De testemunha a suspeito, confira como foi o depoimento de Nelson Wilians na CPMI do INSS

Congressistas pressionam por quebra de sigilo e respostas sobre R$ 4,3 bilhões em movimentações e supostos elos do advogado com Maurício Camisotti e o “Careca do INSS”

Brasília – Em uma sessão prolongada realizada nesta quinta-feira (18), o advogado Nelson Wilians Fratoni Rodrigues prestou depoimento por cerca de oito horas, marcado por sua recusa em firmar compromisso de dizer a verdade e por repetidas negativas de envolvimento no escândalo de roubo de aposentadorias. Apesar da intensa inquirição de diversos congressistas sobre movimentações financeiras bilionárias e supostas ligações com investigados, Wilians invocou seu direito constitucional ao silêncio em várias ocasiões e reiterou sua inocência., mas o que conseguiu foi sair da condição de suspeito para o status de um dos principais suspeito da roubalheira bilionária.

A oitiva de Nelson Wilians, que compareceu protegido por um habeas corpus preventivo (Habeas Corpus 261.850/DF) concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Nunes Marques, iniciou-se com a expectativa de esclarecimentos sobre sua suposta participação na lavanderia de parte de recursos roubados no escândalo do roubo de aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Inicialmente, Nelson Wilians declarou: “Em nenhum momento, eu menti aqui. Eu respondi a todos, mas eu percebo que parte-se de premissas erradas para se chegar a um resultado errado.” Ele também afirmou que abominava o ocorrido e que lesar aposentados era um “atentado de proporções inaceitáveis”. Contudo, antes do recesso para o almoço, a testemunha informou que usaria seu direito de ficar em silêncio. A todas as perguntas subsequentes, Wilians passou a responder: “Reafirmo que nada tenho a ver com o objeto desta CPMI”. Essa postura, mantida por oito horas, gerou irritação entre diversos congressistas.

Um ponto de atrito significativo surgiu quando o presidente da CPMI, Carlos Viana (PODEMOS-MG), e o relator, Alfredo Gaspar (UNIÃO-AL), questionaram a recusa de Wilians em assinar um termo de compromisso de falar a verdade. Após uma suspensão de cinco minutos para consulta a seus advogados, Wilians justificou sua recusa alegando um “grande paradoxo” entre o direito constitucional ao silêncio e a obrigação de comprometer-se, afirmando: “Eu não abro mão do direito ao silêncio. Eu não abro mão pela complexidade do tema tratado aqui”. O presidente Carlos Viana esclareceu que o habeas corpus lhe garantia o direito de não prestar juramento.

Nelson Wilians se esquivou de todas as perguntas. Foto: Ag. Senado

Pedido de prisão indeferido pelo STF
Os debates na CPMI se desdobraram em diversas frentes, com os congressistas tentando correlacionar o deponente a operações fraudulentas e Wilians recorrentemente se esquivando das respostas diretas.

O relator Alfredo Gaspar inquiru Wilians sobre a origem de seu patrimônio e uma transação imobiliária de R$ 22 milhões que, segundo ele, a Polícia Federal (PF) apontava como lavagem de dinheiro para Maurício Camisotti, além de questionar se Wilians era “o operador financeiro do dinheiro sujo que entrou e saiu da Ambec”. Nelson Wilians reiterou que: “Não tenho nada, absolutamente nada, com o objeto das investigações desta CPMI em relação às fraudes do INSS.”

O deputado Beto Pereira (PSDB-MS) citou o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), que teria identificado “movimentações suspeitas nas contas de seu escritório” de R$ 4,3 bilhões entre 2019 e 2024″, questionando se Wilians operou para alguma associação com benefícios na movimentação desses valores. O deputado sugeriu ainda a suspensão dos contratos do escritório de Wilians com órgãos públicos, pois o advogado estava “sob suspeita”. Wilians respondeu novamente com seu “mantra” e destacou que seu pedido de prisão havia sido indeferido pelo STF por falta de fundamentos.

A deputada Adriana Ventura (NOVO-SP) detalhou a vasta rede empresarial de Wilians, mencionando empresas como NW Negócios Investimentos e Soluções (também Valestrá), NW Corretora de Seguros, NW Soluções e Recuperação de Crédito, e Voar Aviation. Ela questionou a relação profissional e pessoal de Wilians com Fernando dos Santos Andrade Cavalcanti, administrador de cerca de 30 de suas empresas, e as sociedades entre empresas de ambos. Wilians declinou responder, alegando que “não é o momento de falar a respeito deste tema”, mas esclareceu que não era mais sócio da Voar há muito tempo.

Em uma linha política mais ampla, o senador Márcio Bittar (PL-AC) fez um discurso que criticou a “injustiça” no Brasil e a corrupção no INSS, que classificou como “muito mais cruel” que o Mensalão ou Petrolão por vitimar aposentados vulneráveis. Ele solicitou formalmente a “quebra de sigilo bancário, financeiro e do relatório de inteligência financeira de todas as empresas que tenham a sua participação [de Nelson Wilians]“, na expectativa de que documentos “embasem” a investigação.

