Advogado Nelson Wilians fica de bico calado na CPMI do INSS

A testemunha obteve um habeas corpus do ministro Nunes Marques (STF), que o desobrigou de não assumir o compromisso de falar a verdade e de permanecer em silêncio durante a oitiva

Brasília – Se a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS depender de revelações do advogado Nelson Wilians para obter pistas que elucidem a roubalheira bilionária que afanou bilhões de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional de Previdência Social, o esforço será em vão. Seu depoimento nesta quinta-feira (18), foi marcado por sua recusa em prestar o compromisso de dizer a verdade e pela adoção do direito ao silêncio em grande parte dos questionamentos.

Investigado pela Polícia Federal (PF) por suposto envolvimento em transações ilícitas, Wilians defendeu sua história de vida e negou qualquer participação na fraude que lesa aposentados, enquanto membros da CPMI o confrontavam com relatórios de movimentações financeiras suspeitas de R$ 4,3 bilhões e elos com um dos principais articuladores do esquema.

A sessão da CPMI, presidida pelo senador Carlos Viana (Podemos-MG), teve como principal ponto de tensão a postura de Nelson Wilians. Desde o início, o advogado, munido de um habeas corpus concedido pelo ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), declinou a oferta de prestar o compromisso de dizer a verdade voluntariamente.

Em sua declaração inicial, Wilians afirmou abominar os crimes sob apuração, descrevendo a lesão a aposentados como “um crime gravíssimo”. Ele destacou sua trajetória de vida, de origem humilde no Paraná, passando por dificuldades e construindo um dos maiores escritórios de advocacia da América Latina. O advogado negou conhecer Antônio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”, mas admitiu ter uma relação de amizade com Maurício Camisotti, que foi seu cliente desde 2015.

A Polícia Federal, no entanto, aponta que a relação entre Wilians e Camisotti vai além de um vínculo profissional, sugerindo que Wilians figura como possível beneficiário de descontos associativos da Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos (Ambec), entidade que teria movimentado R$ 231,3 milhões em descontos irregulares. A PF suspeita que o esquema total pode ter movimentado mais de R$ 6 bilhões entre 2019 e 2024.

Relator “espremeu”, mas só obteve o silêncio da testemunha
O relator da CPMI, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), em-procurado-Geral em Alagoas, bem que tentou abrir o bico de Wilians. Iniciou os questionamentos criticando a recusa do advogado em jurar dizer a verdade, sugerindo uma contradição com sua imagem de inspirador de jovens.

O relator abordou as doações de campanha feitas por Wilians a diversos políticos, questionando se o objetivo era exercer influência. Wilians negou buscar favores em troca do financiamento e manteve que não tem participação nos fatos investigados pela comissão.

O debate se acirrou quando o relator questionou a origem da “fortuna e ostentação” do advogado, insinuando uma possível ligação com o roubo de aposentados. Nelson Wilians respondeu que “não tem nada a ver com o que está sendo objeto da investigação”, reafirmando o papel da Polícia Federal em apurar os fatos e sua admiração pela instituição, apesar de ter sido alvo de busca e apreensão.

A partir de então, Nelson Wilians passou a exercer seu direito constitucional ao silêncio para a maioria das perguntas do relator:

Ele se recusou a responder sobre:
A aquisição de um terreno de R$ 22 milhões de Maurício Camisotti e se isso seria “branqueamento de capital”.
Sua suposta ajuda na fundação da Ambec, se é “sócio oculto” ou se teve contrato com a associação.
Quantos milhões da Ambec teriam sido direcionados a ele.
Se tinha conhecimento antecipado da Operação Sem Desconto da PF.
Se podia detalhar do que se trtava transações de R$ 28 milhões com Maurício Camisotti.
Se ele e Camisotti estariam juntos na fraude do INSS.
Se orientou a Ambec na feitura de termo de cooperação técnica com o INSS.
Sua relação com Cebap e Unsbras.
Sua advocacia para o grupo THG.
Quem abriu as portas do INSS para Maurício Camisotti.
Se conhece Edmar Policarpo Júnior, Ademir Humberto Califoni, André Fidelis, Renato Aroldo.
Se já recebeu ministros do STF em suas propriedades ou emprestou sua aeronave para parlamentares.
A origem dos R$ 4,3 bilhões movimentados e sua relação com o desvio de dinheiro de aposentados.
O pagamento de um empréstimo de R$ 750 mil a Camisotti.
Se é sócio de Fernando Andrade e se participou da ocultação de veículos de luxo.
Benfix Corretora de Seguros e Cecília Montalvão Simões.
A relação contratual com a Ambec.
Sua sócia na empresa de aviação, Alessandra Abrão.

