, como o BOP, com o apoio de um ROV (robô submarino).

Um contingente significativo de aproximadamente 400 profissionais, 13 embarcações e três aeronaves esteve envolvido. A localização do poço, a 175 km da costa do Amapá e mais de 500 km da foz do Rio Amazonas, é um ponto chave nas justificativas da Petrobras, que, segundo estudos internos, afastaria o risco de o óleo atingir a costa em caso de acidente. Adicionalmente, a preparação inclui a operação de dois centros de atendimento e reabilitação de fauna em Oiapoque (AP) e Belém (PA), estruturados como “hospitais” para animais marinhos e aves afetados. Tais medidas são parte das “salvaguardas adicionais” prometidas pela estatal.

2. A tensão entre o técnico e a estratégico
A operação revela uma dualidade. Embora a fonte interna à APO assegure que “todos [os testes] vêm sendo cumpridos”, o histórico do processo com o Ibama não pode ser ignorado. A recusa inicial do órgão em maio de 2023, seguida por um parecer de 26 técnicos que reafirmou a inviabilidade ambiental, demonstra a existência de uma forte resistência técnica interna à liberação da licença. A decisão da direção do Ibama de “dar mais tempo para a Petrobras responder aos questionamentos” pode ser interpretada como uma janela aberta para a influência de pressões externas, sejam elas políticas ou econômicas, sobre um processo que deveria ser estritamente técnico-ambiental.

Para a Petrobras, a Margem Equatorial é uma prioridade estratégica, endossada pela atual gestão da CEO da Petrobras, Magda Chambriard. A promessa de repor reservas, compensando o declínio futuro da produção no pré-sal da costa do Sudeste, é um motor poderoso. Essa urgência da estatal, que busca garantir sua sustentabilidade produtiva e financeira a longo prazo, coloca a decisão do Ibama em uma posição delicada, transformando-a em um divisor de águas para a empresa e para a matriz energética do país.

3. O dilema do Governo Lula 3
A questão da Margem Equatorial personifica o maior dilema do governo Luiz Inácio Lula da Silva: como equilibrar a necessidade premente de desenvolvimento econômico, geração de empregos e arrecadação de royalties com a inadiável agenda ambiental e climática. De um lado, a Petrobras e setores do governo, como o Ministério de Minas e Energia, veem na exploração um caminho para a soberania energética e o fortalecimento financeiro do Estado. Do outro, o Ministério do Meio Ambiente e o vasto movimento ambientalista, nacional e internacional, alertam para os riscos irreparáveis à biodiversidade da Amazônia e para a inconsistência de buscar novas fronteiras de petróleo em plena crise climática.

A decisão do Ibama, portanto, transcende sua esfera de autarquia. Ela será um termômetro da autonomia dos órgãos ambientais e da capacidade do governo de gerir as tensões internas. Uma liberação de licença pode ser celebrada como uma vitória do pragmatismo econômico, mas arrisca arranhar a imagem do Brasil no cenário global, especialmente em um momento de reposicionamento do país como líder na agenda climática. A polarização em torno do tema é evidente, e o governo se vê pressionado a tomar uma posição que contente ambas as frentes.

4. O futuro da Nação em jogo
As implicações da decisão do Ibama são multifacetadas e de longo alcance:

Blocos alvos na Margem Equatorial. Imagem: Divulgação

Econômicas: A aprovação abriria caminho para bilhões de barris em potencial, garantindo o fluxo de receitas de royalties e impostos para os estados e a União, além de fortalecer a Petrobras em sua estratégia de longo prazo. A negativa, contudo, forçaria a estatal a um replanejamento estratégico, talvez acelerando investimentos em energias renováveis, mas também gerando questionamentos sobre a segurança energética futura do país.

Ambientais: Uma liberação poderia ser vista como um relaxamento das salvaguardas ambientais, abrindo precedentes para outras explorações em áreas sensíveis. A Margem Equatorial, pela sua proximidade com a Amazônia e suas complexas correntes marítimas, é um ecossistema de alto risco. A negativa, por outro lado, reforçaria o compromisso ambiental do Brasil, posicionando-o como um líder na proteção de ecossistemas críticos.

Políticas e Sociais: A questão já é um catalisador de debates acalorados. Uma licença positiva pode acirrar os ânimos de ambientalistas e comunidades tradicionais, enquanto a negativa frustraria setores da indústria e políticos regionalmente interessados. A decisão impactará a popularidade do governo e influenciará as dinâmicas de poder entre diferentes vertentes ideológicas.

Internacionais: O mundo observa o Brasil, especialmente em relação à Amazônia. A liberação de licenças para exploração de petróleo em suas cercanias poderia contradizer a narrativa de proteção e desmatamento zero, dificultando o diálogo e a captação de investimentos verdes.

Quanto tempo depois da APO a Petrobras receberá a licença para perfurar?
Cabe ao Ibama definir os próximos passos e os prazos após a realização do exercício.

Palavras dos governadores
Enquanto o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), aposta na liberação da licença desde que as regras do Ibama sejam cumpridas, o colega do Amapá, Clécio Luís (Solidariedade), que é professor de geografia, foi mais enfático: “Vamos compartilhar todas essas etapas com a população. Quanto mais informação, melhor. Com simulação bem feita e pesquisa qualificada, a Petrobras poderá elaborar um plano seguro de extração. Queremos gerar emprego, renda e fortalecer nossa soberania”.

Teste de governança
A Margem Equatorial não é apenas um projeto de petróleo; é um teste de governança, uma escolha entre modelos de desenvolvimento. O veredito do Ibama, iminente, será mais do que uma decisão técnica: será um marco na trajetória do Brasil, sinalizando qual caminho o país priorizará nas complexas interseções entre o subsolo e a sustentabilidade.
Val-André Mutran é repórter especial para o Portal Ver-o-Fato e está sediado em Brasília.
 
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