O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) criticou a “narrativa de natureza política” de alguns congressistas, mencionando a “fixação” de alguns com o ex-ministro José Dirceu. Ele apresentou uma linha do tempo alternativa, sugerindo que o esquema de fraude no INSS, especialmente com a Ambec, se intensificou após o afastamento de Wilians e Camisotti da Geap — plano de Saúde que mantém o monopólio de atendimento aos servidores públicos federais —, com a criação de entidades associativas com rápido crescimento de associados e receita milionária, insinuando que isso teria ocorrido no Governo Bolsonaro. Pimenta também citou um pagamento de R$1 milhão de uma seguradora ligada a Wilians a Antônio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”.|

Em resposta, o senador Rogério Marinho (PL-RN) rebateu a “narrativa” de Pimenta. Ele apresentou gráficos mostrando que a arrecadação da Ambec saltou de R$1.611 milhão em maio de 2022 para R$21 milhões/mês em dezembro de 2023, período que ele associou ao Governo Lula. Marinho defendeu as ações do Governo Bolsonaro, como a MP 871, que propôs revalidação de cadastro e descredenciamento de entidades irregulares, e criticou a Instrução Normativa 162 de 2024 do Governo atual por “afrouxar” controles e retirar a conferência de documentos.

O senador Izalci Lucas (PL-DF) mencionou ter apresentado centenas de requerimentos, incluindo quebras de sigilo. Ele citou uma justificativa anterior de Wilians, na qual o advogado afirmava que sua relação com Camisotti era estritamente profissional e que seu escritório atuou para a Ambec por apenas 90 dias. Izalci apresentou um caso de defesa da Ambec por Wilians, onde a associação ofereceu indenização a uma aposentada lesada, questionando se isso não acendeu um “alerta” para o advogado sobre a ilegalidade das ações da Ambec.

A deputada Leila Barros (PDT-DF) e o deputado Marcel Van Hattem (NOVO-RS) aprofundaram as perguntas sobre Fernando Cavalcanti, ex-sócio de Wilians, a apreensão de carros de luxo (Ferrari, McLaren F1 réplica) e a presença da marca NW Group nesses veículos. Van Hattem afirmou que a PF pediu a prisão de Wilians e que ele é investigado. Ele também questionou a frase de Wilians “a polícia não errou em pedir sua prisão”, o que Wilians esclareceu como respeito ao papel institucional da PF, não concordância com a premissa de sua culpa.

O senador Styvenson Valentim (PSDB-RN) e o senador Cleitinho (REPUBLICANOS-MG) fizeram um apelo pessoal a Wilians para que respondesse diretamente sobre a origem lícita de seu vasto patrimônio, com Cleitinho pedindo um “sim ou não” e criticando o STF por não ter permitido a prisão do advogado. Cleitinho exibiu imagens de carros de luxo e a presença de Wilians com o ministro Zanin (STF), sugerindo que Wilians “está fazendo todo mundo aqui [CPMI] de bobo”.

O deputado Luiz Lima (NOVO-RJ) questionou a “incoerência” de Wilians em advogar para a Ambec, que ele descreveu como uma “organização criminosa” que lesou milhares de aposentados. Ele também levantou um potencial conflito de interesse envolvendo o filho [Enrique de Abreu Lewandowski] de um ministro da Justiça (Ricardo Lewandowski) que defenderia entidades investigadas pela PF.

O senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) traçou uma linha do tempo, ligando Wilians a manifestos pró-Bolsonaro em 2018, a ruptura do contrato com a Geap em 2020, “operações atípicas” de R$16 milhões entre Wilians e Camisotti, e a subsequente ascensão da Ambec com um contrato do INSS. Ele perguntou sobre transferências específicas de dinheiro entre Wilians e Camisotti (R$751 mil para Wilians e R$2,1 milhões de Wilians) em 2021.

A deputada Bia Kicis (PL-DF) perguntou sobre o Instituto Nelson Wilians e possíveis doações suspeitas, reiterando que Wilians é investigado e que o pedido de prisão da PF foi indeferido não por falta de elementos, mas por ausência de risco de fuga. Ela questionou se Wilians teve informações antecipadas sobre a operação da PF e criticou a “resposta burocrática” do advogado, que elogiava a PF mesmo sendo investigado.

O deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES) apresentou as acusações de forma mais incisiva, sugerindo que a conta do patrimônio de Wilians “não fecha” e que ele seria um “operador de recursos ilícitos”. Ele citou manchetes e fez uma analogia de Wilians como “motorista de uma Kombi” com dinheiro ilícito e figuras como Zé Dirceu e Camisotti, questionando sua inocência. Ele ainda mencionou a “coleção de peças eróticas” do advogado como parte de sua “personalidade”.

O último inquiridor, deputado Fernando Rodolfo (PL-PE), citou uma frase do livro de Wilians, “Cartas a um Jovem Advogado”, que sugere que o sucesso na advocacia pode exigir “sacrifício de princípio”, inferindo que isso explicaria a situação atual do advogado. Ele sugeriu que, devido ao risco de fuga, a CPMI deveria pedir a apreensão do passaporte de Wilians.

Em sua fala final, Nelson Wilians reiterou que não compactua com as fraudes investigadas, manifestou seu repúdio e indignação, e prometeu que a verdade e a justiça prevalecerão, garantindo que “não decepcionarei ninguém”.

As oitavas na CPMI prosseguem ao longo desta noite e passou, agora, a inquirir o empresário Milton Salvador de Almeida Júnior, e não tem hora para acabar.

* Reportagem: Val-André Mutran (Brasília-DF), especial para o Portal Ver-o-Fato.

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