Wilians respondeu a todas as perguntas: “Não tenho nenhum envolvimento com os objetos da investigação desta CPMI referentes a fraudes do INSS. Essa é a minha resposta”, e mais nada falou.

Críticas dos parlamentares
O deputado Duarte Jr. (PSB-MA) expressou “preocupação” com a conduta de Wilians, ressaltando que “a advocacia tem que ser referência de probidade” e que advogados “não podem usar suas prerrogativas para fins de dificultar investigações”.

Ele confrontou Wilians sobre a imagem de honestidade versus a recusa em falar a verdade, chegando a questionar o advogado se ele era “advogado do Camisotti” e a levantar a denúncia de que Wilians teria pago R$ 15 milhões a Camisotti. Diante do silêncio de Wilians, Duarte Jr. afirmou que o advogado estava mostrando que seu “patrimônio é suspeito, é fruto não da advocacia, é fruto de práticas ilícitas”, classificando sua postura como “vergonha para a advocacia e é uma vergonha para o Brasil”.

A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) também criticou a decisão de Wilians de não falar, afirmando que ele “derrubou tudo” que havia construído em sua história ao se negar a falar a verdade. Gama contextualizou o esquema como um “novo paradigma de corrupção” que foca nos aposentados e trabalhadores rurais, utilizando “servidores de carreira, apadrinhamento político, utilização de empresas de fachada” para dar um verniz de legalidade.

Ela mencionou a atuação de Rolim (Presidência do INSS), Oliveira (Diretor de Benefícios), Virgílio (Procuradoria do INSS) e o “Careca do INSS” como facilitadores, destacando o papel das Associações de Convênios de Descontos (ACTs). Gama também apontou que os requerimentos para convocar familiares de Maurício Camisotti (Cecília Montalvão Queiroz) e o “Careca do INSS” (Tânia Carvalho dos Santos e Romeu Carvalho Antunes) foram aprovados, apesar das tentativas de adiar as convocações.

Os governistas quiseram travar a convocação da mulher do empresário Maurício Camisotti e do filho e da mulher do lobista Antônio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS. Contudo, os requerimentos para convocá-los haviam sido protocolados por parlamentares do PT e de outros partidos da base.

A convocação dos familiares e sócios havia sido combinada na véspera, em uma reação ao fato de Antunes ter desistido do depoimento à CPI.

O senador Jorge Seif (PL-SC) reiterou a denúncia de que o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) unidade de inteligência financeira do Brasil, ligada ao Banco Central, que previne e combate a lavagem de dinheiro identificou R$ 4,3 bilhões em “operações atípicas” vinculadas ao escritório de Wilians, enquanto aposentados sofriam descontos ilegais.

Seif acusou Wilians de “debochar” da CPMI e da dor dos aposentados, afirmando que a PF “já demonstrou o envolvimento do senhor e de seu escritório diretamente com um dos cabeças desse esquema que desviou, de lavagem de dinheiro, que desviou bilhões dos nossos aposentados, Maurício Camisotti e o Careca”.

O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) interveio com uma questão de ordem, defendendo o direito constitucional de Wilians de permanecer em silêncio e criticando a “agressividade, truculência ou deboche” de alguns parlamentares.

O deputado Rogério Correia (PT-MG) reforçou a mecânica da fraude, explicando como o “Careca do INSS” levava aposentados para entidades como a Ambec, de Camisotti, e como o escritório de Wilians estaria envolvido na lavagem do dinheiro. Ele também mencionou a influência política de Wilians, citando o recebimento de um Fusca de colecionador pelo governador do Distrito Federal Ibaneis Rocha (MDB) e o suposto envolvimento em manifestações pró-Bolsonaro.

A sessão foi suspensa algumas vezes para orientação dos advogados do depoente. O presidente da CPMI, Carlos Viana, reiterou o compromisso da comissão em “mostrar ao povo brasileiro quem roubou a previdência, como roubaram e onde foi parar o dinheiro”, apesar do silêncio das testemunhas.

A sessão foi pausada para o almoço e retomará logo mais.

* Reportagem: Val-André Mutran (Brasília-DF), especial para o Portal Ver-o-Fato.

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